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Nego do Borel

Se deu no Fantástico, a esquerda estala seus chicotes

Depois que os archotes usados para queimar a casa do jogador Robinho apagaram-se, o programa dominical da Rede Globo escolheu outro preto para amarrar no pelourinho

No dia 18 de outubro de 2020, a Rede Globo de Televisão — a mesma cujo diretor geral de jornalismo escreveu um livro afirmando que não existia racismo no Brasil —, resolveu desenterrar um suposto caso de estupro acontecido há sete anos, envolvendo o jogador negro Robinho e uma jovem albanesa. O espetáculo, com direito a vazamentos de áudio, consultas a “especialistas” e muito sensacionalismo, foi apresentado no programa Fantástico, uma espécie de revista televisiva dominical criada pela Globo para execrar seus inimigos em horário nobre. Hoje em dia, o Fantástico ainda cumpre essa função, mas vê sua popularidade despencar semana após semana.

O programa que tratou do suposto estupro, além de rasteiro, mostrou-se também um grande show de cinismo. A Globo, que odeia o futebol, é racista e apoia todas as medidas autoritárias do regime político, utilizou como principal argumento para linchar Robinho a “luta da mulher” contra o que chamou de “cultura do estupro”. Um verdadeiro escárnio, visto que o Fantástico fez sua propaganda imunda contra a presidenta Dilma Rousseff e colaborou para que a extrema-direita fascista e inimiga das mulheres chegasse ao poder.

Um novo caso

Quase três meses depois, no dia 17 do mês corrente, o Fantástico volta a atacar mais um negro: o ator, compositor e cantor de funk Nego do Borel. E, mais uma vez, a demagógica causa da mulher foi usada como pretexto. Nego do Borel foi acusado pelo aparato pirotécnico do Fantástico de ter estuprado e agredido a sua ex-noiva, além de tê-la infectado com o vírus do HPV e possuir um fuzil em casa. A diferença para a reportagem do caso Robinho é que, desta vez, o Fantástico entrevistou a suposta vítima, Duda Reis, e o próprio Nego do Borel, que, tolamente, aceitou subir ao picadeiro para ser exibido como um criminoso.

Estado Democrático de Direito ou Lei da Selva?

Este Diário não almeja apresentar quem, entre Nego do Borel e Duda Reis, está falando a verdade, assim como não se preocupou em fornecer um atestado de boas condutas ao jogador Robinho ou de rotulá-lo como estuprador. A crítica, neste caso, se dá à maneira bárbara como a imprensa burguesa, apoiada pela esquerda nacional, decidiu substituir o Estado Democrático de Direito pelo linchamento público.

Mesmo a sociedade burguesa sendo defeituosa em seus mais variados aspectos, ela tem seus mecanismos para resolver os conflitos que surgem. Quem se sente agredido, tem todo o direito de recorrer à Justiça para ser reparado. E quem se sente injustiçado, tem todo o direito de se defender e demonstrar a incongruência ou ausência de provas de quem o acusa. Há a Lei, discute-se o fato perante a Lei, julga-se, apela-se e emite-se um veredicto.

Mas e se as instituições que deveriam aplicar a Lei falharem? Na verdade, elas irão, inevitavelmente, falhar. Porque não existe uma Justiça divina, nem uma Polícia isenta. As instituições refletem a sociedade de classes. Se a burguesia é a classe dominante, teremos, inevitavelmente, uma Justiça burguesa e uma Polícia burguesa. Uma Justiça e uma Polícia, portanto, voltadas exclusivamente para a defesa da propriedade privada. E como a propriedade privada força a desigualdade entre os homens, a Justiça será desigual por definição.

Dito de maneira mais simples: a Justiça irá falhar porque quem mais detém poder na sociedade de classes será mais beneficiado. Se um trabalhador processar seu patrão, sairá sempre derrotado. Mesmo que ganhe o processo, sua “vitória” será insignificante diante da expropriação sistemática que a burguesia opera contra a classe operária de conjunto.

Ora, mas se as instituições são falhas, não seria democrático que aquele que não tivesse seus interesses atendidos partisse para uma outra forma de conseguir ser reparado? Depende.

