(*) Por Tiago Carneiro, correspondente em Luxemburgo
Fortes chuvas assolaram a Europa Oeste, principalmente entre os dias 13 e 15 de Julho de 2021, resultando em fortes inundações nos territórios da França, Luxemburgo, Holanda, Bélgica e Alemanha.
As chuvas já causaram, até o momento, cerca de 196 mortes e o número de desaparecidos, logo após o ocorrido, de acordo com a imprensa capitalista, chegava à casa do milhar (UOL Internacional, 16/07/2021). A maioria dos óbitos concentra-se na Alemanha, onde várias cidades foram destruídas, com cerca de 165 mortos, seguida da Bélgica, que reportou 31 mortos. Em Luxemburgo, onde a chuva não parou por dois dias, foram reportados apenas danos materiais. No total, cerca de 400 pessoas encontram-se alojadas em abrigos e 250 famílias estão sem eletricidade (Wort.lu, 19/07/2021).
Durante a tempestade, em Luxemburgo, foram emitidos “alertas”, mas o serviço de meteorologia é acusado de incompetência por não “prever” que as precipitações pudessem acarretar em inundações.
Também é válido dizer que o Sistema Europeu de Sensibilização para as Inundações (EFAS) chegou a emitir um alerta de “inundações extremas”, o mesmo vale para o Deutscher Wetterdienst (DWD), o Serviço Meteorológico Federal Alemão. Entretanto, mesmo com os avisos, as autoridades das regiões atingidas, exceto em Liege, na Bélgica, não se esforçaram para evacuar os moradores.
De acordo com Hannah Cloke, conselheira do EFAS, a tragédia foi maior porque os moradores das regiões atingidas não receberam os alertas emitidos pelo órgão (Wort.lu, 16/07/2021). Após o ocorrido, o governo alemão foi criticado por não ter avisado corretamente a população sobre a possibilidade de enchente ou realizado uma evacuação. O ministro do Interior alemão, Horst Seehofer, apenas “saiu pela tangente”, dizendo que essa medida cabe aos governos locais (G1, 19/07/2021).
Apesar das autoridades dos países da Europa do Oeste tratarem as inundações como algo isolado, uma fatalidade, é importante dizer que essas inundações não são nenhuma novidade, acontecem todos os anos e são, de certa forma, esperadas. A diferença é que esse ano foi maior que as demais. Quem tiver dúvidas, basta buscar por “crue de la seine xxxx” que será possível, independentemente do ano, encontrar imagens e notícias do rio Sena transbordando ou a ponto de transbordar. O mesmo vale para diversas regiões de Luxemburgo e da Europa do Oeste. Tomemos como exemplo o ano de 2020. É muito fácil encontrar imagens da periferia de Paris com grandes correntezas varrendo a cidade.
Essas inundações são tão costumeiras que em Paris ou na Cidade de Luxemburgo, na “cidade velha”, perto de seus respectivos rios, é possível ver placas que indicam o nível da água atingido na inundação do ano xxxx. Além disso, existem até verbetes na Wikipedia que falam das enchentes de anos anteriores, como, por exemplo, as inundações de 2013 “2013 European floods”. Ou, na França, os jornais e outros veículos de imprensa comparam a situação do ano corrente com a inundação de um determinado ano, ou inundações mais famosas, como a de 1910 (Crue de la Seine de 1910). Portanto, os danos poderiam ter sido minimizados se os governos agissem contra as enchentes.
A irresponsabilidade com a qual os governantes dos países europeus lidam com as chuvas não é muito diferente, por exemplo, da Prefeitura de Fortaleza, que está ciente que irá chover no começo do ano, mas não toma as medidas cabíveis, deixando a cidade ser destruída pela chuva durante a quadra chuvosa. Mas, neste caso, não estamos falando de países pobres, mas dos representantes maiores do imperialismo europeu. Isso apenas mostra que, mesmo com recursos, não é prioridade desses governos, que servem aos banqueiros, investir no bem-estar e na segurança da população.
Nesse cenário, após o ocorrido, não se encontra na imprensa capitalista declarações dos governantes sobre medidas para evitar que as enchentes ocorram com a mesma intensidade ano que vem, uma vez que, ano após ano, ocorrem ou ameaçam ocorrer. Os governantes simplesmente falam em “mudanças climáticas” e tudo fica por isso mesmo. Chega a ser estarrecedor que uma das “soluções” propostas por Carole Hartmann, deputada do Partido Democrata de Luxemburgo, seja, por exemplo, usar as sirenes da cidade para avisar em caso de uma nova inundação. Ela ainda reiterou: “Da próxima vez, você deve prestar atenção a isso […] Temos que nos posicionar melhor no futuro porque tais fenômenos também ocorrerão no futuro” (Luxemburger Wort, 21/07/2021).
Além disso, sabemos que o imperialismo sempre usa seu monopólio propagandístico para atacar seus desafetos. Durante as inundações que ocorreram na Rússia em 2019, mais especificamente no território de Krasnoyarsk, localizado na Sibéria, o jornal alemão Deutsche Welle apressou-se em divulgar uma caricatura criticando a postura do governador da região enquanto falava com os locais. Maria Zakharova, representante oficial do Ministério de Relações Exteriores da Federação Russa, em suas redes sociais fez uma declaração nessa direção, lembrando o episódio ocorrido em 2019: “Aconselho a DW a dar uma olhada mais de perto na caricatura novamente, ela pode ser útil para demonstrar a comunicação de políticos alemães com cidadãos alemães após as enchentes na Alemanha”, declarou Zakharova. É como a famosa parábola do “argueiro (cisco) e da trave”, onde o hipócrita queria tirar o cisco do olho de uma outra pessoa, mas em seu olho tinha enterrada uma trave.