Foi detectada, recentemente, uma nova variante da COVID-19, batizada pela OMS como “ômicron”. A variante gera especial preocupação dentro da comunidade científica por conta de sua alta mutabilidade – são mais de 50 ao todo. No local em que surgiu, na África do Sul, foram mais de 2.400 casos de infecção.
A explosão dos casos ocorre justamente no continente africano, em que menos de 2% da população total foi vacinada (!); apenas 0,3% das vacinas foram aplicadas pelos 27 países mais pobres. Eles são as principais vítimas da distribuição e, justamente, são os locais onde pululam novas variantes. A ciência, afinal, não ocorre no vazio, mas sim numa sociedade de classes – portanto, subordinada à luta entre elas e dela decorrente.
Distribuição de vacinas: as migalhas aos países pobres para que os capitalistas possam lucrar
A distribuição das vacinas é realizada conforme as “regras do mercado”, isto é, o quanto cada país consegue comprar. Dessa forma, as vacinas são distribuídas de modo absolutamente desigual e isso é um dos fatores que justificam a discrepância absurdas nos dados de vacinação, contundentemente escondidos pela imprensa burguesa; citaremos alguns: na América do Sul, 53% da população se vacinou com a 1ª dose; esse número, que já é absurdamente baixo, é maior do que os vacinados tanto por Haiti, por Nicarágua e pela Guatemala, visto que nenhum desses países ultrapassou os 12% (e nos referimos à primeira dose!).
Os números baixíssimos de vacinas disponíveis para os países da América Central, que estarrecem qualquer leitor, são superados pelos números dos países africanos: menos de 5% se vacinaram; os 27 países mais pobres do mundo, com uma população de 650 milhões de habitantes, receberam apenas 15 milhões de doses (o total distribuído no mundo é de 5 bilhões!) – ou seja, esses países receberam apenas 0,3% das vacinas! (dados de agosto de 2021, que, embora antigos, ilustram a desigualdade).
Atualmente, em novembro de 2021, enquanto escrevemos estas linhas, a República Democrática do Congo vacinou apenas… 0,1% de sua população! O Haiti (país que faz parte da América Central) vacinou 1% e a Etiópia, 1,5%. Isso em novembro de 2021, agora! Números verdadeiramente inacreditáveis.
A verdadeira causa dessa discrepância está nos interesses da indústria farmacêutica: a falta de vacinas é resultado direto das patentes. A quebra de patentes, com o compartilhamento da tecnologia utilizada, permitiria aos países pobres que produzissem suas próprias vacinas. No entanto, isso seria o fim do poder dos monopólios farmacêuticos num mercado que movimentou mais de 1 trilhão de dólares, o mercado de vacinas contra o coronavírus.
Países como o Canadá chegaram a comprar um número de vacinas equivalente a 6 vezes a sua população! Enquanto os países imperialistas agem para encher os bolsos dos capitalistas da indústria financeira – que representam um segmento real da sociedade, com reivindicações próprias e que não refletem a “ciência” em abstrato, mas interesses concretos –, falta vacinas aos países pobres, que sequer têm o direito de produzi-las.
A nova variante: resultado da política da burguesia imperialista
É bastante claro que, se falta vacina à população dos países atrasados, tais países tendem a virar o epicentro da doença. Ao decorrer da explosão de casos, surgiu uma nova variante, diretamente atrelada à falta de disponibilidade de imunizantes. Tais variantes podem vir a driblar o sistema imunológico mesmo das pessoas já vacinadas; é preciso, ainda, avaliar se a variante ômicron diminui a eficácia das vacinas e como isso ocorre. Mas fato é que os casos de COVID-19 voltaram a aumentar na Europa e já representam uma nova ameaça à humanidade. A variante ômicron acaba de ser detectada, enquanto estas linhas são escritas, na Alemanha e na Itália.