No caso de um trabalhador que é frustrado ao processar seu patrão, a sua única solução está na luta para derrubar a ordem vigente. Sua luta passará, obrigatoriamente, por uma luta coletiva que transforme o Poder Judiciário em uma instituição sob maior controle popular. O mesmo pode se dizer de um negro que é esfolado pela Polícia simplesmente porque estava andando “no lugar errado, na hora errada”. Só poderá conhecer a Justiça se lutar por uma nova Polícia, que esteja sob o controle do povo, e não sob o controle de seus inimigos.

Se francamente Duda Reis se sentiu abusada por Nego do Borel e achou que a Justiça não iria lhe ajudar em absolutamente coisa alguma, a exposição de seu caso para os abutres da imprensa capitalista não irão surtir qualquer efeito positivo. Porque, neste caso, não se trata e uma tentativa do povo reparar as injustiças da Justiça burguesa, mas sim da tentativa de dissolver o Estado para que os capitalistas apliquem a sua própria Justiça de maneira direta.

Consideremos, por exemplo, que Nego do Borel seja acusado pelas vias normais. Ele será julgado por um juiz, que, embora quase sempre corrompido pela burguesia, é um homem do Estado, que deve procurar, ao menos na aparência, se manter isento. Nego do Borel disporá de um advogado, terá mais de uma oportunidade de se defender, chamar testemunhas em sua defesa, apresentar as contradições de quem lhe acusa etc. Se perder o processo, pode apelar, ir até a segunda instância, até finalmente ser condenado ou absolvido.

A via da Rede Globo, contudo, é uma via bárbara. A Globo é um gigantesco monopólio da imprensa brasileira e que opera tão somente pela iniciativa privada. Não há absolutamente coisa alguma que seja de controle público na Globo, ao mesmo tempo em que não há qualquer tipo de concorrência. Por definição, aquilo que a Globo decidir fazer, assim será: é a expressão de uma ditadura. Se a Globo decidir atacar alguém publicamente, como essa pessoa irá se defender?

Foi o que a Globo fez, por exemplo, durante todo o golpe. Ao transformar seus programas em tribunais de acusação contra os dirigentes do PT, impôs uma perseguição implacável.

A Justiça que se opera através da Rede Globo é bárbara porque é, finalmente, a Lei da Selva. Vence, obrigatoriamente e de maneira imediata, o mais forte. Sem advogado de defesa, apresentação de provas ou tribunal de apelação.

A esquerda pequeno-burguesa estala o chicote

Sem um mínimo juízo crítico da atitude animalesca da Rede Globo, que trouxe ao seu programa um negro para ser julgado e açoitado pelos seus senhores, a esquerda pequeno-burguesa não tardou em correr para o pelourinho e atacar Nego do Borel moralmente.

“Ex-namorada do bolsonarista Nego do Borel denuncia relacionamento abusivo: ‘Era refém, me sentia ameaçada'” (Diário do Centro do Mundo, 13/01/2021, citando portal UOL, do Grupo Folha, como fonte)

“Bolsonarista Nego do Borel já foi acusado de agressão por três ex-namoradas” (Diário do Centro do Mundo, 14/01/2021, citando jornal Extra, das Organizações Globo, como fonte)

“Após denúncia da ex-namorada, bolsonarista Nego do Borel perde patrocínio” (Diário do Centro do Mundo, 14/01/2021, citando portal UOL, do Grupo Folha, como fonte)

“Ex-assessora também resolve falar dos abusos que sofria do bolsonarista Nego do Borel” (Diário do Centro do Mundo, 16/01/2021, citando portal UOL, do Grupo Folha, como fonte)

Para o julgamento moral, a esquerda pequeno-burguesa, assim como fez no caso Robinho, encontrou um suposto pretexto político: Nego do Borel seria bolsonarista. Mas o que isso importa?

Nego do Borel não é deputado, ministro, nem presidente. É somente um cantor. Seu valor político, em si, é nulo. Isto é: atacá-lo, prendê-lo ou censurá-lo não levará a mudança política alguma. E mesmo que fosse, estabelecer o tribunal da Rede Globo como o novo paradigma da Justiça é, conforme demonstramos, um retorno à barbárie.

