Lula é o político mais popular do Brasil. Quanto a isso, não há dúvida. Depois de tantos ataques, calúnias, mentiras, e até uma prisão, Lula não apenas manteve sua popularidade como em certo medida ampliou-a.
Tanto é assim que, mesmo os inimigos de Lula, querem estar em volta dele. Com exceção de Bolsonaro, que conquista sua base se apresentando como o anti-Lula, os políticos da burguesia evitam bater de frente com o ex-presidente. Na esquerda, essa é a regra.
Não há elemento da esquerda oportunista que não queira se esfregar em Lula na esperança de conseguir mais votos. Mais ainda do que os políticos burgueses, um esquerdista com pretensões eleitorais obrigatoriamente tem que parecer amigo de Lula.
Assim como os políticos burgueses direitistas, aparecer do lado de Lula não significa apoia-lo de verdade. A facada nas costas é uma constante na política.
Ciro Gomes, um típico político burguês de direita, tentou por muito tempo se equilibrar entre aliado e crítico de Lula. Ao mesmo tempo que atacava o PT e o ex-presidente, procurava aparecer como seu aliado. Essa farsa parece ter chegado definitivamente ao fim agora, com a troca de acusações entre Dilma e Lula e Ciro.
Mas Ciro não é o único. Vejamos o caso curioso de Guilherme Boulos. O agora popstar do PSOL ganhou destaque na política por suas posições no mínimo ambíguas sobre o golpe. Ao mesmo tempo em que procurava aparecer um crítico da direita, usava sua coluna na golpista Folha de S. Paulo para atacar o governo Dilma que, em suas palavras, era um governo “indefensável”.
Essa posição não impedia Boulos de aparecer no palanque junto com Dilma e Lula. Para a plateia de esquerdistas, numa manifestação, Boulos era o melhor amigo do PT, para os leitores conservadores de classe média da Folha, Boulos era o crítico sério e ponderado aos petistas.
Essa mesma posição, Guilherme Boulos manteve quando Lula começou a ser perseguido e finalmente acabou presos depois de uma campanha intensa de calúnias. Para a plateia esquerdista, num ato ou no sindicato no ABC Paulista, Boulos era o maior de todos os defensores de Lula; já para a base de classe média do PSOL ou os leitores dos jornais burgueses, lá estava Boulos para dizer que “Lula deveria ter um julgamento justo”. Vejam bem, não que. Lava Jato era uma operação golpista e Lula era vítima de perseguição “julgamento justo”.
Quando Lula esteve preso, Boulos não se preocupou em se movimentar pela liberdade de Lula, se limitava a dizer, corroborando seu agora ex-correligionário Marcelo Freixo, que “Lula livre não unifica”. Boulos e o PSOL não renunciaram da sua candidatura ou colocaram esta candidatura a serviço da luta contra o golpe e pela liberdade de Lula. Corroboraram a eleição fraudulenta, mas para jogar para a plateia de esquerda, o amigão do Lula, fala “boa noite Lula” nos debates.
São muitos outros exemplos que poderíamos colocar aqui. Mas em suma, Boulos só defende Lula quando serve para usar a popularidade do ex-presidente para conseguir votos. Por isso, o PSOL e Boulos se recusam a lançar desde já uma mobilização pela candidatura de Lula. Antes de fazer isso – se é que vão fazer – eles querem garantias eleitorais, querem impor condições, querem usar a popularidade de Lula para barganhar posições eleitorais. Ou seja, a defesa de Lula continua sendo, como sempre foi, uma defesa condicionada da parte de Boulos e do PSOL.
Um “radical” da frente ampla
Essa política ambígua de Boulos não é coincidência, não é algo pontual. Boulos se coloca como um dos principais defensores da frente ampla no campo da esquerda. Poderíamos dizer que Boulos é o setor mais esquerdista da frente ampla: mistura a política capituladora e de conciliação com a direita com um discurso pseudo radical. Enquanto defende a aliança com a direita golpista e senta na mesa com tucanos e empresários, faz ocupação simbólica da Bolsa de Valores.
Nesse sentido, se Ciro é um político de direita que a burguesia infiltrou na esquerda para defender a frente ampla, Boulos é o esquerdista pequeno-burguês típico: para a plateia de esquerda, discurso radical, para a burguesia, discurso conciliador, responsável e moderado.
Mas essa política ambígua serve, em última instância, a direita golpista. A frente ampla é uma política que pretende colocar a esquerda e o movimento a reboque da direita. Boulos está a serviço disso.
Por isso, Boulos defendeu com unhas e dentes a presença da direita nos atos que aconteceram contra Bolsonaro. Defendeu principalmente seu amigo Ciro Gomes, inclusive prestando solidariedade quando este foi vaiado e escorraçado no ato do dia 2 de outubro na Paulista.
Boulos quer a direita golpista nas manifestações, prestou solidariedade a Ciro Gomes, defende a frente ampla, mas Boulos não quer Lula nos atos, nem em pessoa, nem lembrado pelos maniestantes. É bom lembrar que os gritos em favor de Lula eram abafados pelo caminhão de som e que a própria imprensa golpista, ao criticar as vaias contra Ciro, deixou escapar que houve um acordo para que os oradores não falassem de Lula.
A frente ampla é contra Lula, Boulos e Ciro são contra Lula. A diferença é que Ciro escancarou sua hostilidade ao es-presidente e ao PT, já Boulos tenta se manter, com cada vez mais dificuldades, em sua posição ambígua.
A fissura escancarada depois da briga pública nas redes sociais entre Ciro e Lula e Dilma coloca Boulos numa situação complicada. O mesmo Boulos que correu para prestar sua solidariedade a Ciro está bastante sem pressa para defender Lula e Dilma das acusações feitas pelo pedetista. Aliás, Boulos nunca foi solidário a Lula quando Ciro o atacou nas inúmeras vezes anteriores.
A dificuldade de Boulos se posicionar mostra bem o conteúdo de sua política. Ele não é um aliado de Lula, ele é um aliado da frente ampla e, portanto, corre para defender Ciro. Mais absurdo ainda é se considerarmos que uma vaia numa manifestação é muito menos grave do que as frequentes acusações de corrupção feitas por Ciro contra Lula, se colocando como um aliado da direita golpista que prendeu o ex-presidente.