O segundo turno das eleições possibilitou aos golpistas uma segunda chance para se realocarem na administração dos municípios brasileiros. Através de eleições completamente controladas, a direita usou e abusou de todos os artifícios para restabelecer seu domínio político. Embora toda manobra orquestrada tenha sido realizada no sentido de estabilizar o golpe de 2016, os resultados apontam para uma outra questão: a falência do sistema político. Diante de tal falência, qual direção a esquerda deve tomar? Mobilizar as massas ou insistir no erro da Frente Ampla?
Não basta analisarmos o percentual de votos de cada candidato, é preciso observar a relação dos vencedores com o total de votos válidos. Obviamente, a imprensa golpista busca apresentar as abstenções como simples efeito da pandemia, quando na realidade essa seria a expressão da crise política. Basta somarmos o total de votos nulos, brancos e as abstenções para termos uma ideia da insatisfação popular. Ao todo, podemos destacar que – mesmo controlando todo o processo eleitoral – a direita não tem apoio da população.
Em São Paulo, Bruno Covas (PSDB) venceu no segundo turno com 59,38%, enquanto Guilherme Boulos (PSOL) obteve 40,62% dos votos válidos. No entanto, somando abstenções, votos brancos e nulos chegamos a 44,97%. No Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM) venceu com 64,1% e Marcelo Crivella (PR) obteve 35,93%. Ao somarmos abstenções, votos brancos e nulos temos um total de 54,25%. Em Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB) venceu com 54,63% enquanto Manuela D’Ávila (PCdoB) obteve 45,37% dos votos válidos. Nesse caso, o somatório das abstenções, votos brancos e nulos chegou a 39,59%. Já no Recife, João Campos (PSB) venceu com 56,27% ao passo que Marília Arraes (PT) obteve 43,73% dos votos válidos. Enquanto isso, abstenções, votos brancos e nulos chegaram a 33,91%. Essa, no entanto, foi apenas uma pequena demonstração do ocorrido no segundo turno. Em todos os casos, esse foi o diagnóstico apresentado: falência múltipla do regime político e dos partidos burgueses.
O caso do Rio de Janeiro pode ilustrar bem tamanha crise. Mesmo com o apoio de boa parte da esquerda, no caso PT, PCdoB e PSOL, o candidato do DEM obteve seus 64,1% sobre seus 33,6% votos, enquanto o total de abstenções bateu 35,5% do total, isto é, seu número de votos foi menor do que o número de abstenções. Em São Paulo, a situação não foi diferente. A vitória da coligação entre PSDB, MDB, PP, Podemos, PSC, PL, Cidadania, DEM, PTC, PV e PROS é a vitória da fraude, das eleições mais controladas e antidemocráticas dos últimos tempos. Com 30,81% de abstenções – maior índice desde 1996, a cidade de São Paulo viu mais uma vitória dos tucanos, que conservam nas mãos boa parte da burocracia do Estado. De um modo geral, podemos dizer que os candidatos que venceram o 2º turno são minoritários, pois as abstenções, votos brancos e nulos são muito grandes, Nesse sentido, 50% dos votos válidos, na realidade, é um apoio bem menor que este número.
Afora o alto índice de rejeição, as eleições serviram como um aviso a toda esquerda frente amplista. Como se pode observar, a bússola da esquerda que defende a Frente Ampla está apontando para o sentido contrário aos interesses da população. Mesmo com toda a propaganda da imprensa golpista, está claro para boa parte da população que, por parte dos políticos, não houve o menor interesse em resolver os problemas fundamentais que assolam a população. Diante do agravamento da crise econômica, a total inépcia em combater o novo coronavírus, o aumento do desemprego e a redução do auxílio emergencial, o recado ainda não foi traduzido de uma maneira concreta, mas já aponta para uma saída não institucional. Negar isso, é negar a realidade. Ao optar pela Frente Ampla, a esquerda se transforma em ponto de apoio da direita para depois ser descartada. No final das contas, o resultado será desastroso para a esquerda de conjunto.
Esse índice de abstenções, votos nulos e brancos revelam uma enorme crise do sistema político. Isso porque com todo o recurso que foi gasto pela burguesia para mobilizar a população a votar através de muita demagogia e propostas de ‘mudanças’. Mesmo com valores extremamente elevados em gastos de campanha, o resultado da participação popular foi o menor de décadas e mostra uma rejeição.
Enquanto a esquerda reformista é atraída pela direita, as massas apontam para necessidade de uma completa transformação do sistema político. Essa insatisfação, porém, ainda não foi canalizada de forma objetiva e concreta; resta-lhes uma direção para que todo esse descontentamento se transforme numa rebelião popular capaz de modificar a correlação de forças. É preciso, no entanto, materializar essa animosidade através de uma ampla mobilização popular nas ruas pelo Fora Bolsonaro e Todos os Golpistas, pela restituição dos direitos políticos do ex-presidente Lula e Lula candidato em 2020.