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Eduardo Vasco

Militante do PCO e jornalista. Materiais publicados em dezenas de sites, jornais, rádios e TVs do Brasil e do exterior. Editor e colunista do Diário Causa Operária.

Leste Europeu após a II GM

O stalinismo nunca apoiou nenhuma revolução; as boicotou (II)

Stálin trabalhou para impedir as revoluções na França, Itália e Grécia, bem como para tomar o controle das revoluções no Leste Europeu, pactuando com o imperialismo

Recentemente, o jornalista Breno Altman comentou:

“Segundo Trotsky, Stalin seria um ‘organizador de derrotas’. Mas as várias revoluções pós-1945 foram comandadas por partidos aliados à URSS ou ao movimento comunista se integraram. Nenhuma vitória teve liderança trotsquista ou de outras linhagens dissidentes. Não é curioso?”

Bom, se é curioso, então vamos tentar matar essa curiosidade, ao menos parcialmente, neste artigo.

Comecemos pela segunda parte de seu comentário. Por que será que nenhuma revolução vitoriosa foi liderada por trotskistas? Será porque o próprio Stálin mandou executar todos os trotskistas que havia na URSS e o próprio Leon Trótski? Será porque os partidos comunistas da maior parte do mundo, marionetes de Moscou, realizaram uma verdadeira repressão contra os militantes trotskistas dentro e fora de suas organizações? Será porque o inimigo central de toda a política stalinista era justamente o “trotskismo”, do qual eram acusados todos aqueles que não se ajoelhavam aos pés de Stálin?

Na primeira parte deste artigo citei a revolução espanhola de 1936. A organização mais esclarecida e avançada no movimento da esquerda espanhola dentro da revolução era o POUM, que contava com muitos simpatizantes de Trótski, embora não fosse um partido trotskista. Mas, por não seguir os ditames do Crêmlin, foi duramente perseguido por seus “aliados” do partido comunista e das Brigadas Internacionais nas regiões dominadas pelo PCE. A mando da URSS, seus membros foram presos, obrigados a deixarem o partido, suas milícias foram dissolvidas, o partido colocado na ilegalidade e seus dirigentes, como o secretário-geral Andrés Nín, foram sequestrados, torturados e, finalmente, executados. O esmagamento do POUM pelos stalinistas foi fundamental para a posterior derrota da esquerda para o fascismo na Guerra Civil, com a vitória da contrarrevolução que levou a Espanha a amargar quase 40 anos de terror franquista.

Altman afirma, também, que as revoluções pós-1945 foram lideradas por partidos stalinistas. Isto é, a burocracia soviética teria sido responsável, em última instância, por essas revoluções. Nada mais longe da realidade.

Exemplo disso é a própria libertação dos países do leste europeu do jugo nazista no final da II Guerra Mundial.

A expansão da Alemanha para o leste fez com que as tropas de Hitler ocupassem todos os países da Europa Oriental, incluindo partes da União Soviética. Nesses países, os nazistas implantaram governos fantoches, estabelecendo uma violenta repressão contra a classe operária. Na Polônia, por exemplo (cuja parte ocidental foi entregue a Hitler por Stálin), ocorreram algumas das mais tenebrosas atrocidades já vistas contra a raça humana.

Mas como toda grande guerra é um fator revolucionário, no leste europeu não foi diferente. Embora extremamente abatida pela repressão dos ocupantes, a classe operária desses países manteve-se resistente à medida que os regimes fantoches apodreciam, sem qualquer apoio real em nenhuma parte expressiva da população.

Nesses países, os alemães haviam tomado conta de toda a economia. As fábricas, indústrias e bancos pertenciam ao III Reich e suas economias tinham a única finalidade de abastecer a Alemanha. Eram países colonizados. As usinas, metalúrgicas, minas, fábricas de munições e equipamentos, tudo operava em função da máquina de guerra nazista.

Com o intenso desgaste alemão, motivado por uma guerra em duas frentes de batalha e com o domínio colonial corroído pela resistência armada, os alemães tiveram de abandonar suas propriedades industriais e fugir. A população, cada vez mais organizada em variadas milícias armadas, ergueu-se em um verdadeiro movimento revolucionário para retomar o país, sem os capitalistas, expropriando a propriedade privada. Explodem insurreições por todas as partes.

Aí é que entra o stalinismo, reorganizando os “partidos aliados à URSS” – como diz Altman, na verdade partidos absolutamente controlados por Moscou. Muitos deles cujos burocratas estavam fora de seus países e que, com a chegada do Exército Vermelho, que marchava para o oeste ao expulsar a Wehrmacht e seus aliados romenos, húngaros, búlgaros etc, caíram de paraquedas, tornando-se prepostos da URSS justamente para conter o desenvolvimento socialista da revolução para uma tomada do poder diretamente pela classe operária.

Mais do que isso: Stálin boicotou a tomada do poder pelos partisans em diversos países. Já em 1943, os correligionários de Tito elaboram um programa de socialização da propriedade privada para uma Iugoslávia liberta. Stálin não gosta e manda Dimitri Manuilski, um de seus funcionários para o estrangeiro, avisar Tito que isso não seria tolerado. “O patrão está muito descontente; diz que é uma punhalada pelas costas contra a União Soviética e uma manobra contra a Conferência de Teerã”, escreveu Manuilski, como relata o historiador Jean-Jacques Marie em sua biografia de Stálin.

De fato, o líder soviético já vinha esboçando a partilha da Europa com Churchill e Roosevelt após a vitória iminente dos Aliados contra Hitler. Pouco depois, o destino do continente foi traçado: a Europa Ocidental ficaria na órbita de EUA e Inglaterra, enquanto a Oriental ficaria sob a influência soviética. A Grécia deveria ser controlada pelos britânicos e a Alemanha dividida em quatro, com uma parte para os franceses.

