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José Álvaro Cardoso

Graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina, mestre em Economia Rural pela Universidade Federal da Paraíba e Doutor em Ciências Humanas pela UFSC. Trabalha no DIEESE.

Brasil

Principal êxito do golpe: quebrar a coluna vertebral da economia

É inegável que um dos objetivos do setor mais forte entre os golpistas (ligado ao imperialismo estadunidense) foi tirar o Brasil de uma possível rota do crescimento

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Segundo alguns levantamentos que trazem projeções do PIB (Produto Interno Bruto) deste ano, o país recuará em 2021 para o 13º lugar no ranking das maiores economias do mundo. Colocação abaixo de 2020, ano em que o país já tinha recuado três posições em relação ao ano anterior. Conforme as projeções, o Brasil fecha este ano com US$ 1,595 trilhão produzido entre bens e serviços, pouco acima do US$ 1,445 trilhão de 2020, mas abaixo do US$ 1,878 trilhão de 2019, antes da pandemia. Entre 2014/2020, período dominado pelas articulações ou ações golpistas, o PIB per capita recuou 2,1%, em média, ao ano, um atraso, possivelmente, inusitado na série histórica do PIB.

Há análises que avaliam os prejuízos do golpe de Estado no Brasil exclusivamente no campo da democracia formal e dos direitos sociais e trabalhistas. De fato, a destruição de direitos a partir de 2016 foi realizada em escala industrial. Direitos sociais, fruto de lutas seculares (como a previdência social), foram moídos num espaço de cinco anos pelos governos golpistas. Além disso, os escassos espaços democráticos que existiam, foram liquidados sem piedade. O Brasil de hoje tem no máximo um arremedo de democracia. E a síntese desse fato, inclusive, é o aumento do número de pessoas que passam fome. Não há democracia possível se um número expressivo de pessoas não tem acesso ao direito humano mais elementar, que é a alimentação.

É inegável, porém, que os golpistas foram extremamente exitosos também num dos seus objetivos centrais, que foi quebrar a coluna vertebral da economia brasileira, conforme apontado pelos dados acima, sobre a evolução do PIB nacional. O Brasil era a sétima economia mundial em 2010, com grandes possibilidades de continuar escalando o ranking das maiores economias, ainda que com dificuldades crescentes. Com a articulação para o golpe e as políticas adotadas após 2016, o Brasil despencou no ranking, encerrando o ano de 2021 na 13ª posição. Em 2011, quando o Brasil fechou o ano como a sexta maior economia do mundo, à frente do Reino Unido, se afirmava que se o país mantivesse o seu ritmo de crescimento, rapidamente iria ultrapassar a economia do Reino Unido, posicionada no quinto lugar naquela ocasião.

Quanto se discute política econômica, o importante é saber se, em qualquer país, ela garante o bem-estar da população. O grande parâmetro para saber se a política econômica de um determinado país é adequada é saber se resolve os problemas econômicos principais do povo. Para se medir a eficácia de uma economia tem que saber como os trabalhadores (95% ou mais da população) estão vivendo. Não é a situação das bolsas de valores, das grandes empresas, dos investimentos financeiros, do Risco País, etc., mas sim a garantia de uma vida razoável para a população do país o grande parâmetro de eficiência da política econômica. Os EUA são o exemplo da antieconomia política, pois donos do maior PIB do mundo, e mesmo explorando o mundo todo, enfrentam miséria e desigualdade crescente.

Com a habitual, e impressionante, superficialidade, uma parte da mídia comercial no Brasil atribui a instabilidade da economia brasileira às idiotices que Bolsonaro/Guedes/Cia repetem, quase que diuturnamente. Mesmo reconhecendo o absurdo das mesmas, sabe-se que essa não é a questão essencial no comportamento da economia. O problema localiza-se nos fundamentos da economia brasileira e mundial. Por exemplo, a economia mundial está atravessando uma crise estrutural de sobre produção, ou seja, de excesso de mercadorias em relação à capacidade de consumo da sociedade. O sistema não consegue manter a lucratividade do capital, com a quantidade de forças produtivas existentes. Torna-se necessário destruir capital para recuperar os níveis de produtividade. A crise de sobre produção decorre de uma contradição central no capitalismo que é, de um lado, um grande desenvolvimento das forças produtivas e, de outro, relações sociais de produção restritivas, que impedem o pleno desenvolvimento das forças produtivas, baseados na propriedade privada dos meios de produção.

Um dos principais sintomas dessa contradição de fundo, é o desemprego tecnológico, ou seja, aquele causado pela introdução de novas tecnologias. Mudanças tecnológicas implicam em elevação da produtividade que, muitas vezes, representa verdadeiros “saltos na produção”. O uso de tecnologias mais eficientes permite produzir mais mercadorias em menos tempo de trabalho, ou seja, com menor quantidade de trabalho humano. O sistema produz assim uma elevação do desemprego em decorrência do novo patamar tecnológico, criando uma força de trabalho excedente, que tende a crescer. O aumento da produtividade através da substituição de trabalho por máquinas gera uma “população excedente”, que é artificial, ou seja, é excedente em função das restrições impostas pelas relações sociais de produção.

