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Má oê... quem quer dinheiro?

Johannes Immanuel recebia pix dos holandeses… e daí?

"Sou tua cana, teu engenho, teu moinho", escreveu em carta ao Almirante Henrique Lonck

“Estação Porta Larga!”

Ao berro do vendedor de pipoca, que acumulava, sem remuneração extra, a função outrora cumprida pelos enferrujados autofalantes do metrô, Tio Antônio, condenado ao ensino básico de História durante vinte e oito anos de sua vida, acordou de supetão.

Ali, subiria o último de seus trinta e dois alunos da excursão daquela quinta-feira. Vindo da garagem da Borborema, um pirralho mais feio que briga de foice, com o andar de um pinguim, vinha trazendo sua lancheirinha do Capitão América.

“Estação Monte dos Guararapes!”

Chegaram. Tio Antônio, tão bem humorado quanto o seu salário permitia, catou os pivetes sob sua tutela e os despejou escada abaixo. Atravessaram a rua, subiram o morro e, cinco litros de suor depois, chegaram à Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres.

“É aqui onde estão os restos de duas figuras que participaram da Batalha….”

O menino não escutou mais uma única palavra do mestre. Atraído por uma borboleta, largou a lancheirinha no chão e foi distanciando-se cada vez mais do grupo, indo em direção a um matagal. Após dez minutos de caminhada, encontrou duas lápides, entre as quais o inseto pousou.

“Crac!”

O garoto levou as mãos à boca. As lápides começaram a se mexer. Desesperado, o moleque correu para trás de um arbusto e ficou espiando o que estava por vir.

Brotaram então dois homens, vestidos com roupas esquisitas e cobertos de terra. Afora o aspecto de quem nascera havia quatro séculos, pareciam muito simpáticos. Para a surpresa do menininho, os homens traziam, cada um, um pandeiro à mão. Em questão de segundos, começaram a tocar uma embolada.

Ô Beira mar, beira mar!
Como é linda a maré cheia,
Ver o mar beijando a areia
E a areia beijando o mar!

Repetiram por quatro vezes os versos. Até que o primeiro deles começou o desafio.

Eu sou Vidal de Negreiros,
André é meu primeiro nome.
Cabra macho aqui da terra
Que quando chamam não some!
Sou aqui de Pernambuco
Que nem esse unha de fome!

Seu rival respondeu.

Eu não sou de passar fome,
Eu nasci foi pra ter luxo.
Sou Johannes Imannuel,
Uma espécie de Carluxo,
Eu não tenho nenhum lado,

Só quero encher o bucho.

O garoto perdido não saberia dizer por que, mas identificou-se instantaneamente com o segundo repentista. Foi o primeiro, no entanto, quem continuou o desafio:

Tu não aguenta um repuxo,
Cabra safado vendido.
Eu sei que a tua mãe
Tem aquilo bem fedido
E essa tua voz fina
Mais parece um latido!

Mal terminara a frase, e o segundo repentista já emendara:

Vou gritar no teu ouvido:
Cala a boca boiolão!
Mas não vou deixá-lo surdo,
Eu não vou deixá-lo não,
não vou deixá-lo surdo,
Porque ele é meu irmão.

Por algum motivo, o garoto ficou hipnotizado com a frase “não vou deixá-lo surdo“. Repassou mentalmente tantas vezes que aquilo se tornaria uma espécie de mantra para sua vida adulta.

Foi num dia de verão,
Tava quente pra dedéu.
Eu peguei a minha espada,
Rezei pra papai do céu,
Ajuntei os holandeses
E mandei pro beleléu
.

De minha cana dou o mel,
De meu engenho, o moinho,
Se um holandês pedir
Dou o meu corpo todinho
Sou Johannes Imannuel,
Doe aqui no meu cofrinho.

A admiração pelo segundo repentista crescia cada vez mais.

É melhor fechar o focinho,
Que já tá falando asneira.
Doidinho feito Zuleide,
Que acabou virando freira
Depois de dormir ao lado
Dessa tua sovaqueira!

