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Eduardo Vasco

Militante do PCO e jornalista. Materiais publicados em dezenas de sites, jornais, rádios e TVs do Brasil e do exterior. Editor e colunista do Diário Causa Operária.

Luta operária

Stalinismo e nacionalismo burguês

O nacionalismo burguês nos países atrasados se mostrou muito mais progressista do que o stalinismo, que foi um fenômeno contrarrevolucionário

O stalinismo tem muitas semelhanças com o nacionalismo burguês. Entretanto, há que fazer uma diferenciação básica: enquanto o stalinismo foi um fenômeno exclusivo da burocracia soviética para manter a classe operária domesticada dentro de um regime operário (isto é, após uma revolução que expropriou a propriedade privada), o nacionalismo burguês na época do imperialismo é um fenômeno típico dos países atrasados no qual uma burocracia que se encontra no governo é apoiada pela classe operária mas também a mantém domesticada – a diferença é que, ao invés de controlar um Estado Operário, como o stalinismo, o nacionalismo burguês no governo não ultrapassa os limites do Estado capitalista; se o ultrapassa, deixa de ser nacionalismo burguês, como veremos).

Feita essa diferenciação essencial, vamos a algumas semelhanças.

A primeira delas é que se, por um lado, a natureza de ambos os obriga a estabelecer um férreo controle sobre a classe operária a fim de impedir o seu desenvolvimento revolucionário para que ela não efetue uma revolução política (no caso do Estado Operário controlado pelo stalinismo) ou uma revolução social (no caso do Estado burguês governado pelo nacionalismo), isso faz com que os dois regimes levem a cabo uma política de conciliação de classes com a burguesia e o imperialismo. O objetivo é manter-se no poder, impedindo que o capitalismo seja restabelecido (o que desmontaria as bases que possibilitam a manutenção da burocracia como casta social acima da classe operária na ditadura do proletariado) ou que a direita pró-imperialista tome seu lugar (no caso do nacionalismo burguês, porque os que estão no aparato estatal também precisam preservar seu status social, bem como atender aos interesses de um setor da burguesia que seria afetado caso o país em questão tenha sua economia totalmente controlada pelos monopólios imperialistas).

Ambos são fenômenos pequeno-burgueses e, portanto, de natureza centrista.

A tendência da burocracia soviética foi, desde o início, desenvolver-se rapidamente para uma política de tipo nacionalista. O primeiro e mais notório passo foi abandonar de uma vez por todas qualquer tipo de internacionalismo ao adotar a famigerada teoria do “socialismo em um só país”. O próprio conceito já escancara sua tendência nacionalista, em contraposição à tradição socialista do internacionalismo proletário e da revolução mundial.

O “socialismo em um só país” não foi somente uma teoria nacionalista, mas uma política absolutamente reacionária. Serviu de base teórica para a sabotagem sistemática de revoluções por todo o globo, desde a revolução chinesa na década de 1920, passando pela revolução espanhola de 1936 até chegar na revolução grega após a II Guerra Mundial. Isso para ficarmos apenas no período de governo de Josef Stálin.

Essa sabotagem de revoluções teve como base a conciliação com o imperialismo e a burguesia dos respectivos países que tiveram suas revoluções boicotadas. Na China, o stalinismo obrigou o Partido Comunista a ficar à reboque do Kuomintang; na Espanha, o Partido Comunista foi fundamental para a contenção da revolução ao compor um governo de frente popular com os republicanos; na Grécia a situação foi mais aberrante: o Partido Comunista quis fazer a revolução, travou uma guerra civil contra as forças reacionárias e não teve apoio algum da União Soviética, que respeitou o domínio britânico da zona que havia sido estabelecida após os acordos dos soviéticos com os britânicos e norte-americanos no final da II Guerra.

