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Victor Assis

Editor e colunista do Diário Causa Operária. Membro da Direção Nacional do PCO. Integra o Coletivo de Negros João Cândido e a coordenação dos comitês de luta no estado de Pernambuco.

Enfrentamento

Sérgio Camargo, a esquerda e a luta do negro (parte 5/5)

Série de artigos procura aprofundar a polêmica estabelecida em torno da homenagem da Fundação Palmares à princesa Isabel

Chegamos enfim ao último texto sobre a luta do povo negro, partindo de algumas considerações feitas pela esquerda pequeno-burguesa em reação à iniciativa criminosa de Sérgio Camargo, presidente da Fundação Palmares, em homenagear a princesa Isabel do Brasil. No texto de hoje, continuaremos a nossa discussão, dando atenção particularmente ao problema da conciliação.

Leia também: Parte I | Parte II | Parte III | Parte IV

V – Enfrentamento

Antes de inciar propriamente a discussão de hoje, farei uma breve retomada da polêmica que estabelecemos nos textos anteriores. Em primeiro lugar, explicamos que considerar a abolição da escravidão como algo sem importância era uma simplificação grosseira da história — dito de outra forma, que a luta do povo negro por sua libertação não teria conquistado vitória alguma. Em um segundo momento, avaliamos que a abolição da escravidão não um problema em abstrato, cuja resolução estaria acima de qualquer processo histórico, mas sim um dos aspectos de uma luta política de caráter mundial que estava em curso. Em seguida, demonstramos que os momentos históricos em que o negro teve condições de intervir diretamente na situação política não se resumiram à luta contra a escravidão — e que, portanto, não se pode conceber que as condições de vida do negro hoje são única e exclusivamente derivadas das medidas tomadas pela princesa Isabel. Por fim, esclarecemos que a política que o povo negro defende é expressa sobretudo pelos choques entre o negro e o regime político, e não por meio de instituições autodeclaradas como representantes do povo negro.

Em todos os casos que analisamos, o método de luta do povo negro para conquistar os seus direitos ficou bastante claro. Seja para se libertar da escravidão, seja para acabar com a dominação francesa ou seja para abolir os castigos da marinha, o método consistia em organizar o povo negro e seus aliados circunstanciais para enfrentar aqueles que eram a causa de seu martírio. O movimento revolucionário que de fato forçou o regime a abolir a escravidão não teve êxito porque sentou-se ao gabinete imperial da princesa Isabel para expor suas revindicações. Houve advogados, jornalistas e tipos parlamentares que, de fato, participaram da campanha geral pela abolição. No entanto, a ação que inviabilizou a escravidão foi o enfrentamento dos escravos ao regime, fugindo dos locais de trabalho forçado, organizando revoltas violentas e até mesmo organizando grupos de assalto que libertavam seus companheiros à força.

O movimento revolucionário do Haiti fala por si só. E justamente por sua clareza é que é um episódio ocultado sistematicamente da historiografia mundial. Os negros partiram para um confronto aberto com os colonizadores: foram 12 anos de guerra civil que levaria à libertação do incipiente povo haitiano.

Poderíamos dizer que a Revolta da Chibata conseguiu ser vitoriosa sem a tomada do poder por parte do povo negro. No entanto, os métodos utilizados por João Cândido e pelos seus companheiros não permite qualquer confusão a respeito da questão do enfrentamento. Os marinheiros pobres, vítimas do regime da República Velha, confiaram nas próprias forças e apontaram todo o equipamento de guerra que tinham em suas mãos contra a sede do poder político. Além de terem lançado mão de métodos de guerra, faço também a ressalva de que a vitória da Revolta da Chibata só foi sustentada porque havia, naquele período, uma crise social generalizada, que seria expressa por vários outros movimentos, como a própria greve geral de 1917, e, por fim, a Revolução de 1930.

No quarto texto dessa série, não citei um grande episódio da luta do povo negro, mas apenas um acontecimento local, acontecido na cidade do Recife. Contudo, trago de volta o exemplo porque ajuda a demonstrar o caráter universal da questão. Enquanto o “movimento negro” fajuto defendia um pacote de generalidades, o povo negro e pobre das favelas, que expressam, de maneira muito clara, os setores que estão sendo esmagados pela política da direita golpista, defendia uma política abertamente contra os seus inimigos: invadir o prédio onde mora a burguesia racista, matar os responsáveis pelos assassinatos, acabar com a polícia militar, derrubar o governo Bolsonaro.

A conclusão que nós somos obrigados a tirar é que o povo negro, embora não seja uma classe em si, desenvolve a luta em torno de suas necessidades no terreno da luta de classes. Isto é, em todos os momentos em que o negro se organizou para travar uma luta séria, firme, implacável, pela sua própria sobrevivência, essa luta nunca esteve dissociada da luta contra a classe dominante. Nunca foi uma luta contra as leis, mas sim uma luta contra a classe que rege tais leis. E como uma luta contra essa classe, ela necessariamente passaria por um enfrentamento com os representantes dessas classes.

Para tentar confundir a questão do enfrentamento, a burguesia tem lançado mão de inúmeros expedientes. Um deles, que se viu ao longo da história, inclusive em todos os episódios que tratei nas colunas anteriores, é o de utilizar os “negros da casa” para sua campanha suja: Fernando Holiday, Sérgio Camargo e tantos outros que procuram se infiltrar no movimento negro para promover uma conciliação forçada com a direita. Não podemos cair nessas armadilhas.

A hora de fazer jus à luta de todo o povo negro é agora. Como podemos concluir após a discussão feita ao longo dessa série, a princesa Isabel, o que ela fez ou o que ela deixou de fazer não têm a menor importância para a luta do negro hoje. O que importa é que, assim como o negro se via confrontado, naquela época, com um regime estabelecido para lhe explorar até a último gota de sangue, hoje, o negro é tratado como lixo pela classe dominante. É preciso, portanto, derrubar o regime político de conjunto, é preciso se livrar de todos os representantes da burguesia racista que estão no poder.

Concretamente, isso significa dizer que é preciso organizar o povo negro para derrubar o governo Bolsonaro e, junto com ele, derrubar todos os seus lacaios, incluindo o presidente da Fundação Palmares. Ao negro, não cabe pedir que Sérgio Camargo se retrate publicamente. Nem tampouco provocar o Judiciário para que ordene que a Fundação Palmares cumpra seu papel institucional. Não se trata, portanto, de procurar um substituto para chefiar a Fundação, mas sim de arrancar-lhe de lá pela força e colocar o movimento negro — não a instituição que assim se denomine, mas sim os negros nas ruas — para tomar conta de tudo o que diz respeito ao povo negro. É preciso pôr abaixo todo o regime político golpista e, sob a base de uma verdadeira mobilização popular, garantir que os interesses do povo negro sejam efetivamente atendidos.

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