Já tratamos neste Diário a questão da vacinação nos países atrasados, em especial na África. O texto denunciou os interesses dos monopólios farmacêuticos. Pois bem: dando sequência a isso, agora podemos nos aprofundar um pouco mais sobre o tema.
Em primeiro lugar, entendemos que, muito possivelmente, o leitor tenha algum tipo de ilusão a respeito da vacinação. É comum e até esperado que o leitor suponha que, no mundo, a distribuição de vacinas segue a todo vapor. Pedimos encarecidamente ao leitor que leia a matéria supracitada, onde apontamos diversos dados que provam o contrário; mas aqui vão mais alguns: enquanto os países que compõem o G20 possuem mais de 80% das vacinas, os países africanos têm somente 0,6% do total (dado exposto pela OMS, em novembro de 2021). Os países da África Subsaariana, em sua maioria, não ultrapassaram até agora os 10% da população vacinada com ao menos uma dose! Mesmo na Europa há forte desigualdade: nos países atrasados e oprimidos da Europa, ou seja, na Europa Oriental, a vacinação anda a passos lentos – há países em que menos de 20% da população tomou as duas doses ou a dose única; a Bulgária, que, inclusive, compõe a União Europeia, tinha apenas 24% da população com o esquema vacinal completo até outubro de 2021.
A vacinação, neste aspecto, é uma farsa, porque não existe na realidade para os países africanos. E, se os países africanos não se vacinam, porque a indústria farmacêutica lhes nega esse direito, tais países produzem novas variantes que ameaçam a saúde e a estabilidade do mundo inteiro.
Outro aspecto próprio do capitalismo em relação às vacinas – além do monopólio para os países imperialistas das vacinas e a completa falta delas para os países atrasados – diz respeito à própria produção científica. A coronavac, vacina aplicada no Brasil, possui apenas 50% de eficácia.
E ela não é a única que possui uma baixa eficácia: dentro do capitalismo, inclusive na ciência, a produção é realizada mediante o processo mais lucrativo. Ou seja, as vacinas são produzidas para gerar lucro – mesmo que, para que se gere lucro, seja necessário sacrificar a eficácia delas. Então temos que as vacinas produzidas são apenas uma fração do que poderiam ser se estivéssemos em uma sociedade socialista – tanto em quantidade, quanto em qualidade.
Por óbvio, mesmo a Moderna, a Pfizer, a Astrazeneca e, especialmente, a Coronavac sendo menos eficazes do que poderiam ser, justamente para atender aos interesses dos laboratórios que as produziram, é necessário exigir que o povo tenha o direito de ter acesso a elas, que elas estejam disponíveis para toda a população mundial. Apenas com a ampliação significativa da cobertura vacinal é que será possível combater o surgimento de variantes; enquanto continentes inteiros não ultrapassarem os 10% de vacinados com a primeira dose, o planeta inteiro seguirá refém do vírus e, por conseguinte, os capitalistas do setor continuarão esbanjando os lucros.
O papel da esquerda, em especial da esquerda revolucionária, é denunciar o regime vigente, denunciar a classe dominante e sua política de espoliação. De modo algum, deve-se aderir à histeria da esquerda pequeno-burguesa (do PSOL até o PSTU, passando por UP, PCB, et caterva.), que apresentam como “negacionismo”, “terraplanismo”, “bolsonarismo”, etc. qualquer crítica feita às vacinas, à indústria farmacêutica ou a maneira com que a burguesia guia o processo de vacinação.
Esse tipo de histeria só serve para deixar a esquerda à reboque de seus maiores inimigos. Não podemos, sob nenhuma circunstância, deixar de denunciar com toda veemência que os laboratórios científicos sejam privados e atuem de acordo com o interesse particular, isto é, de acordo com os lucros. A lógica que subordina o desenvolvimento das vacinas ao mercado mundial e não aos critérios meramente técnicos só pode deixar de existir quando o modo de produção capitalista for derrubado pela revolução proletária. Não apontar que a burguesia sabota a vacinação na África para lucrar mais, que as vacinas têm uma eficácia menor do que poderiam ter, que estamos presenciando uma saga para entregar o sistema público de saúde a brasileiro aos monopólios é jogar areia nos olhos da população.
A burguesia e a terceira via têm sua própria política para a questão das vacinas, diariamente exposta na grade de programação da Rede Globo, e a esquerda não deve se subordinar a ela; ao contrário, é dever da esquerda ter um programa próprio, que alerte e exponha para a população os interesses dos capitalistas no mercado trilionário da vacina, e que conduza para a libertação da humanidade.