O nacionalismo reacionário da burocracia stalinista, já com uma política integralmente contrarrevolucionária, ficou evidente no início do conflito mundial. Para consolidar a conciliação com o imperialismo “democrático” na luta contra a Alemanha fascista, a URSS dissolveu a III Internacional em 1943, garantindo assim ao imperialismo que os partidos stalinistas pelo mundo não se articulariam mais contra a burguesia. Por outro lado, a fim de assegurar a aliança com os setores direitistas dentro da URSS e com o imperialismo a fim de estabelecer uma “união nacional” contra os nazistas, Stálin substituiu “A Internacional” como hino da União Soviética por uma canção patriótica, e não mais internacionalista, que exaltava sua própria figura. Além disso, pactuou com a reacionária Igreja Ortodoxa – a mesma que havia sido o principal pilar de sustentação de séculos de czarismo na Rússia e que era tão odiada pelos proletários e camponeses. Esse pacto ficou simbolizado pelo filme “Ivan, O Terrível”, de Serguei Eisenstein, encomendado por Stálin a fim de reconstruir uma história gloriosa do passado russo, na qual o czar é o grande responsável pela unidade nacional – um método de propaganda típico do nacionalismo burguês dos países atrasados, mas em se tratando de um império como era o russo, também poderia se assemelhar ao método utilizado por Hitler e Mussolini, que faziam a apologia a um passado ideal ou mesmo nostálgico.

Não é preciso dizer que essa política contrarrevolucionária enfraqueceu o movimento operário soviético e desorganizou o movimento operário internacional. No entanto, graças ao desenvolvimento natural das contradições do sistema imperialista, com o acirramento da crise e a Guerra Mundial, e depois com a nova crise de 1974, o movimento operário ganhou um novo fôlego e abriram-se novas etapas de luta revolucionária. Isso fez com que o stalinismo sumisse do mapa, com a queda da URSS.

Já o nacionalismo burguês viveu episódios mais interessantes, o que o torna mais vivo politicamente que o stalinismo, mesmo quando este ainda estava de pé.

Apesar de ser um governo de conciliação entre a classe operária e a burguesia, manobrando para atender aos interesses das duas classes sociais, mas logicamente beneficiando muito mais a burguesia, uma vez que não mexe nas estruturas econômicas do Estado capitalista, o nacionalismo – com a crise do imperialismo, que em sua fase de evidente declínio avança de maneira selvagem contra os países atrasados – sempre viveu um impasse desde meados do século XX até hoje. Por sofrer a pressão das duas classes sociais antagônicas, quando a luta entre essas classes se acirra ele é empurrado para um dos dois lados, para o lado da classe social que se apresenta com uma força maior. Ou capitula, cedendo às pressões da burguesia para dar lugar a um governo ditatorial pró-imperialista (como ocorreu com Jango no Brasil e Sukarno na Indonésia), ou ele evolui para enfrentar a burguesia (como ocorreu com o chavismo na Venezuela).

Exatamente por causa da opressão que sofrem tanto a classe operária e o campesinato como até mesmo a burguesia nacional nos países atrasados, o nacionalismo burguês nesses países tem um caráter progressista e – por que não dizer? – revolucionário. Exemplo disso foram as revoluções de libertação nacional em vários países da África e da Ásia, em que a classe operária liderou as demais classes (incluindo alguns determinados setores burgueses que tinham seus negócios prejudicados pela competição desleal do imperialismo) na luta de independência. O maior exemplo é Cuba, onde a revolução de 1959 começou como um movimento nacionalista e, dois anos após tomar o poder, se transformou em uma revolução socialista com a expropriação total da burguesia.

O Egito, após a revolução de 1952, que levou Gamal Abdel Nasser ao poder, teve um governo nacionalista que, devido à intensa agitação revolucionária das massas, expropriou quase toda a propriedade privada e chegava a se considerar socialista. Tanto é que a vertente que Nasser inaugurou, o nacionalismo árabe, também ficou conhecida como socialismo árabe.