É melhor ter sovaqueira
Que viver sem um real.
Conheci Amsterdã,
Meu nome sai no jornal,
Apareço até na Globo,
Só falta o Zorra Total.

O garoto ficou deslumbrado. Amsterdã? Rede Globo? Parecia um sonho…

Então vai pra Amsterdã
Vai com teu papo furado!
Vai sair com prostituta,
Vai fumar um baseado!
Prefiro ficar curtindo
As belezas do meu estado.

Não vou sair do estado,
Sou daqui, sou brasileiro.
Tudo que fiz pro holandês
Eu só fiz pelo dinheiro,
Pois aquele que paga a banda
Escolhe a cor do pandeiro
.

Justo!

Seja agora verdadeiro,
Que a falsidade mata.
Judas entregou Jesus
Por trinta cunhas de prata
E você pros holandeses,
De quanto foi a mamata?

Foi o pix de um pirata
No valor de mil reais.
Mas eu juro pra você:
Foi só isso, nada mais.
Recebi todo o dinheiro
E investi na Petrobras.

Fosse como fosse, o segundo repentista nunca suara tanto desde o começo do desafio.

Com esse cabelo pra trás,
Que nem ciscador dá jeito,
Tás dizendo para mim:
“Nassau é amigo do peito;
O holandês manda o pix
E em troca só quer respeito”?

O que está feito, está feito.
Não fale do que não viu.
Eu conheci o Nassau
,
Eu entrei em seu navio,
Mas não sou um traidor
Do meu amado Brasil

O menininho vibrou com a resposta.

Fale aqui com meu fuzil,
Vagabundo traidor!
Vai dizer que o holandês
Dava dinheiro com amor
Só porque viu em você
Um perfil empreendedor?

Cale a boca, meu senhor!
Num segundo te trituro!
Por trás daquele arbusto,
Pode ver o meu futuro:
Vou fazer revolução
Com a Globo me dando furo.

O coração do moleque deu um salto. Fora descoberto? Ficou no mais absoluto silêncio, rezando para que tivesse sido uma coincidência o repentista falar em “arbusto”.

Alma sebosa e pão duro!
Tás pior que aquela empresa
De ônibus, a Borborema.
Uma máfia burguesa,
Que demitiu motorista,
Cobrador e o Zé da limpeza!

Disso, sim, tenho certeza
Está linda a Borborema,

Que demitiu os preguiçoso,
Uma coisa de cinema!
Pense num grande orgulho,
Está linda a Borborema!

“Pense num grande orgulho, está linda a Borborema” também ficaria eternamente gravado na mente do menininho que assistia ao desafio.

Tu tem a mente pequena,
Um pelego é feito um corno.
Acha que está por cima,
Mas só ganha amor morno
Fica só com a pelanca
E o filé, deixa no forno.

Eu não aceito suborno,
Só presente estrangeiro.
Eu não sou o motorista,
Eu sou só um passageiro,
Mas que não dá o lugar
Nem pra cego em tiroteio
.

Depois da fala do segundo repentista, o primeiro deles tirou do bolso uma caixinha de madeira.

Aposto que o mundo inteiro
Ia querer esse tesouro
Foi de Bresa que peguei
Ele vale mais que ouro
Vai acabar com a fome,
Desemprego e mau agouro.

Por ele dou o meu couro,
Por favor me fale mais!
Dizem até que ele vai
Deixar o mundo em paz,
Acabar com Bolsonaro
E até o satanás!

O coração do menininho acelerou ainda mais. Descobriria ele o segredo do mundo? Aproximou o ouvido ainda mais dos repentistas. Antes que retomassem o desafio, contudo, um ronco saiu de sua barriga.

Estava com fome. Lembrou que deixara sua lancheirinha perto da igreja. Ficou no dilema: o lanchinho ou o segredo que promoveria a paz da humanidade? Fosse um asno e quisesse tanto o segredo quanto o lanchinho, ficaria paralisado, pois seria incapaz de decidir entre um e outro. Acabaria, portanto, escutando o segredo.

Mas o moleque não era um asno. E sua fome não era maior que seu interesse em salvar a humanidade. Acabou largando a embolada e danou-se a correr para o Capitão América.

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