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Justa homenagem

Victor Jara é tema de disco do líder do Manic Street Preachers

A vida e a obra do grande cantor, compositor e ativista comunista chileno Victor Jara foi a inspiração do disco "Even In Exile", que acaba de ser lançado.

O cantor, compositor e ativista comunista chileno, Victor Jara, morto pelas forças da repressão do golpista Augusto Pinochet em 1973 é tema do novo disco solo de James Dean Bradfield, mais conhecido como o cantor, guitarrista e líder da banda do País de Gales Manic Street Preachers.

“Even In Exile” foi lançado no último dia 14 de agosto e é um disco conceitual baseado na vida e obra de Jara e conta com onze faixas, quase todas elas escritas por Bradfield e com letras de Patrick Jones. A única música que não é da dupla é “La Partida”, uma interpretação da música instrumental de Victor Jara que saiu originalmente no LP “El Derecho de Vivir En Paz” de 1971. Segundo Bradfield as canções do álbum tratam mais das ideias transmitidas por Jara, que são relevantes até os dias de hoje, do que apenas uma narrativa dos fatos de sua vida.

A gênese do projeto de Bradfield foi em 2016 com o poeta Patrick Jones, irmão de Nicky Wire, baixista do Manic Street Preachers, que encontrou duas coletâneas em vinil de Victor Jara e se tornou obcecado pelo cantor chileno, escrevendo dezenas de poemas sobre a vida do revolucionário. Jones leu também o livro de memórias escrito por Joan Jara, viúva de Victor, “An Unfinished Song: The Life Of Victor Jara” (1984, “Canção Inacabada: A Vida de Victor Jara”). Para Jones a história do golpe de estado e a instalação do governo fascista de Pinochet parece ter ressonância com o momento político atual onde o fascismo ressurge em todo o mundo com muita força.

Jones dividiu sua fascinação com James Dean Bradfield e ambos criaram as canções de “Even In Exile”, que trata da vida de Jara desde sua infância rural (na faixa “The Boy From The Plantation”) até as suas últimas horas no Estádio Chile (na música “The Last Song”).

Mas este não foi o primeiro encontro de James Bradfield com o nome de Victor Jara. Como um fã do Clash ele conhecia muito bem a canção “Washington Bullets”, que a banda havia lançado no LP triplo “Sandinista” de 1980. Nessa música a banda discute o imperialismo, desde a Revolução Cubana de 1959 até o fracassado levante dos Sandinistas na Nicarágua e citando o golpe no Chile em um dos versos:

“As every cell in Chile will tell
The cries of the tortured men
Remember Allende, and the day before,
Before the army came
Please remember Victor Jara,
In The Santiago Stadium,
Es verdade – those Washington Bullets again”

Numa tradução livre:

“como toda célula no Chile vai te dizer
os gritos dos homens torturados
Lembre-se de Allende e o dia anterior
Antes da vinda do exército
Por favor lembre-se de Victor Jara
No Estádio Santiago
É verdade – aquelas balas de Washington outra vez”.

O Clash cometeu um engano, o Estádio chama Chile. Hoje em dia esse local foi renomeado Estádio Victor Jara. Outro encontro com o nome de Victor Jara foi quando Bradfield assistiu ao filme “Missing” de 1982, onde ouviu pela primeira vez uma das músicas de Jara, “Manifiesto”.

Victor Jara

O grande Victor Lidio Jara Martinez nasceu em 28 de setembro de 1932 em San Ignacio no Chile. Seus pais, Manuel Jara e Amanda Martinez eram agricultores. Seu pai era analfabeto e obrigou os filhos a trabalharem na terra desde jovens ao invés de enviá-los para a escola. Victor começou a lavrar a terra aos seis anos de idade. Como Manuel não era capaz de sustentar sua própria família começou a beber e com isso se tornou cada vez mais violento, abandonando o lar quando Victor ainda era uma criança.

A mãe Amanda criou sozinha as crianças e insistiu em que elas tivessem uma boa educação. Victor aprendeu com ela a tocar o piano e o violão. Amanda costumava se apresentar em festas, casamentos e funerais na cidade com um repertório de música folclórica. Ela morreu quando Victor tinha 15 anos. Esta época da vida de Jara é cantada na canção “The Boy From The Plantation” do álbum de James Dean Bradfield.

Após a morte de Amanda Victor entrou em um seminário onde pretendia se tornar um padre. Após alguns anos, desiludido com a fé católica, deixou a instituição e passou vários anos no exército, antes de voltar à sua cidade natal para seguir uma carreira como músico e ator.

Em 1957 ele conheceu a cantora Violeta Parra na Universidade do Chile. Violeta era uma ferrenha defensora da composição de novas músicas baseadas nas formas tradicionais do folclore chileno. Ela fundou várias comunidades musicais que ficaram conhecidas com o nome de peñas, onde incorporava a música folclórica na vida dos chilenos modernos. Victor absorveu o conhecimento trazido por Violeta e começou a cantar com um grupo chamado Cuncumén, onde continuou seus experimentos com a música tradicional chilena. Com o Cuncumén ele participou dos primeiros quatro discos, entre 1957 e 1962. A influência de Violeta Parra sobre Victor Jara foi a inspiração para a canção de Bradfield “From The Hands Of Violeta”.

