Um tímido programa de assistência social, que contemple apenas 19% dos 84 milhões de brasileiros que estão passando fome e que comprometa apenas R$30 bilhões acima do Teto de Gastos. Nem mesmo isso os capitalistas estão dispostos a tolerar.
Foi o que ficou claro nos últimos dias em meio à crise causada pelo Auxílio Brasil, programa concebido pelo fascista Jair Bolsonaro com vistas à sua reeleição. Caso implementado, o programa praticamente dobrará o valor do Bolsa Família, que passará a R$400. A esmagadora maioria das pessoas que hoje recebem o auxílio emergencial e que não estão cadastradas no Bolsa Família, no entanto, ficarão desamparadas.
A medida que Bolsonaro está tentando implementar é uma esmola que não corresponde, nem de longe, às necessidades do povo. Com a inflação descontrolada e a pandemia ainda afetando pesadamente a economia, seria necessário que todos os desempregados tivessem acesso a um auxílio de, no mínimo, o valor de um salário mínimo. No entanto, o objetivo de Bolsonaro não é melhorar as condições de vida da população, mas sim ampliar a sua base de apoio e se preparar para um duro enfrentamento nas eleições de 2022.
O imperialismo, por sua vez, não quer ver Bolsonaro usando a máquina do Estado para se fortalecer — afinal, ele procura forjar outro candidato, a famigerada “terceira via”. E, mais do que isso, não quer que o orçamento do Estado seja gasto, por mínimo que seja, com o povo; todo o dinheiro que estiver fora do Teto de Gastos deve ir, obrigatoriamente, para os bancos.
É por isso que há uma crise. Embora Bolsonaro seja um direitista, seus interesses entram em contradição com a corja de parasitas que querem liquidar com o País. O imperialismo, neste momento, não está disposto a permitir nem mesmo a esmola de R$400 para uma parcela da população: o que os capitalistas querem é pilhar a população para salvar seus negócios durante a crise.
Se nem a tímida iniciativa de Bolsonaro, que não comprometeria seriamente o orçamento, a burguesia está disposta a aceitar, fica óbvio que qualquer iniciativa do governo Lula seria inviabilizada.
Lula não é um demagogo, é a expressão de um movimento real, que tem anseios muito mais profundos que o auxílio farsesco de Bolsonaro. Um governo Lula, ainda mais neste momento de acirramento da luta de classes, seria um governo que estaria em choque incessante com os interesses do imperialismo. Sendo eleito, seria ou semelhante a um governo Maduro (Venezuela), em guerra econômica a todo instante contra os sanguessugas que querem controlar o País, ou teria de voltar as costas para as suas bases e fazer como Pedro Castillo, de modo a estabelecer um governo furiosamente neoliberal.
A diferença, contudo, é que Lula não é Castillo, e o movimento operário brasileiro é infinitamente mais organizado que o de qualquer país da América Latina. A CUT, o PT, o MST e os milhões que estão nas ruas pedindo a cabeça do presidente ilegítimo têm plenas condições de se impor e pressionar o governo para os seus interesses.
A burguesia, portanto, não pode arriscar um apoio a Lula. Isso seria um grande tiro no pé. A burguesia busca eleger um candidato da direita tradicional, da chamada terceira via, ou, se o cenário se polarizar entre Lula e Bolsonaro, ela não hesitará e apoiará Bolsonaro, como em 2018.