Recentemente, a esquerda pequeno-burguesa resolveu aplaudir a censura de monopólios da internet, como o Twitter, contra o fascista Donald Trump. Mesmo que a esquerda tenha motivos concretos para combater Trump, os motivos alegados pelo Twitter são morais, assim como são morais as acusações contra Nego do Borel. E é no moralismo que reside a fogueira das inquisições: como a moral é abstrata e varia de acordo com as convenções de quem arbitra, qualquer um pode acabar condenado.

A Polícia também assiste ao Fantástico

Na última quinta-feira (28), a Polícia comprovou que a acareação promovida pela Rede Globo daria lugar a uma perseguição completamente arbitrária. Agentes da Polícia Civil do Rio de Janeiro, com o auxílio de agentes do DGPAM (Departamento Geral de Polícia de Atendimento à Mulher), invadiram a casa de Nego do Borel e ainda confiscaram mais de R$470 mil em espécie e o seu passaporte. Uma arbitrariedade sem tamanho. Segundo a imprensa burguesa, até mesmo seu videogame foi levado. Tudo foi filmado, inclusive a cena ridícula de um policial pulando o muro da residência do ator. Não foi encontrado fuzil algum.

Os policias tinham, é fato, um mandado de busca e apreensão. Mas o que justificaria a apreensão dos objetos, que nada têm a ver com os crimes pelos quais está sendo acusado? E mais: Nego do Borel sequer foi julgado, por que teria o seu passaporte tomado, quando há jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal (STF) negando a apreensão de passaporte? Para isso, a esquerda se cala.

Houve, inclusive, várias pessoas, nas redes sociais, que comemoraram a invasão da casa de Nego do Borel. “Nego do Borel tem mais é que se f*”, disse uma usuária do Twitter. Outros, mais criativos, publicaram animações de fogos de artifício. Houve também aqueles mais empolgados chegaram a pedir cadeia: “tomara que o nego do Borel seja preso”. Por fim, os esquerdistas se valeram do mesmo argumento do Diário do Centro do Mundo: “Não podemos deixar de lembrar que Nego do Borel é bolsonarista e está #FechadoComBolsonaroAte2026“.

De um caso a outro, o fenômeno é o mesmo: trata-se de um processo nítido de linchamento público, de destruição de uma reputação. E o que chama mais a atenção: as pessoas que, de repente, criaram tanto ódio por Nego do Borel nunca foram pessoalmente atacadas por ele, nem sequer sabem se ele, de fato, cometeu algum dos crimes apontados. Apenas confiam cegamente no juízo da Rede Globo e, como bons lavajatistas, estão, por pura histeria, permitindo que a direita avance em sua ditadura.

Mulher traída é pior que bala perdida?

Após a invasão da casa do artista, vários comentários na internet diziam, basicamente, a mesma coisa: que aquilo seria uma espécie de vingança pessoal de Duda Reis contra Nego do Borel. Muitos, inclusive, repetiram os mesmos dizeres: “muito mais perigosa que bala perdida, é mulher traída”.

É fato que houve um determinado empenho de Duda Reis no processo. E que na verdade, a perseguição só está tomando corpo porque, por um lado, ela é uma atriz da Rede Globo de família de médicos e que ele, embora endinheirado, seja um negro que veio da favela, assim como Robinho. Os próprios pais de Duda Reis já vinham se posicionando publicamente contra o relacionamento deles. A pequena burguesia que tanto aplaudiu o longa-metragem Corra!, de Jordan Peele, que mostra uma família de brancos encurralando um negro, agora ignora completamente como a classe dominante está sempre preparada para esmagar os setores mais oprimidos…

É fato, também, que houve vários casos em que, por se tratar de uma situação inversa, quando o acusado era de origem rica, o caso não teve qualquer repercussão. É o caso, por exemplo, da modelo Mariana Férrer, que acusou um homem ligado à Rede Globo de tê-la estuprada, mas que não teve apoio algum do monopólio da imprensa capitalista.

Contudo, trata-se de um erro acreditar que Duda Reis, ou qualquer mulher que seja, terá algum ganho pessoal com esse tipo de política. No fim das contas, somente quem ganha é o Estado: torna-se mais forte, mais truculento e mais autoritário. E usará todo esse poder para atacar os setores mais oprimidos da sociedade, entre eles, as mulheres e os negros.

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