O combate ao COVID-19 só pode se dar em escala global; todavia, na medida em que quebrar as patentes da indústria farmacêutica e, com isso, atacar seu monopólio, é uma pré-condição necessária para vacinar amplas massas e combater a doença tem-se um impasse: combater o coronavírus de maneira definitiva, agora, entra em contradição com os interesses das corporações farmacêuticas.
Nesta queda de braço, fica bastante evidente quem está levando vantagem: mais uma vez, os capitalistas vêm obtendo sucesso ao subordinar o conjunto do povo à sua ditadura.
“Apartheid de vacinas”
Foi com o termo “apartheid de vacinas” que o presidente da África do Sul caracterizou o processo em curso. Isso porque, além de estarem submetidos à falta de vacinas – a África do Sul chega a apenas 25%, enquanto grande parte dos países africanos não ultrapassa os 10% –, também estarão submetidos a uma segregação espacial.
Isto é, os africanos agora sequer poderão sair de seu território, por conta das restrições e sanções aplicadas para tentar frear o avanço do coronavírus. Além de estarem submetidos aos interesses escusos da indústria farmacêutica, que impedem a quebra de patentes e formam uma verdadeira ditadura contra o povo, sequer poderão sair de seu território!
A situação é absolutamente intolerável, o imperialismo “democrático” domina completamente a vida dos africanos e a ele os subordina. A economia dos países africanos, com a falta de vacinas e o consequente surto de novas variantes (que, inclusive, ameaça todo o mundo), ter-se-á um atraso na indústria e no conjunto da economia africana. Há, neste cenário, apenas a crise dos países africanos, submetendo-os ainda mais à ditadura do Capital.
Até a OMS denuncia a falta de vacinas
A OMS chegou a comentar a respeito dessa desigualdade na distribuição das vacinas. Defenderam a tese de que, ao manter a vacinação lenta, impede-se o combate ao coronavírus nesses países e, com isso, criam o risco de novas mutações – que podem afetar, inclusive, os países desenvolvidos.
Obviamente, trata-se de uma defesa muito moderada: a OMS não levou, nem pode levar, a frente uma luta pelo fim das patentes e para ampliar a vacinação – até porque a própria OMS se trata de uma própria organização imperialista. No entanto, esses comentários servem para evidenciar a gravidade da situação.
Até hoje a África sofre com doenças há muito erradicadas
Não é a primeira vez que os monopólios da indústria farmacêutica matam os africanos e espalham doenças. O caso das epidemias de AIDS é o paralelo mais forte. Enquanto a epidemia de HIV está controlada ao redor do mundo, na África, segue sendo um grande problema. Em alguns lugares, como na África do Sul – o país mais desenvolvido no continente africano –, mais de 15% da população está infectada com o vírus causador da AIDS!
Embora com aproximadamente 15% da população mundial, o continente africano concentra cerca de 70% dos casos de AIDS em todo planeta! E o surto de contaminação e mortes no continente também é resultado do projeto da indústria farmacêutica.
No caso da COVID-19, os países ricos (como o Canadá) adquirem o equivalente a 6 vezes toda a sua população, os países atrasados não chegam a 2% da população vacinada. Trata-se de um projeto da indústria farmacêutica, em fazer o apartheid da vacina no caso da COVID-19, algo já feito com o vírus da AIDS.
Os antirretrovirais (medicamentos usados para tratar a AIDS e possibilitar a vida do portador do vírus) são protegidos por patente, isto é, as empresas da indústria farmacêutica mantém o monopólio do direito de produzi-lo, mantendo para si o segredo industrial da produção. Com isso, faltam medicamentos nos países africanos, que são vendidos a preços estratosféricos.
O caso da AIDS é apenas o exemplo mais conhecido, mas também não é o único. A ditadura do imperialismo mata o povo de fome e de doenças, espalhando sofrimento para todos os trabalhadores e, em especial, para os trabalhadores dos países atrasados. É preciso quebrar a patente das vacinas contra o COVID-19, derrubar o monopólio das indústrias farmacêuticas – não há método de combater o COVID-19 que não passe por organizar o povo contra o imperialismo.