Por quê estou vendo anúncios no DCO?

Frente ampla

O papel de Boulos é colocar a esquerda a reboque da direita

Matéria do jornal golpista Valor Econômico apresenta Boulos como "radical" e Lula como defensor da frente ampla

Em sua mais recente edição, o jornal Valor Econômico, pertencente às Organizações Globo, trouxe uma entrevista exclusiva com Guilherme Boulos, ex-candidato do PSOL à Prefeitura de São Paulo no último ano. Por um lado, a matéria, assinada por Cristiane Agostine, mostra claramente o interesse da burguesia em apresentar Boulos como o candidato “certo” para a esquerda. Por outro, o próprio Boulos, inspirado pelo espaço que a burguesia lhe confere, faz uma franca defesa da política reacionária da frente ampla com a direita golpista.

O texto do Valor Econômico já chama a atenção logo no seu início, quando, de forma muito maliciosa, mente e distorce informações a respeito do ex-presidente Lula e do próprio Boulos:

“A construção da frente ampla defendida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que extrapole os muros da esquerda e se aproxime de setores do centro e da centro-direita, já encontra resistência entre aliados do petista. (…) Guilherme Boulos diz que é importante ampliar o diálogo, mas descarta a possibilidade de um acordo com setores conservadores para a disputa com o presidente Jair Bolsonaro em 2022”.

A primeira distorção que debateremos é a de que Lula defenderia a frente ampla “que extrapole os muros da esquerda”. Se, por frente ampla, considerarmos uma política geral de aliança com setores da burguesia, sim, Lula defendeu e continua defendendo, em alguma medida, esse tipo de concepção. Seu governo foi um governo de colaboração de classes, com representantes do imperialismo em postos importantes, como no caso de Henrique Meirelles, presidente do Banco Central durante a era lulista.

Nisto não há novidade alguma. No entanto, a frase ao qual o Valor Econômico se refere foi dita por Lula em seu discurso no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, dias após a anulação de seus processos na Lava Jato. No mesmo discurso, Lula defendeu a polarização e disse que a esquerda deveria participar das eleições para polarizar com a direita. Disse ainda que não se importava que o “mercado” fosse contra sua candidatura, pois estava interessado em governar para os trabalhadores. A posição de Lula é confusa e contraditória, mas absolutamente natural para o nacionalismo burguês. Lula não é um revolucionário, mas um líder de massas, bastante empírico, que não age com base em um programa consciente, mas sim na força do movimento que lhe sustenta. E, portanto, pode evoluir à direita ou à esquerda a depender da situação política.

O que o ex-presidente defende, quando fala em uma frente com a direita, é um governo de tipo frente popular, como foi o seu extremamente moderado governo entre 2003 e 2010. No entanto, a “frente ampla” debatida amplamente hoje em dia, tanto na imprensa burguesa, quanto pelos parlamentares da esquerda nacional, tem outro significado. Seria uma frente entre partidos de esquerda e partidos de direita organizados sobre a base de um programa abstrato — “mais democracia”, “respeito à vida”, “contra o negacionismo” etc. — e que tem servido para que a esquerda se anule politicamente e aponte a direita nacional como grande salvadora da pátria. Essa segunda concepção de frente ampla não é defendida por Lula, mas sim por ninguém menos que Guilherme Boulos. O psolista, aliás, tornou-se um dos maiores representantes dessa política, desde que começou a falar que seria preciso repetir a experiência fracassada da campanha das “Diretas já”. Para comprovar que Boulos é um defensor da política de frente ampla, basta ler o que consta na própria matéria do Valor Econômico:

“Candidato do Psol à Presidência em 2018 e à Prefeitura de São Paulo em 2020, Boulos diz que é preciso buscar a interlocução com o centro e a centro-direita para fortalecer a oposição a Bolsonaro”.

Não é a primeira vez que Boulos apresenta essa posição. O psolista esteve, durante todo o período da pandemia, ao lado da direita golpista em sua política demagógica de “oposição” ao bolsonarismo. O psolista assinou manifestos com bandidos políticos como Fernando Henrique Cardoso e Armínio Fraga, fez um acordo com João Doria e a polícia de São Paulo para impedir os atos pelo Fora Bolsonaro, apoia a volta às aulas, elogiou o PSDB por ter matado “somente” 60 mil pessoas no principal estado do País e não criticou, em momento algum, a reabertura da economia promovida pelos governadores. Uma das desculpas que Boulos costuma dar para esse tipo de política é a sua “teoria das cebolas”. Segundo ele, seria possível formar uma aliança mais ampla com determinados setores em defesa da “democracia”, uma aliança mais restrita em defesa de uma determinada política social e uma aliança mais restrita ainda em torno de um programa.

Isso, contudo, nunca passou de conversa mole. Só é possível formar uma aliança em torno de objetivos políticos muito bem definidos e com setores que tenham objetivos em comum. No caso, a direita nacional, apoiada por Boulos durante a pandemia, não tem interesse algum em comum com a esquerda. São contra os direitos democráticos do povo, estão alinhados com o governo federal em tudo aquilo que é essencial e são responsáveis por toda a crise econômica e social do País. Neste caso, não há uma oposição entre a política neoliberal e os direitos democráticos: quem defende o neoliberalismo é obrigado, devido ao caráter agressivo e impopular dessa política, a apoiar medidas repressivas.

A frente ampla, seja por uma disputa eleitoral, seja pela composição de um governo, seja na política parlamentar, tem, no final das contas, um único objetivo: colocar a esquerda a reboque da iniciativa política da burguesia. E, na medida em que a esquerda se anula e joga no colo dos partidos burgueses a iniciativa frente aos problemas do País, causa uma dispersão total entre os trabalhadores, que se sentem traídos por aqueles que deveriam lutar por seus interesses.

