O Judiciário, no Estado burguês, é o único poder em que seus participantes não são eleitos. Por isso, o povo é constantemente alvejado pelos juízes, que interpretam a lei a seu favor ou a favor de seus protegidos e da burguesia para cumprir seus interesses, tudo com suposto aval da Constituição.
A população sabe disso e procura se defender da maneira que for possível. Em Honduras, por exemplo, a radicalização foi tanta que o povo se rebelou contra esse sistema e pressionou o governo e os parlamentares a aprovarem o projeto de lei que institui que os juízes sejam eleitos. Cerca de 30 organizações da Articulación Ciudadana por la Transparencia y la Justicia (ACTJ), junto com a Plataforma Amplia Nacional Liberadora (Panal), propuseram que os juízes da Corte Suprema de Justiça fossem eleitos e que esses processos fossem transparentes, projeto que foi aprovado com 73 votos a favor.
É importante que estabeleçamos o papel do judiciário em Honduras nos últimos anos. O golpe em 2009, o primeiro da onda de golpes na América Latina, foi dado pelo imperialismo, pela polícia e pelos militares. O Judiciário também teve sua parcela de culpa, e foi controlado pela ditadura no país desde então, colaborando para sua imagem de tiranos e corruptos.
Com a mudança de governo e a subida ao poder de Xiomara Castro, uma disposição maior para a mobilização e a radicalização se instaurou na população. Após anos de ditadura, uma brecha se abriu e foi utilizada para atender as reivindicações dos hondurenhos — os movimentos sociais encabeçaram uma ação, a qual teve apoio inclusive de partidos de direita que estão coligados com o governo de Xiomara, pressionando para que a proposta passasse no Congresso, o que efetivamente ocorreu.
É possível perceber que, diferentemente da esquerda pequeno-burguesa brasileira, os movimentos sociais de Honduras de fato aprenderam a lição e começaram a tomar atitudes quanto ao futuro da população de seu país. É importante afirmar que, enquanto essa medida não passa nem perto da posição revolucionária sobre o assunto, ela acaba sendo um progresso para os setores do nacionalismo burguês, como a própria Xiomara.
Nesse sentido, é importante fazermos uma comparação com o Brasil. Xiomara e seu partido podem, em certa medida, serem comparados ao Partido dos Trabalhadores. As condições em Honduras foram dadas, e a esquerda e o povo se mobilizaram. Se Xiomara consegue passar uma medida que, apesar de insuficiente, já proporciona um avanço para a sociedade, é plausível pensar que ações desse tipo não devem ser impossíveis para o PT e para Lula.
Na medida em que a população se radicaliza e se levanta, a pressão sobre o governo aumenta, fazendo com que a situação dê uma guinada à esquerda e vire para o lado do povo. A esquerda brasileira, assim como a hondurenha, precisa tomar essas oportunidades para colocar o seu programa em prática — e, mesmo se tratando de uma medida do nacionalismo burguês, não podemos adotar o sectarismo e ignorar o fato de que existe algum progressismo na ação.