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Eduardo Vasco

Militante do PCO e jornalista. Materiais publicados em dezenas de sites, jornais, rádios e TVs do Brasil e do exterior. Editor e colunista do Diário Causa Operária.

Uma falsa dicotomia

Os civilizados de hoje são os fascistas de amanhã

Civilização versus barbárie? Os maiores fascistas são justamente os civilizados!

Uma parcela da esquerda brasileira vem caindo no conto da luta épica entre civilização x barbárie. A civilização seria todos aqueles que não concordariam, mesmo que não integralmente, com os bárbaros. Os bárbaros seriam Bolsonaro e os que seguem fiéis ideologicamente a ele. Ex-bolsonaristas, ou bolsonaristas enrustidos, como o influenciador digital Felipe Neto ou o governador de São Paulo, João Doria, estão atualmente na vanguarda da civilização.

Em carta pública dirigida ao expoente do PSDB, o ex-governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, pede que Doria lidere a luta pelo impeachment de Bolsonaro. Referindo-se a este como “Satã” e “Satanás” e citando Winston Churchill, o petista faz um apelo:

Pela sua condição de Governador do Estado mais importante do país, no qual suas classes dominantes têm exercido uma tutela quase plena, há muitos anos, o Sr. detém hoje a legitimidade necessária para – através dos devidos processos legais – desequilibrar o jogo contra Bolsonaro. Pode reunir em torno de si um apoio significativo do empresariado mais privilegiado e rico do país, para defender seu Estado da barbárie negacionista e – por tabela – também ajudar o país: Bolsonaro não pode continuar governando, o Estado está se deteriorando e a aposta dele no “quanto pior melhor” só favorece os assaltantes do caos.

Uma postura idêntica adotou a esquerda parlamentar na corrida eleitoral pela presidência da Câmara dos Deputados. Para justificar seu apoio ao candidato de Rodrigo Maia – Baleia Rossi -, PT, PCdoB e o PSOL (extra-oficialmente) vêm propagandeando que a sua aliança com MDB, DEM, PSDB, PSL e a direita congressista seria uma “frente democrática” contra o fascismo. Em manifesto conjunto assinado pelos presidentes dos partidos que compõem o bloco “antifascista”, afirmam:

Enquanto uns cultivam o sonho torpe do autoritarismo, nós fazemos a vigília da liberdade. Enquanto uns se encontram nas trevas, nós celebramos a Luz.

Tarso Genro não se lembrará que Doria é o mesmo que, na campanha para governador, criou o lema “BolsoDoria”, aliando-se a Bolsonaro e promovendo uma verdadeira campanha eleitoral fascista, de ataques aos trabalhadores e a todos os direitos democráticos, prometendo repressão contra os “bandidos”, “foras-da-lei” da esquerda? Gleisi Hoffmann e os parlamentares de esquerda se esqueceram que Baleia Rossi votou 90% das vezes junto com Bolsonaro na Câmara?

Mais do que isso: a esquerda não consegue entender que foi justamente a direita tradicional, conhecida como “Centrão” ou centro-direita, quem criou e impulsionou o bolsonarismo, justamente para garantir a derrubada ilegal da ex-presidenta Dilma Rousseff? Isto é, que a direita, a burguesia, promoveu o fascismo para dizimar a esquerda e as organizações operárias?

A esquerda deveria aprender com a história. E exemplos históricos não faltam para argumentar contra a ideia da falsa dicotomia civilização x barbárie.

A barbárie, ou seja, o fascismo, nasceu na Sociedade dos Industriais italianos, no momento exato em que a classe operária ameaçava realizar uma revolução com a greve geral seguida das ocupações de milhares de fábricas em 1919-1920. Foram os industriais italianos que alavancaram Mussolini, como bem retratado por Bernardo Bertolucci em 1900. Os civilizados homens de terno e gravata, a alta sociedade italiana. O próprio Mussolini não era um bárbaro. Era um político de carreira e jornalista, isto é, um típico intelectual pequeno-burguês.

Hitler era pintor. Tudo bem, um pintor fracassado. Mas um pintor de Viena, outrora uma metrópole símbolo da aristocracia europeia.

António de Oliveira Salazar, o ditador fascista que governou Portugal durante 40 anos, era um renomado professor universitário. Em 1940, recebeu o título de Doutor honoris causa da Universidade de Oxford.

Plínio Salgado, líder do Integralismo, conhecido como o “Führer brasileiro”, foi um dos mais destacados intelectuais do País nos anos 30.

A Família Real britânica, símbolo máximo da civilização ocidental, apoiou plenamente o fascismo. Quem diria que os lordes e Sua Majestade seriam todos bárbaros? Sim, os fascistas também tomam o chá das cinco! Mussolini fez grandes acordos com a Igreja Católica e Pio XI virou seu amigo. Deus e o Diabo sob o mesmo lençol!

“Os que perpetraram aqueles horrores em Maria eram a fina flor do que a educação fascista tinha produzido. Eram a fina flor da Espanha cavalheiresca”, pensa consigo mesmo Robert Jordan, protagonista de Ernest Hemingway em Por quem os sinos dobram, a respeito da horda franquista que estuprara a sua amada.

Todos os movimentos fascistas saíram da barriga da burguesia. Os capitalistas pariram o fascismo. E continuam parindo até hoje, quando sentem essa necessidade. Isso porque a ideologia da burguesia é justamente o fascismo. Se possível fosse, ela manteria a humanidade sob um regime mais brutal ainda que o próprio nazismo. Mas a luta incessante entre as classes sociais não permite. Por isso a burguesia precisa passar um perfume e pentear o cabelo de vez em quando, colocando um terno em João Doria para apresentá-lo como um modelo civilizacional, a fim de implementar a mesma política bárbara sob um verniz científico.

Para refutar completamente a tese sem sentido de que o fascismo se desenvolve apenas porque “o povo é burro e não sabe votar”, devemos enfatizar: 1) o fascismo sempre ascende ao poder como um movimento de massas, mas das massas “cheirosas” (como diria Eliane Cantanhêde, outra civilizada), ou seja, da pequena burguesia pretensamente intelectualizada; 2) os próprios líderes fascistas são membros das classes abastadas ou são tutelados pelas classes abastadas; 3) o fascismo tomou o poder em alguns dos países mais desenvolvidos do mundo “civilizado” (Alemanha, Itália, Espanha, Portugal, França, Áustria, Japão) e foi um movimento muito grande nos EUA e na Inglaterra, além de ter chegado ao poder nos países atrasados só porque foi impulsionado pelas potências imperialistas “democráticas” (EUA na América Latina, Inglaterra na África do Sul, por exemplo).

A burguesia, a depender a conjuntura política e da correlação entre as forças sociais, adota uma tática diferente de tempos em tempos. Ora, veste Doria de terno e gravata. Ora, o veste de verde e amarelo. Como o “BolsoDoria” não funcionou, agora ela joga a cartada do Doria científico e civilizado. Quando a situação mudar novamente, ela irá ressuscitar o “BolsoDoria”, com um agravante: terá uma legitimidade maior, posto que recebeu o apoio de toda a “civilização”.

A esquerda deve ter um entendimento correto da situação: os civilizados de hoje são os fascistas de amanhã.

A solução, ao invés de ficar eternamente à reboque da direita golpista em uma frente ampla supostamente antifascista, é mobilizar as massas. A união necessária é entre os partidos de esquerda que têm ligação com o povo e os sindicatos e movimentos sociais, com os trabalhadores da cidade e do campo. Só a independência de classe será capaz de derrotar o fascismo. A burguesia não tem esse objetivo.

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