No dia 18 de outubro último, quando completaram-se dois anos do início da insurreição popular chilena de 2019, o povo chileno mais uma vez se levantou.
Apenas nesse dia, o saldo foi de dois mortos e 450 pessoas detidas, marcando o que parece ser a segunda fase do levante popular iniciado em 2019 contra a ditadura direitista de Sebastián Piñera. Em 2019, o estopim da rebelião foi o aumento do preço das passagens de metrô. Porém, como tantas vezes antes na história, em poucos meses o levante havia ultrapassado em muito esses limites e colocou em xeque não apenas o governo de Sebastián Piñera, mas todo o regime político herdeiro da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), talvez a ditadura mais sangrenta e assassina da América Latina.
A ditadura Pinochet foi responsável pela primeira experiência neoliberal da história em um país inteiro. Assim como os figurões dessa ditadura não sofreram punição alguma, inclusive o próprio Pinochet, que virou senador vitalício, nada mais natural que a devastação neoliberal não tenha sido revertida até hoje.
Muito pelo contrário. Foi o avanço dos ataques neoliberais contra as massas que conseguiram transformar uma queixa contra o preço do metrô em uma insurreição que colocou todo o regime político chileno contra a parede. Foi nesse momento que a esquerda poderia ter dirigido o movimento e derrubado o governo Piñera, o que levaria provavelmente à formação de um governo operário. Mas essa esquerda preferiu canalizar toda a revolta para a via institucional, o que desembocou em uma Assembleia Constituinte, que começou seus trabalhos neste ano. O grande problema aqui é que a esquerda não precisava da direita e fez acordo com ela, contendo as massas, o que manteve intacta toda a estrutura do regime político chileno e a propriedade privada capitalista.
Por outro lado, a crise econômica e social se tornou mais profunda e a política de contenção da insatisfação popular dentro dos limites institucionais se esgotou, explicando o novo levante de 2021. O outro lado da moeda dessa agravamento da crise é o crescimento da extrema-direita de José Antonio Kast, mostrando que a época das meias-medidas já acabaram faz muito tempo. A burguesia percebeu isso, mas a esquerda chilena, assim como a do Brasil, parece não ver isso ainda. As massas chilenas deram uma segunda chance para a esquerda. Se ela não organizar as massas e assumir sua responsabilidade, será varrida por uma nova direção dos trabalhadores ou pela extrema-direita.