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Ascânio Rubi

Ascânio Rubi é um trabalhador autodidata, que gosta de ler e de pensar. Os amigos me dizem que sou fisicamente parecido com certo “velho barbudo” de quem tomo emprestada a foto ao lado.

Imprensa capacho

O método “fake news” da imprensa oficialoide

Todos queremos a paz, é óbvio, mas por que os pacifistas não se insurgem contra os EUA?

tio sam

A imprensa “profissional” do Ocidente está repleta de “analistas” e “especialistas” que alimentam a histeria anti-Putin, canceladora e russofóbica. Para eles, Putin é um “tirano sociopata”, um “alucinado” ou um ex-KGB capaz de apertar o botão da guerra nuclear, quando não um “perseguidor” de homossexuais. Em síntese, Putin é um demônio, o anticristo que ousou opor-se aos “angelicais” e “democráticos” líderes ocidentais.

Que a imprensa é capacho do imperialismo, infelizmente, não é grande novidade. O que talvez o nível do alarido atual nos permita enxergar a olho nu são os métodos que o outrora chamado “quarto poder” sempre empregou.

Uma das estratégias é a simplificação artificial da questão, obtida à custa da omissão de boa parte de seus elementos essenciais. Subtraem-se aspectos fundamentais do problema e constrói-se uma interpretação sobre premissas defeituosas. Isso explica a versão corrente de que Putin, em sua suposta “loucura”, teria invadido a Ucrânia para restaurar o Império Russo ou a União Soviética. A informação escamoteada é o papel da Otan e dos Estados Unidos no conflito, papel que é minimizado, enquanto se cria uma história de mocinho e bandido, na qual o presidente da Ucrânia é apresentado como herói.

Para dar alguma “consistência” à versão mentirosa dos fatos, coisa necessária quando se fala com a classe média pretensamente intelectualizada, escolhem-se a dedo os “intelectuais” que vão endossar essa interpretação, todos devidamente apresentados por seus títulos, por sua vinculação a determinadas universidades e institutos ou por seus “prêmios”.

Essas figuras, que sempre dão “carteirada” na imprensa, nunca se comprometem com um posicionamento político – ao contrário disso, os seus títulos acadêmicos as tornam “neutras”, pois são “cientistas” ou coisa que o valha. Enfim, estariam acima de qualquer suspeita, como se assumir um ponto de vista, em si, tornasse a análise menos confiável. O problema é que os “neutros” têm lado, mas fingem que não têm e usam essa pseudoneutralidade como um ativo que os credencia a emitir qualquer opinião como se fosse fato. Assim, quem compra esse discurso tem a ilusão de que está formando a própria opinião.

Graças a esse tipo de “informação” truncada, ouvem-se grandes bobagens, que reverberam pelas redes sociais, entre as quais a ideia de que a Rússia é um país imperialista ou a de que o sinistro Putin seria capaz de, num ato tresloucado, apertar o botão da guerra nuclear, já que foi um agente da não menos sinistra KGB. Logo, o pacifismo identitário-cancelador entra em ação, dando início a uma cruzada contra a Rússia, seu povo e sua cultura, num espetáculo de ignorância coletiva que interessa, como não poderia deixar de ser, ao Tio Sam.

O tom didático das reportagens do tipo “entenda o que está acontecendo na Ucrânia” é parte importante desse trabalho, pois é a espécie de matéria lida por pessoas mais ingênuas, que receberão uma versão domesticada dos fatos e a tomarão como os fatos em si mesmos. Nesses textos, o vocabulário é selecionado (Putin é “autocrata” ou “paranoico”, os ricos da Rússia são “oligarcas” etc.). Na Folha, por exemplo, uma dessas reportagens didáticas aparentemente vai mostrando os dois lados da questão, ganhando a confiança do leitor, até incluir uma frasezinha:

Agora, o líder russo testa um movimento arriscado para fazer valer os seus interesses —alguns analistas avaliam, inclusive, que Putin está movido por orgulho e paranoia.

Aí vem o link do texto do “analista” do Financial Times, que atribui o conflito ao “orgulho” e à “paranoia” de Putin. Assim, o que era um texto didático, supostamente explicativo, conduz a opinião do leitor.