A “teoria das cebolas” de Boulos não só é uma fraude da teoria política, como também foi desmoralizada pelo próprio psolista. No fim das contas, a aliança de Boulos com a direita não se dá “por camadas”, mas sim em todos os aspectos: Boulos, pela própria frase acima, se mostra disposto a apoiar a “oposição” parlamentar comandada pela direita, tem, como programa, a defesa do regime político e a inação total do Estado durante a pandemia e, por fim, apoia a direita até mesmo eleitoralmente.

Boulos apoiou a direita em várias oportunidades nas eleições de 2020 — talvez o caso mais destacado seja o apoio ao candidato de Ciro Gomes em Fortaleza. Nas eleições para a Presidência da Câmara dos Deputados, disse que iria apoiar Baleia Rossi (MDB) “no segundo turno”. E, agora, com a mesma malandragem de apoiar a esquerda no primeiro turno e apoiar a direita no segundo turno, declarou, na entrevista ao Valor Econômico, que apoiará qualquer candidato que concorra com Bolsonaro:

“A centro-direita terá seu candidato ou seus candidatos. Mas, no segundo turno, sou favorável à unidade democrática contra Bolsonaro caso ele esteja lá”.

Traduzindo para o bom português: não importa quem esteja no segundo turno, Boulos irá apoiar. Se o candidato fosse de esquerda, seria de senso comum que Boulos apoiaria — tal declaração, portanto, seria desnecessária. Trata-se de uma declaração de intenções em relação à direita. Boulos e o PSOL apoiariam um candidato da direita como fizeram no segundo turno no Rio de Janeiro quando apoiaram Eduardo Paes do DEM?

Isso é bastante sintomático, pois demonstra que a política central de Boulos é o apoio indiscriminado à direita golpista, e não a de utilizar as eleições para que a esquerda avance na luta contra o golpe. E é neste ponto que fica clara a diferença entre a política de Lula e de Guilherme Boulos. Para Lula, a ideia de uma frente com a burguesia — que é errada e, de um ponto de vista geral, atrasa o desenvolvimento da luta política da classe operária — seria a de colocar um determinado setor a reboque de sua política. Isto é, que o PT governasse, tivesse direito a uma fatia importante do regime político e, ao mesmo tempo, cedesse à burguesia aquilo que fosse fundamental. Por exemplo: o PT teria direito a fazer uma série de políticas assistenciais, como o Bolsa Família, nomearia milhares de afiliados para cargos na máquina pública e, ao mesmo tempo, seguiria as determinações do FMI, não mexeria nas Forças Armadas etc.

Para Boulos, contudo, trata-se do exato oposto. A frente ampla serviria para colocar a esquerda a reboque total da direita golpista. A frente ampla, conforme formulada nos últimos anos pelos intelectuais do PCdoB, do PSOL e da ala direita do PT, seria a política de escolher o “mal menor” entre a direita nacional e o bolsonarismo. Se, na política lulista, a esquerda tem muito pouco a ganhar, com a política da frente ampla, ela se anula completamente. A frente ampla de Boulos é a substituição de uma esquerda com um programa para a situação política por uma esquerda “torcedora de arquibancada” do PSDB, do MDB, do DEM e de todos os inimigos do povo.

E é justamente neste ponto em que fica claro que Boulos não é um “aliado” de Lula, como distorce o Valor Econômico, mas sim uma figura que se encontra em um campo oposto. O psolista, que só tem uma projeção por causa da imprensa burguesa, construiu seu nome a partir de uma política de boa convivência com o aparato estatal tucano em São Paulo e que está ancorado em uma base de classe média conservadora, vê, na direita nacional, a única possibilidade de levar adiante as suas aspirações políticas.

Essa direita, contudo, não quer saber de Lula. Pelo contrário: armou o golpe contra Dilma Rousseff e conspirou para jogar o ex-presidente na cadeia. A burguesia não tolera Lula porque, independentemente do que ele pense ou do que tenha feito no governo, é apoiado por um movimento gigantesco, que vem desde a derrubada da ditadura militar e que está cada vez mais enfurecido com o golpe de Estado. Quanto mais Lula cresce, mais força ganha esse movimento e mais frágil fica o regime de conjunto. Sua posição está em completa contradição com uma aliança com os partidos golpistas. Afinal, se tal “aliança” fosse formada, a força do movimento que apoia Lula certamente acabaria se impondo e inviabilizando a tal frente ampla de seguir a política da direita. Lula pode até pensar em algum tipo de aliança com algum setor minoritário da burguesia, mas o fato é que a frente ampla, seja como Boulos ou Lula defendam, é impossível de ser formada com o ex-presidente. Isso porque não estamos mais em 2003. A direita não tem condições nem mesmo de fazer as mínimas concessões que fez no passado, como os programas assistenciais do governo Lula. A crise econômica é devastadora e somente um governo fortemente neoliberal será tolerado pela burguesia. Por outro lado, como a política dos golpistas é cada vez mais agressiva, a base lulista está cada vez mais radical. É por isso que a frente é inviável.

O Valor Econômico mente porque está defendendo seu interesse e seu próprio projeto: o pseudorradical Boulos frente-amplista contra Lula e o PT. É necessário denunciar essa farsa e ter como política a defesa intransigente dos direitos de Lula e Lula presidente.

Gostou do artigo? Faça uma doação!

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Quero saber mais antes de contribuir

 

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.