A desistência da candidatura de Marcelo Freixo (PSOL) à candidatura à prefeitura da cidade do Rio de Janeiro continua repercutindo amplamente no interior da esquerda nacional. Afinal de contas, trata-se o da capital do segundo estado mais importante do País, e Marcelo Freixo, embora seja integrante de um partido de segundo plano na política nacional, apresentava condições para chegar ao segundo turno da disputa.
A decisão do parlamentar do PSOL, entretanto, tem sido interpretada de maneira equivocada pelo conjunto da esquerda pequeno-burguesa. Apresentada como um gesto de nobreza, de sacrifício próprio, a desistência é a expressão, na verdade, da política criminosa e reacionária de frente ampla, defendida sistematicamente pelas alas mais direitistas da esquerda nacional. Tendo em vista esclarecer o debate, selecionamos, para este artigo, algumas declarações de figuras públicas:
“Me solidarizo com o amigo e companheiro Marcelo Freixo, que abriu mão de sua candidatura. Lamento pela decisão num momento de tantas perversidades em que a unidade da esquerda e setores democráticos é fundamental para garantir direitos ao povo e derrotar o governo Bolsonaro” — Edmilson Rodrigues (PSOL-AP)
“O gesto de Marcelo Freixo ao não disputar a eleição carioca, na qual tinha grandes possibilidades, para se dedicar integralmente à luta democrática nacional é forte, de enorme significado” — Orlando Silva (PCdoB-SP)
“Querido amigo Marcelo Freixo, um abraço com o companheirismo de sempre. Seu gesto em defesa da unidade política e da superação de divergências menores é uma manifestação em defesa do Brasil e da democracia. Que estejamos todos juntos, como o momento nos exige” — Manuela D’Ávila (PCdoB-RS)
“A decisão do Freixo é triste, mas acertada. Sua força na Câmara nesse momento é fundamental pro país. Sem ele lá, estaremos ainda mais ferrados. E com a desunião da esquerda, ele provavelmente não venceria pra Prefeito. Freixo foi altruísta e corajoso” — Felipe Neto (youtuber)
Como se vê, a esquerda pequeno-burguesa — não consideramos aqui Felipe Neto como parte da esquerda, tendo este aparecido aqui somente porque passou a ser apresentado como referência intelectual para setores da pequena burguesia progressista — repete, novamente, a prática de elogiar a política da capitulação, da desistência, da fuga. Foi assim no golpe de Estado na Bolívia, em que Evo Morales abandonou o seu povo à própria sorte, foi assim quando o ex-deputado Jean Wyllys trocou a política pelos estudos em Harvard e foi assim quando Bernie Sanders jogou no lixo seu programa social-democrata para apoiar o herdeiro político de Barack Obama, entre tantos outros casos.
Assim como nesses casos, o elogio a esse tipo de prática não só reflete princípios mal definidos, como, fundamentalmente, uma adesão inevitável à política de aliança com os setores inimigos da classe operária. Em todos esses casos, a classe operária saiu francamente derrotada — afinal de contas, o derrotismo, o reconhecimento de que a esquerda não consegue, por meio de suas forças próprias, levar adiante à luta política, obriga esses setores a forjar uma aliança cada vez mais profunda com a direita.
A capitulação na Bolívia deu lugar a uma ditadura, a capitulação de Jean Wyllys não diminuiu o assassinato dos setores oprimidos, a desistência de Bernie Sanders levará o povo norte-americano ao terrível dilema de ter de definir seu voto entre Donald Trump e Joe Biden. No caso da desistência de Freixo, onde a esquerda chegará com essa política?
A justificativa de Freixo para ter abandonado a candidatura é a de que seu nome não teria conseguido unificar a “esquerda” — sobretudo o PCdoB e o PSB — e, por isso, não seria vitoriosa nas eleições. Forçosamente, chegaríamos à conclusão de que, levando em conta que o PSB e o PCdoB são partidos bastante integrados ao regime e que têm um histórico de acordos com setores da burguesia como o MDB, Freixo deverá ser substituído por alguém ainda mais à direita que ele — que já é um político bastante direitista. Ao que tudo indica, o nome que seria apoiado por esses setores seria o do ex-prefeito Eduardo Paes, que atualmente se encontra nas fileiras do Democratas, principal partido da ditadura militar de 1964-1985.
Ao elogiar a posição de Freixo, dando a entender que desistir de sua candidatura foi uma decisão correta e que, de fato, não seria possível alcançar uma unidade com o PSOL encabeçando uma aliança, a esquerda pequeno-burguesa acaba assinalando que, de fato, o novo candidato deveria estar mais à direita de Marcelo Freixo — isto é, fosse de maior consenso entre a direita. A solidariedade, assim, não é propriamente com Marcelo Freixo, que não está ganhando nada com a desistência, mas basicamente com a direita, que será a grande beneficiária do gesto do psolista.
O apoio a uma candidatura da direita no Rio de Janeiro não só tornará a frente idealizada pelas esquerdas ainda mais direitista, como, efetivamente, não deve ter qualquer ganho. O povo será obrigado a escolher entre um elemento da extrema-direita, como Marcelo Crivella, ou o próprio candidato do “centrão”, que já é odiado há muito tempo pelos seus ataques ao povo. Nesse cenário, a extrema-direita tende a sair vencedora.
É preciso, portanto, partir para uma outra política que não seja a de ficar a reboque da iniciativa da direita. É preciso organizar a esquerda e os trabalhadores para formar uma frente de luta, independente da burguesia, para derrubar, nas ruas, esse regime político mofado e golpista!