No início dos anos 60 Victor se filia ao Partido Comunista Chileno após fazer visitas a Cuba e à União Soviética. Seus primeiros discos são “Victor Jara” (1966), “Canciones Folklóricas de América” (1967, em colaboração com o grupo Quilapayún), “Victor Jara” (1967), “Pongo en Tus Manos Abiertas…” (1969) e “Canto Libre” (1970). De 1966 a 1969 Jara foi também diretor musical do grupo Quilapayún.

Uma de suas músicas mais controversas é “Preguntas Por Puerto Montt” do álbum “Ponto en Tus Manos Abiertas…”. Essa música faz referência ao Massacre de Puerto Montt que ocorreu em 9 de março de 1969 em Llanquihue. Foi durante o governo democrata cristão de Eduardo Frei Montalva. Nesse episódio dez habitantes da província foram mortos pela polícia chilena incluindo um bebê de apenas 9 meses, além de mais 70 feridos. Esse massacre se deu por causa de uma ocupação de uma área chamada Pampa Irigoin em Puerto Montt por 90 famílias de sem-terra que construíram lá suas casas. A ação contra as famílias foi feita por 200 homens armados que invadiram o local durante a noite. A responsabilidade da ação foi colocada sobre o então Ministro do Interior, Edmundo Pérez Zujovic, que acabou sendo assassinado dois anos depois por uma ação da Vanguarda Organizada do Povo (VOP) como vingança pelo massacre. O episódio de Puerto Montt inspirou a canção “There Will Come a War” do disco “Even In Exile”.

Em 1970 foi eleito o novo presidente, Salvador Allende, que foi considerado o primeiro marxista a ser eleito presidente em uma democracia liberal na América Latina. Jara apoiou e fez vários shows para a campanha de Allende. Ele compôs a música “Venceremos”, que se tornou a música tema da coalizão Unidade Popular, uma aliança que reuniu os partidos de esquerda como o Partido Socialista, Partido Comunista, o Partido Radical e o Social Democrata, entre outros.

Durante o curto período da presidência de Allende Victor Jara e sua esposa Joan foram participantes ativos da renascença da cultura no país, organizando eventos culturais que apoiavam o novo governo. Jara musicou poemas de Pablo Neruda e cantou em um evento em homenagem ao poeta quando este ganhou o prêmio Nobel em 1972.

Os últimos discos de Victor foram “El Derecho de Vivir en Paz” (1971), “La Población” (1972) e “Canto Por Travesura” (1973). A música “El Derecho de Vivir en Paz” foi dedicada ao líder comunista vietnamita Ho Chi Minh. Essa música foi cantada nos protestos no Chile em 2019.

O golpe militar liderado por Pinochet aconteceu em 11 de setembro de 1973. Jara foi capturado pelas forças repressivas no dia seguinte, junto com milhares de outros integrantes de grupos de esquerda e aprisionado no Estádio Chile. Foi torturado e morto com um tiro na cabeça. Em seguida seu corpo foi crivado por mais de 40 balas. O corpo de Victor ficou exposto na frente do Estádio do Chile para que fosse visto pelos outros prisioneiros. Foi depois jogado na rua, em frente ao estádio junto com centenas de outras vítimas do exército. Seu corpo foi encontrado e levado a um necrotério onde foi entregue à viúva Joan. Ela conseguiu fazê-lo ser enterrado rapidamente e fugiu em seguida para o exílio.

James Dean Bradfield

James Dean Bradfield é o líder do Manic Street Preachers, grupo formado em Blackwood, no País de Gales em 1986. O grupo é reconhecido por ser um dos mais explicitamente politizados do rock britânico e com viés bem esquerdista. Segundo seus integrantes o grupo foi influenciado pelo Clash e Sex Pistols. Basta dizer que em 2001 eles se tornaram a primeira banda de renome a tocar em Cuba, no Teatro Karl Marx para uma plateia que incluiu Fidel Castro. A apresentação rendeu um DVD, “Louder Than War”. O título do DVD veio de uma conversa com Fidel. A banda avisou que o show seria alto, muito alto. Mas Fidel respondeu: “não pode ser mais alto que a guerra”.

Neste “Even In Exile” James fez todas as vozes e gravou quase todos os instrumentos com a exceção da bateria.

Quando estava compondo as músicas de “Even In Exile” Bradfield fez uma comparação com as letras da música “If You Tolerate This Your Children Will Be Next” que o Manic Street Preachers lançou em 1998. Nessa canção o grupo faz referências à Guerra Civil Espanhola e aos voluntários do País de Gales que largaram tudo para se juntar aos lutadores espanhóis que combatiam os exércitos do ditador Francisco Franco.

Segundo Bradfield: “você pode se engajar na política, escrever sobre ela, mas há como você sacrificar tudo como fizeram essas pessoas então olhe no espelho e se lembre disso. Victor Jara realmente morreu pelo que ele acreditava”.

Assim como James Dean Bradfield conheceu Victor Jara através do Clash a sua esperança é que os novos ouvintes o conheçam agora através deste “Even In Exile”.

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