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Ascânio Rubi

Ascânio Rubi é um trabalhador autodidata, que gosta de ler e de pensar. Os amigos me dizem que sou fisicamente parecido com certo “velho barbudo” de quem tomo emprestada a foto ao lado.

Velha imprensa

Um cenário desolador

Aplicativo pode ser muito moderno para quem pede comida em casa, mas é do século XVIII no que diz respeito à relação de trabalho.

Há não muito tempo, era comum ouvir da esquerda pequeno-burguesa, leitora dos jornalões da burguesia paulista, que a Folha era menos reacionária que o Estadão. Deste se podia esperar tudo, como atestou o inesquecível editorial da “escolha difícil” entre Bolsonaro e Haddad no pleito-farsa de 2018, mas da Folha não. Se essa distinção, mesmo cosmética, existiu mesmo, esse momento ficou no passado.  

A cobertura da eleição deste ano promete aposentar a maquiagem e mostrar a verdadeira face do Dorian Gray, o célebre personagem criado por Oscar Wilde que fez pacto com o Diabo para manter a aparência jovem enquanto seu retrato, escondido em um porão, envelhecia e incorporava as marcas das maldades que ele perpetrava com o rosto ingênuo de um rapaz novo.  

A Folha chega aos cem anos velha e reacionária, por mais que mantenha lá uma meia dúzia de “colunistas de esquerda fake”, simpáticos ao identitarismo. Essa turma é paga para dar uma demão de verniz na cara de pau da linha editorial do jornal e, de quebra, afagar o comodismo de uma classe média que só sabe o que é privação quando vê no Jornal Nacional, da Rede Globo.

Certos jornalistas, pertencentes à casta dos “analistas políticos”, naturalmente não precisam de sindicatos para intermediar a sua relação com os donos do jornal. Seus salários são compatíveis com as opiniões que expressam. Afinal, diria o Satanás, personificado no famoso conto “A Igreja do Diabo”, de Machado de Assis: “Se tu podes vender a tua casa, o teu boi, o teu sapato, o teu chapéu, coisas que são tuas por uma razão jurídica e legal, mas que, em todo caso, estão fora de ti, como é que não podes vender a tua opinião, o teu voto, a tua palavra, a tua fé, coisas que são mais do que tuas, porque são a tua própria consciência, isto é, tu mesmo?”. Pelo menos na Igreja do Diabo, vender a opinião é um “direito legítimo”, que, no entanto, o próprio Ferrabrás recomenda dissimular, “à vista do preconceito social”.  

O que pretendem esses jornais da burguesia, em franca competição pela primeira posição no ranking do reacionarismo golpista, é vender a ideia da “terceira via”, que não passa de um bolsonarismo almofadinha, se não for coisa pior. Segundo eles, essa opção política, que não se concretiza em nome algum, representaria a “modernidade” e a “diversidade”.

As relações de trabalho “modernas” prescindem de sindicatos, essa velharia, pois cada trabalhador pode negociar individualmente com o seu empregador. Voltamos, assim, ao século XVIII, mas, segundo “modernos” analistas de jornal, é a luta sindical que tem cheiro de naftalina. O que cheira bem é puxar o saco do dono do jornal.

Também é muito “moderno” trabalhar como entregador de comida por aplicativo, pois, veja só, o trabalhador trabalha “quando quer”, não tem horário fixo, não tem vínculo empregatício, portanto não tem patrão. Misteriosamente, a única coisa que esse trabalhador não decide é quanto vai ganhar, motivo pelo qual sua jornada de trabalho se estende por tantas horas quantas as que ele aguentar.

O entregador usa a própria motocicleta ou bicicleta, põe o combustível com seus recursos ou gasta as próprias energias pedalando, compra a caixa de transporte com o adesivo da empresa, usa seu próprio celular para receber os pedidos e recebe o que “o aplicativo” determina. Tudo sem patrão: o trabalhador de um lado e um sistema eletrônico de outro. O patrão agora não tem o dissabor de ver a cara dos funcionários. Moderno, né?

O sistema pode ser muito moderno para quem pede comida em casa, mas é do século XVIII no que diz respeito à relação de trabalho. O afrouxamento das leis trabalhistas, que permite absurdos como esse e outros, veio com o golpe de 2016, perpetrado pelos que se vendem como “terceira via”. Empresários comemoram a redução drástica dos processos trabalhistas, resultado de ter a dita reforma passado as custas processuais para o trabalhador que viesse a perder a causa, como se as suas forças se equiparassem ao poder da empresa.

É por essas e por outras que é urgente falar de trabalho. No dia 1º de Maio, dia internacional da luta dos trabalhadores, Lula falou sobre esse tema, que a imprensa considera envelhecido. Moderno é empreendedorismo na favela, ou seja, fique aí na favela e produza para os seus vizinhos. Favela é “pop”; temos de combater o “preconceito contra os pobres”, que já tem até nome moderno: “aporofobia”.

Em suma, todos os nossos problemas se resumem a “preconceitos”. É aí que entra a segunda palavra mágica: “diversidade”. Está tudo ótimo do jeito que está, cada um é um; basta combater os preconceitos. Enquanto isso, os ricos ficam mais ricos e os pobres ficam mais pobres. A classe média vai sendo esmagada e os que têm alguma chance de se salvar da borrasca fazem o jogo da burguesia. Esse cenário é, de fato, desolador.

A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a posição deste Diário.   

 

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