Mas foi ainda pior: após os povos do leste europeu expulsarem os nazistas, não foram apenas os fantoches da burocracia stalinista que tomaram o poder, fazendo uma revolução “por cima” – na verdade, aproveitando-se da revolução para afastar a classe operária efetivamente do poder. Em todos os países (Polônia, Bulgária, Romênia, Hungria, Tchecoslováquia) foram estabelecidos governos de coalizão com os partidos do imperialismo. Eram, em última análise, governos de frente ampla, uma vez que congregavam tanto os partidos comunistas stalinistas como liberais, católicos e “social-democratas”. Nasciam, assim, as chamadas “democracias populares” – que foram levadas ao status de democracia perfeita pela propaganda stalinista no mundo todo, inclusive sendo extremamente elogiadas pelos dirigentes e intelectuais do PCB no Brasil.

O stalinista húngaro Martin Horvat chamou esses regimes de “a forma mais progressista da democracia burguesa, ou mais exatamente como a única forma progressista”. Na Bulgária, onde o Partido Comunista procurava tomar o poder sozinho, Stálin criticou a “pressa” dos dirigentes, bem como mostrou preocupação com a saída do Partido Agrário da coalizão governamental com os comunistas, impondo inclusive que o próprio Partido Comunista se transformasse em uma frente ampla.

Dois países não seguiram esses moldes: Iugoslávia e Albânia. O primeiro, como citado acima, enfrentou os boicotes de Stálin e levou os partisans comandados por Tito ao poder. Isso fez com que a burocracia soviética se enraivecesse e iniciasse, principalmente após 1948, um processo de constante agressão contra os iugoslavos, inclusive acusando Tito de ser um “trotskista”, apenas porque os iugoslavos optaram por ser livres do controle stalinista. Os albaneses conquistaram a libertação da mesma maneira, com os partisans liderados por Enver Hoxha tomando o poder. Em uma característica que lhe assemelha a Mao Tsé-Tung, o líder albanês acabou por defender Stálin publicamente, fruto de sua posição política notoriamente sectária e confusa, embora nunca tenha sido controlado pela burocracia stalinista e tenha rompido todas as relações com ela a partir dos anos 50.

Nos países que ficariam sob a influência de EUA e Inglaterra, a situação não foi diferente. Também foram criados governos de frente ampla, com a incorporação dos partidos comunistas teleguiados por Moscou ao Estado burguês. Na França e na Itália, por exemplo, o PCF e o PCI, sob ordem direta da URSS, desarmaram suas milícias e toda a classe operária, abrindo mão da revolução para constituir um governo de unidade nacional com a direita e inclusive com remanescentes do fascismo. É conhecido o caso italiano, no qual o famoso líder do PCI, Palmiro Togliatti, tornou-se vice-primeiro-ministro e depois ministro da Justiça, anistiando uma série de magistrados que, durante a ditadura de Mussolini, foram responsáveis pela condenação de milhares de militantes comunistas, e mantendo intacta a estrutura judiciária da Itália, que até hoje tem uma Justiça marcadamente fascistóide.

Na Grécia, os comunistas lideravam o movimento de resistência antifascista que apresentava uma ascensão revolucionária e Churchill apoiou a brutal repressão do governo monárquico, resquício do domínio fascista. Stálin respeitou os acordos feitos antes e depois da Conferência de Ialta, lavando as mãos diante do banho de sangue. “Não tenho a intenção de julgar as atuações britânicas na Grécia”, disse Stálin a Churchill (Jean-Jacques Marie. Stalin, p. 757). O primeiro-ministro britânico agradeceu, pouco depois: “Reconheço as atenções que me demonstrou quando nos vimos obrigados a intervir com consideráveis forças armadas para barrar o ataque do EAM-ELAS [braço armado do Partido Comunista Grego] contra a sede do governo em Atenas” (Idem). Em realidade, durante toda a guerra civil, Stálin atuou contra qualquer tipo de ajuda aos comunistas gregos.

Esse cenário se desenhou até 1948, quando o imperialismo, por necessidade, rompeu a aliança com a União Soviética, expulsando os stalinistas dos governos de França e Itália e  iniciando a chamada “Guerra Fria”. Isso fez com que as frente amplas se desmanchassem. Stálin, assim, se viu obrigado a tomar o poder nos países do leste europeu, fazendo com que os partidos comunistas engolissem os demais partidos das coalizões. O que, no entanto, significou a consolidação da integração dos elementos direitistas e burgueses ao regime, e não seu esmagamento. Tal fato foi um fator de direitização ainda maior desses regimes e supressão final das aspirações populares, apesar de ser mantida a propriedade estatal dos meios de produção.

Assim, se na Europa do Leste o stalinismo impediu o desenvolvimento independente das massas trabalhadoras para a tomada do poder e completo esmagamento da burguesia e de seus representantes, entregando o governo para burocratas fantoches que nada tinham a ver com a revolução operária, na Europa do Oeste o stalinismo simplesmente traiu a revolução ao desarmar o povo e ordenar que seus partidos integrassem os regimes burgueses, sendo cada vez mais meros coadjuvantes na cena política ao longo das décadas seguintes.

A URSS de Stálin, portanto, não comandou nenhuma revolução. As roubou para si e para seus burocratas subordinados, no caso do leste europeu, e as traiu de maneira criminosa, na Europa Ocidental.

Por outro lado, pode até ser verdade que nenhuma revolução vitoriosa tenha levado um partido trotskista ao poder, como afirma Altman. Entretanto, será mesmo que o trotskismo não influenciou essas revoluções? E, ainda, não teriam algumas dessas mesmas revoluções sido provas da teoria trotskista da revolução permanente? Analisaremos essas questões posteriormente.

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