O imperialismo não tem outra proposta para enfrentar a crise mundial de sobreprodução, fora as privatizações, destruição de forças produtivas (tanto na periferia, quanto no centro capitalista) e liquidação dos direitos. Além de atacar, claro, as condições de vida e sobrevivência da população em geral. Como não há outra política que substitua essa, todas as manobras políticas, os golpes de Estado, o apoio à extrema direita (como no Brasil, em 2018, na fraude eleitoral que elegeu Bolsonaro) visam criar as condições para aprofundar as políticas neoliberais praticadas. Vimos o que aconteceu no Brasil em 2016: interromperam uma sucessão de governos nacionalistas, moderados e negociadores, e que estavam controlando a inflação, reduzindo o desemprego e distribuindo a renda discretamente. Como a crise mundial se agravou, tornou-se necessário, para sobrevivência do capital, aumentarem os níveis de exploração da classe trabalhadora no mundo todo.

O país não cresce e nem irá crescer porque as políticas desenvolvidas por este governo são anticrescimento. Por exemplo, desde o golpe destruíram o mercado consumidor interno com uma série de medidas, principalmente aumentando o desemprego e a precarização e levando os indicadores de pobreza a explodirem. A chegada da Covid-19, antes de ter sido a causa, potencializou enormemente a tendência ao baixo crescimento.

Como o PIB do país (especialmente o per capita) irá crescer, se aumenta o número de pessoas que passam fome e se entrega as riquezas nacionais o mais rápido possível para os capitais estrangeiros, a preços de banana? Como o país irá crescer se congelaram os gastos com a população por 20 anos, através da Emenda Constitucional 95, a chamada Emenda da Morte? Nem países que perderam guerras mundiais aceitaram assinar leis dessa natureza, que impedem o país de fazer políticas públicas. De 2017 para cá, Educação e Saúde perderam bilhões em investimentos.

Um dos efeitos das políticas do golpe são cerca de 30 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta de condições), o que afeta diretamente o mercado consumidor. Após uns cinquenta anos, o Brasil caminha para sair do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo, o que representa um grave problema estrutural, que já está cobrando o preço da população.

Há uma relação direta entre crescimento, soberania nacional e direitos da população. Uma parte das conquistas da sociedade custa dinheiro e tem que ser financiada com recursos públicos que, em parte, são arrecadados com as riquezas que o país possui. Se são vendidos ativos ligados ao setor de petróleo por uma fração do efetivo valor, ou se entrega a Eletrobrás por preço de banana, fica difícil sobrar recursos para financiar a Seguridade Social.

Com esse conjunto de políticas, que representa um verdadeiro lança-chamas contra a população trabalhadora, o país só conseguiria crescer se houvesse uma conjuntura internacional muito específica, na qual o mundo estivesse crescendo a taxas vigorosas e estivesse ingressando na economia generosas somas de capital internacional para investimentos. Mas o cenário é o oposto, o mundo vive hoje o risco de uma grande recessão global. Dentre outras razões, porque o mercado imobiliário dos EUA está atravessando uma bolha, como aconteceu em 2007.

O padrão de vida conquistados pelos norte-americanos está relacionado, em parte, à sua ação imperialista no mundo todo. Então, ao mesmo tempo em que eles tem que se preocupar com a disputa geopolítica com a Rússia, estão de olho, por exemplo, no tabuleiro político latino americano. Não é nada específico contra a Rússia ou China. É que atuam como um Império que são, e aqueles são seus principais rivais. Se quisermos entender a natureza da “democracia” nos países imperialistas, precisamos saber que o orçamento militar dos EUA para o ano que vem, de US$ 768 bilhões, é superior aos orçamentos militares somados dos 10 países seguintes com os maiores orçamentos.

O golpe de 2016 teve vários objetivos, até em função do fato de que os grupos que deles participaram representam diferentes interesses. Mas é inegável que um dos objetivos do setor mais forte entre os golpistas (ligado ao imperialismo estadunidense) foi tirar o Brasil de uma possível rota do crescimento. O Brasil vinha crescendo a taxas razoáveis, com importante processo de distribuição de renda (mesmo que limitado). O país estava tentando reconstituir sua indústria e havia anunciado, em 2006, a maior descoberta de petróleo do milênio. Além disso, o Brasil estava se aproximando dos maiores inimigos dos EUA, via BRICS. Esta soma de fatores certamente levou os EUA a organizarem mais um golpe de Estado no Brasil. Contando para isso com o apoio interno do que há de pior no país, em todos os sentidos, na política e no mundo empresarial.

A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a posição deste Diário.

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