O Fantástico, programa de noticiário-entretenimento da Rede Globo, num esforço de “didatismo”, chegou a ponto minimizar os efeitos da bomba atômica que os Estados Unidos jogaram sobre Hiroshima, cuja potência seria pequena em comparação com a de armas nucleares que a Rússia pode carregar em caminhões, as quais, segundo a matéria sensacionalista, Putin “pode acionar a qualquer momento” (“Ainda não aconteceu, mas pode acontecer”, alerta a voz off do jornalista). Mesmo que, por óbvio, o arsenal atual seja mais potente e sofisticado, o fato é que foram os democráticos e lúcidos Estados Unidos que jogaram a bomba atômica sobre duas cidades, não algum louco da antiga União Soviética.

Os depoimentos e as imagens também constituem material muito importante. Uns e outros são cuidadosamente selecionados, pois seu objetivo é corroborar certa visão dos fatos e produzir emoção. Um depoimento é a percepção de um cidadão qualquer, portanto não é uma análise dos acontecimentos, mas é usado para emocionar. É claro que só vai ao ar o depoimento que interessa ao dono da emissora.

Com a internet, esse processo de propaganda vai virando uma bola de neve, pois cada um compartilha e faz repercutir a propaganda que comprou, como se aquilo fosse mesmo a sua própria opinião. Em uma live do DCM, o neurocientista Sidarta Ribeiro, ao discutir com o sociólogo Lejeune Mirhan acerca do conflito Rússia-Otan, usou como argumento contrário à ação de Putin, defendida pelo sociólogo, a pergunta retórica “se uma bomba estivesse caindo na sua cabeça, você não seria contra a guerra?”.

Chega a ser constrangedor que um neurocientista cheio de títulos e especialidades lance mão de um raciocínio tão pueril em “defesa da paz”. Como o próprio chat percebeu, ele comprou a propaganda imperialista. Acrescente-se o detalhe de que, para ele, a homofobia é uma questão central no mundo, portanto Putin, o vilão que dizem “perseguir” homossexuais, já seria, de saída, persona non grata.

Esse tal Sidarta representa a posição da esquerda identitária, que vai na linha do Jean Wyllys, outro que gastou papel na “defesa da paz”, como se isso não fosse apenas uma platitude nesta situação. É óbvio que todos queremos viver em paz, mas deveria ser igualmente óbvio que o imperialismo produz a morte dia após dia com sua política. Por que os pacifistas não se insurgem contra os Estados Unidos? O que os olhos não veem o coração não sente, já diziam as nossas sábias avós.

Defender a paz, como o faz a esquerda nem-nem do Jean Wyllys e outros, é uma estratégia de “neutralidade”, mas, como vemos, não existe neutralidade num conflito como esse. Ser pacifista, nesse caso, é evitar a luta e capitular ante o poder estabelecido. Putin foi impelido a usar a força pela intransigência do Ocidente. “Que você faria se fosse o líder da Rússia?” – foi essa a pergunta de Lejeune a Sidarta, que a achou inoportuna e decidiu falar de homofobia mesmo, ignorando totalmente o ruidoso chat.

O problema dos “pacifistas de araque” é que eles acham que o que a imprensa do sistema não mostra não existe. É como se Putin, em sua “paranoia” ou em um momento de “alucinação”, tivesse decidido invadir o pobre país vizinho, cuja população luta no corpo a corpo contra soldados altamente equipados, num combate desigual e blá-blá-blá. Putin tem um rosto, tem uma personalidade que os moralistas e identitários estão adorando pichar e cancelar; a Otan não tem rosto – e o herói de meia-tigela Zelenski não passa de um boneco de ventríloquo que será descartado assim que não tiver mais utilidade para os seus chefes.

Como se vê, é a propaganda diuturna que constrói a “opinião pública”. Notícias de que Netflix, McDonald’s ou Starbucks suspenderam atividades na Rússia são tratadas como verdadeiras tragédias. Como viverá o povo russo sem essas coisas? Afinal, a vida das pessoas no maravilhoso capitalismo é uma sucessão de atos de consumo. É como se não houvesse vida possível fora desse sistema. É verdade que a Rússia de hoje é um país capitalista, mas a recusa de Putin à subserviência ao centro do poder capitalista global, cujo braço armado é a Otan, constitui séria ameaça a essa ordem. Então, dá-lhe propaganda, com direito às velhas fake news da imprensa oficial.

* A opinião do colunista não reflete necessariamente a posição deste jornal

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