Até hoje, muitos governos nacionalistas burgueses, como os de Chávez/Maduro na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador e Daniel Ortega na Nicarágua, auto-intitulam-se “socialistas” – mesmo que não tenham alcançado um nível de socialização da economia equiparado ao da ditadura do proletariado ou até do próprio Egito de Nasser.

O nacionalismo burguês, inclusive, tem um caráter mais progressista que o próprio stalinismo. Isso porque ele é mais passível de sofrer a pressão da classe operária do que o stalinismo, uma vez que este sufocou completamente a independência de classe do proletariado.

O stalinismo, na medida em que precisava manter o domínio de uma burocracia cujos interesses econômicos independem do capital, acomodou-se no poder e necessitava estabilizar a situação soviética e mundial para que não houvesse crise alguma que mobilizasse as massas na direção de uma revolução política. Já o nacionalismo burguês – fenômeno da fase imperialista apodrecida e reacionária – precisa, na medida em que é acossado pelo imperialismo, buscar novas bases de apoio: internamente, ele necessita garantir que a classe operária seja forte para sustentá-lo, enquanto que, externamente, para driblar os ataques econômicos e mesmo militares do imperialismo, precisa apoiar governos e/ou movimentos que lhe prestem socorro. Isso faz com que muitos governos nacionalistas financiem empreitadas de potencial revolucionário, como é o caso do governo do Irã que apoia o Hezbollah e o Hamas (que também são movimentos nacionalistas).

Como observado acima, na verdade o próprio nacionalismo burguês, por se confrontar cada vez mais com uma situação em que é impelido a escolher um dos lados na luta de classes entre o imperialismo e a classe operária, tem um potencial revolucionário. Ou seja, ele tende a romper com o imperialismo.

O stalinismo, por sua vez, como grande organizador de derrotas (para citar Trótski), tem uma tendência contrária. A tendência a se adaptar ao imperialismo. Primeiro, a burocracia soviética enterrou a revolução mundial; depois, o próprio Stálin alavancou a luta pela democracia burguesa, alinhando seus partidos satélites com os partidos burgueses e fazendo acordos com o imperialismo norte-americano, britânico, francês, italiano etc. Seu sucessor e pupilo, Nikita Khrushchev, aprofundou essa política ao adotar a doutrina da “coexistência pacífica” com os EUA e demais potências capitalistas. Por último, os tradicionais partidos comunistas do Ocidente, outrora partidos de massas, empregaram a tese do “eurocomunismo”, que pressupõe que a democracia é um valor universal e está acima da luta de classes.

O stalinismo sempre teve um papel contrarrevolucionário em relação ao nacionalismo burguês. Aliou-se com o reacionário Kuomintang quando este não era sequer uma sombra do que havia sido no passado. Boicotou as revoluções levadas adiante por movimentos nacionalistas nos países atrasados. E, ao mesmo tempo, quando apoiou os governos nacionalistas, foi fundamental para garantir a sua capitulação diante dos golpes imperialistas, como nos já citados golpes contra Jango no Brasil e Sukarno na Indonésia, não mobilizando a grande base popular que os partidos comunistas tinham nesses dois países.

Para confirmar de vez a tese de que o nacionalismo burguês é mais progressista que o stalinismo basta citar um exemplo famoso. Na Guerra Civil espanhola, a União Soviética já tinha uma poderosa força armada mas não a mobilizou para derrotar o fascismo. O único país, além da URSS (que pouco fez na guerra) que apoiou os republicanos foi o México, governado na época pelo nacionalista Lázaro Cárdenas, famoso por nacionalizar o petróleo mexicano. E famoso também por dar asilo político a Leon Trótski quando este era perseguido pelo… stalinismo!

Ou seja, o nacionalista Cárdenas protegeu o maior líder revolucionário de então. Por sua vez, o stalinismo tanto o perseguiu que finalmente o assassinou.

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