A crise da terceira via, expressa no “vai, não vai” de João Doria como candidato à presidência da República, parece ter alcançado seu mais alto grau durante todo o período em que vem sendo gestada.
Referir-se à crise da terceira via é na verdade referir-se à crise do regime político saído do golpe de 2016.
Sabidamente, o PSDB foi o carro-chefe do golpe de Estado que derrubou a presidenta Dilma Rousseff e o seu objetivo era se alçar como liderança política do País. Vale recordar que foi por meio da candidatura de Aécio Neves em 2014, a primeira cartada do golpe, de uma forma mais velada.
O fracasso da candidatura do partido em 2018, com o seu candidato, Geraldo Alckmin, obtendo menos de 5% dos votos, já demonstrava o impasse gerado pelo golpe de 2016, com a acentuação da polarização política. Naquele momento, o regime saído do golpe solucionou o problema com um novo golpe ao cassar a candidatura do ex-presidente Lula e abrir caminho para a vitória do fascista Jair Bolsonaro até então uma personagem secundária, mas que se transformou no único nome capaz de derrotar o PT, mesmo sem Lula. Naquele momento, o símbolo maior da unidade golpista era o próprio slogan do então candidato ao governo de São Paulo, João Doria, com o BolsoDoria.
Doria 2022
Ao longo dos últimos quatro anos, o setor fundamental do regime político buscou alçar Doria como o candidato “natural” às eleições de outubro próximo. É bom lembrar que com exceção de 2014, onde o PSDB lançou Aécio Neves, todos os candidatos do Partido desde Fernando Henrique Cardoso em 1994, eram paulistas e todos menos FHC, haviam sido governadores de São Paulo.
Essa condição não é por acaso. Desde FHC que o PSDB é o eixo de estruturação da burguesia. Com a ascensão do PT, o partido perdeu em alguma medida o controle do orçamento nacional, mas sempre contrabalançado pelo controle do Estado de São Paulo, segundo maior orçamento do País, atrás apenas do orçamento da União. Doria, era por assim dizer, o eixo pelo qual o partido pretendia retomar a primazia, um dos eixos, das razões, do golpe de 2016.
Nesse sentido, Doria teve apoio nos últimos quatro anos da direita à esquerda, condição privilegiada para se alçar como o candidato antibolsonaro, em um primeiro momento e, depois, com a recuperação dos direitos políticos do ex-presidente Lula, o candidato da terceira via, contra os extremos.
A esquerda “passa pano”
É importante salientar que até o momento, mesmo com o esforço da imprensa burguesa, dos partidos da direita e mesmo da esquerda, a terceira via não conseguiu decolar e nesse time não se encontra apenas João Doria. Aliás, a terceira via só não foi enterrada há muito tempo por obra e ação da esquerda, primeiro ao “passar pano” para os supostos governadores “científicos”, como “combatentes da pandemia”, depois ao procurar infiltrar seguidamente a direita nos atos pelo fora Bolsonaro, inclusive o próprio João Doria, como se fossem oposição a Bolsonaro.
Não fosse a ferrenha oposição do Partido da Causa Operária, é possível que a direita não bolsonarista tivesse se transformado em “aliada” contra a pandemia e também dos atos da campanha Fora Bolsonaro.
Tanto em um caso como no outro, o PCO interveio em todo o processo tanto em sua imprensa como na atividade prática. Foi com decisão que o Partido se opôs à campanha do “fica em casa” da direita, mas apoiada por quase toda esquerda, ao ponto do ato de o 1º de Maio de 2021 na Praça da Sé, em São Paulo, ter se transformado na ponta de lança do movimento fora Bolsonaro. O mesmo se deu com relação à tentativa de impor notórios golpistas, como o próprio João Doria, nos atos, com a militância do PCO se aliando aos militantes petistas e independentes para expulsar a direita (a terceira via) dos atos.
E agora, terceira via?
É evidente que fracassou a tentativa do regime político de transformar o “BolsoDoria” no “São João Doria da Vacina” e ainda em um ativista em defesa da democracia, independentemente de que Doria tenha voltado atrás na sua decisão de desistir da candidatura. Em todo caso, a crise da terceira via não significa o fim do “projeto” da terceira via. É notório que há movimentação nos bastidores, com a própria crise da candidatura Doria, mas, também, com a desistência do candidato do Podemos, Sérgio Moro, que acaba de deixar o partido e se filiar ao União Brasil.
A guerra defensiva da Rússia na Ucrânia contra a tentativa da OTAN em transformar aquele país em uma ponte para atacar a Rússia, deve servir como lição para os setores conscientes da esquerda e que não estão maculados pelo “vírus” da frente ampla.
Se o imperialismo foi capaz de produzir uma guerra na tentativa de impor sua política diante da Rússia, o que dizer do que é capaz de fazer com o Brasil, um País tão ou mais importante economicamente que a Rússia, mas que tem o agravante de estar no quintal dos Estados Unidos da América?