Na última semana, o jornal mais conservador do País, o Estado de S. Paulo, publicou um editorial criticando a política de voto útil. Intitulado “’Voto útil’ para quem?” o artigo atacava duramente a estratégia adotada pela campanha de Lula, que convoca os eleitores brasileiros a apoiá-lo no primeiro turno, antecipando a derrota de Bolsonaro.
Antes de começar a crítica, preciso fazer uma ressalva sobre o artigo do Estadão: a estratégia petista é, de fato, redondamente errada. Lula, como um candidato popular, com ampla penetração nas massas, não precisa se vender como o “mal menor” contra Jair Bolsonaro. Ele é o candidato da luta contra o golpe de Estado, da defesa da soberania nacional; o candidato dos trabalhadores brasileiros. Apresentar-se como uma bóia salva-vidas para quem quer desesperadamente derrotar Bolsonaro não fortalece sua candidatura, mas como mostram as próprias pesquisas burguesas, a enfraquece. Lula deve apresentar um programa positivo, que mobilize a população, e não um programa meramente negativo, que se opõe a Bolsonaro. Essa é a política “deles”, aquela é a nossa política.
Ainda que seja a política “deles”, curiosamente “eles” atacam a campanha feita pelo PT chamando o voto útil. Não foi apenas o Estadão. A presidenciável do MDB, Simone Tebet, tachou a estratégia como “desrespeito à população brasileira”. Ciro Gomes esbravejou em seu estilo clássico. O presidente de seu partido, Carlos Lupi, disse que “voto útil só serve aos inúteis”.
Os que acreditam que Lula é o candidato do imperialismo no Brasil não analisam a política por meio dos parâmetros materiais. O imperialismo derrubou o PT em 2016, prendeu Lula em 2018 e tentou deixa-lo inelegivel novamente mas não conseguiu devido a luta dos trabalhadores.
— PCO – Partido da Causa Operária – (M) (@mpco29) September 16, 2022
Para quem acompanha apenas a política nacional, talvez essa mobilização contra o voto útil não chame atenção, mas como alguém que se esforça para acompanhar a política internacional, preciso destacar a hipocrisia desses setores. Absolutamente todos, imprensa e políticos burgueses brasileiros, sinalizaram seu apoio a Joe Biden nos EUA. Em torno de que girou sua campanha? Do voto útil.
A aprovação de Biden é pífia considerando que o septuagenário é o presidente norte-americano que recebeu mais votos na história do país. Oscila em torno de 38%. Sua candidatura não empolgava ninguém, especialmente no cenário das mobilizações em repúdio ao assassinato bárbaro de George Floyd em 2020. O povo se mobilizou contra a polícia e, até agora, Biden só fez aumentar o orçamento do aparato repressivo…
O povo norte-americano jamais elegeria Biden se a imprensa monopolista não tivesse transformado o então presidente Donald Trump num espantalho. Ao mesmo tempo, convenceram a população de que o “radicalismo” de Bernie Sanders, alternativa de esquerda moderada dentro do Partido Democrata, não derrotaria Trump. Sanders, em episódio vergonhoso, mas não inédito, abandonou sua candidatura para apoiar seu “amigo de longa data”, Joe Biden.
As eleições norte-americanas de 2020 foram o exemplo perfeito da política da burguesia, da política “deles”: como eleger um candidato sem votos. No Brasil, onde Lula e Bolsonaro bloqueiam a estratégia, a burguesia acusa o “voto útil” de ser antidemocrático. Nós poderíamos assinalar que é uma péssima estratégia, mas antidemocrático? Cada um vota em quem quiser, pelos motivos que bem entender.
O problema do “voto útil” no Brasil é a falta do adendo “para a burguesia”. Eles tentaram com o “ele não” de 2018; ou o “mulher vota em mulher” ou “eles não” de agora, mas a polarização política não deixa que os principais candidatos do setor mais poderoso da burguesia nacional avancem. O problema, portanto, não é com a estratégia de “voto útil”, mas que a utilidade esteja direcionada a Lula.
Destacada essa hipocrisia da burguesia nacional, que só reprova essa estratégia porque não consegue emplacá-la, gostaria de deixar um gancho para a próxima coluna, quando discutiremos por que a tática é ruim para o próprio PT. O principal motivo é: essa é uma estratégia para se eleger um candidato sem votos como Biden, não um candidato popular como Lula. Lula não é o Biden brasileiro.