Na semana passada, caiu a máscara de juiz imparcial de Sérgio Moro, quando tornou-se público que o magistrado vinha barganhando havia meses ou bem o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) ou bem o posto de ministro da Justiça. O nazista Jair Bolsonaro, presidente supostamente eleito, optou pelo posto no Poder Executivo, e o vice-presidente Hamilton Mourão revelou que a negociação era antiga. Evidentemente, isso constitui uma prova de envolvimento político e de parcialidade de Moro, o Mazzaropi da Odebrecht, na condenação, prisão e impedimento da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Com base nessa nova revelação, a defesa do ex-presidente entrou com novo pedido de habeas corpus junto ao STF na última segunda (5). O recurso foi encaminhado à Segunda Turma da Côrte, composta por Cármen Lúcia, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski.
A bem dizer, o pedido de liberdade provisória é o mínimo a ser feito diante da perseguição política perpetrada pela Operação Lava-Jato contra a esquerda e mais especificamente contra Lula: provavelmente deve ser demandada a nulidade de todo o processo. A nomeação de Moro ao cargo de ministro só mostra aquilo que já era visível à luz do dia: o juiz, elementos da Polícia Federal, o Ministério Público, agiram com finalidade política de modo a perseguir a esquerda, o Partido dos Trabalhadores, e com a finalidade de quebrar importantes setores da economia nacional que vinham se destacando no mercado externo: as indústrias petrolífera e da construção civil. Esta operação e suas congêneres constituem uma das espinhas dorsais do golpe de Estado em curso no Brasil.
Convém lembrar, por isso mesmo, que todo o judiciário está em alguma instância comprometido com o bom andamento do golpe. O STF avalizou formalmente a condução do processo fraudulento de impeachment – inclusive com Lewandowsky presidindo a sessão no Senado –, negando-se até hoje a avaliar o mérito da questão suscitado pelos pedidos de anulação impetrados pela defesa de Dilma Rousseff há mais de dois anos. Foi o STF que negou-se sucessivas vezes a conceder habeas corpus a Lula. Foi o STF quem avalizou por jurisprudência ou por Ações Diretas diversas medidas golpistas inconstitucionais, como a cassação do direito de greve dos servidores públicos ou a prisão de réus condenados em segunda instância. Vale lembrar ainda que hoje a Côrte é comandada pelo general Fernando Azevedo e Silva, colocado pelos militares como “assessor” de Dias Toffoli na Presidência.
Se a Primeira Turma do STF é chamada de “câmara de gás” – de onde ninguém sai vivo – considera-se tradicionalmente que a Segunda Turma do STF tem perfil mais garantista – ou seja, que manipula menos a letra da lei em função de interesses políticos e econômicos, garantindo os direitos e liberdades políticos e individuais dos cidadãos. Em “condições normais” e em casos comuns, certamente seria o caso. Não se pode ter qualquer ilusão, porém, quando o réu é uma liderança popular – ainda mais Lula –, e num contexto de golpe de Estado, em que direitos vêm sendo subtraídos corriqueiramente à população, em que uma presidente legitimamente eleita foi tirada do poder num processo manifestamente ilegal e em que um nazifascista ascendeu ao comando do País por meio de eleições fraudulentas. Da continuidade do encarceramento de Lula depende visceralmente o andamento do golpe de Estado, o aprofundamento dos ataques à população, a privatização e entrega desenfreadas do nosso patrimônio ao estrangeiro. Para Lula, enfim, qualquer instância do Judiciário é hoje uma “câmara de gás”.
Certamente a iniciativa jurídica não basta: somente um processo real de mobilização da classe trabalhadora com seus instrumentos tradicionais de pressão política será capaz de mudar a relação de forças reais em jogo. Não basta a letra da lei, não bastam os acordos de camarilha, não bastam a campanha eleitoral e os votos (jogados no lixo pela fraude nas urnas). Não basta, enfim, o combate inscrito à esfera institucional, completamente dominada pela direita golpista. Numa situação análoga à questão da anulação do impeachment de Dilma Rousseff, o STF só libertará Lula algum dia caso haja uma pressão irresistível do povo nas ruas.