Por Victor Assis
Há mais de um mês, o povo chileno está nas ruas para exigir a derrubada do governo golpista de Sebastián Piñera. Mesmo diante das promessas da burguesia, as mobilizações continuam, mostrando uma forte disposição para a luta contra a direita. Mas… A política da mobilização não é a política que as organizações da esquerda chilena têm adotado.
No Equador, a mobilização popular abriu uma crise tão grande no regime político que o governo traidor de Lenín Moreno foi obrigado a mudar, às pressas, a capital do país. Milhares de equatorianos foram às ruas dispostos a pôr abaixo o governo pela força. Mas… Nenhuma grande organização se dispôs a levar a luta até as últimas consequências.
No Uruguai, uma manifestação gigantesca mostrou que a população estava contra a reforma constitucional Viver sem medo, que aumentava o poder dos militares no regime. Mas… a esquerda uruguaia não deu continuidade à mobilização, de modo que os militares avançaram e garantiram a vitória eleitoral do candidato da direita Lacalle Poe.
No Brasil, a burguesia, encurralada pelos levantes na América Latina e pela tendência à mobilização crescente, verificada nos atos em Curitiba pela liberdade de Lula, decidiu soltar o ex-presidente. Mas… as direções do movimento popular se recusam a levantar a palavra de ordem de “Fora Bolsonaro” e, desse modo, pôr fim ao governo entreguista e de extrema-direita.
No último domingo (25), o presidente boliviano Evo Morales, do Movimento ao Socialismo (MAS), declarou que não iria concorrer às novas eleições presidenciais, convocadas pela direita golpista. Sem Evo Morales nas eleições, a burguesia terá muito mais facilidade de controlar o processo e garantir que a direita saia vitoriosa.
A política que vem sendo levada pelo MAS na Bolívia, que está em evidência devido ao alto grau de desenvolvimento da luta de classes, nos ajuda a compreender, de maneira clara, os entraves que os trabalhadores estão enfrentando na América Latina. O governo golpista de Jeanine Añez já matou 32 pessoas em apenas 15 dias – a crise na Bolívia já se converteu em uma verdadeira guerra contra a população -, mas não há, por parte das organizações de massa bolivianas, nenhuma iniciativa no sentido de derrubar a direita.
Até pouco tempo, Evo Morales e seu partido governavam a Bolívia, mantendo desde a presidência da República até mesmo o Senado e a Câmara dos Deputados. No entanto, bastaram três semanas de pressão da extrema-direita e das Forças Armadas para que Morales renunciasse, arrastando consigo uma série de parlamentares e lideranças do MAS.
Em nenhum momento, mesmo quando o golpe se tornava cada vez mais óbvio, nem Evo Morales, nem o MAS procuraram organizar uma reação dos trabalhadores à ofensiva da direita. O povo permaneceu desarmado e não foi convocado para sair às ruas em defesa do governo. Depois que o golpe militar foi consolidado, os bolivianos saíram às ruas para protestar contra a direita e, tão logo Añez se autoproclamou presidente, exigir sua saída.
As manifestações pró-Evo na Bolívia não foram pequenas, nem puras encenações. Conscientes do que estava em jogo – isto é, a completa pilhagem do país pelo imperialismo -, os bolivianos partiram para um enfrentamento direto contra a extrema-direita, a polícia e até mesmo as Forças Armadas. A mobilização se radicalizou cada vez mais, e os trabalhadores chegaram até mesmo a subir em tanques de guerra. Mas…
A mobilização na Bolívia, que poderá levar o país a uma guerra civil, permanece sendo ignorada pelo MAS. Ao contrário de aproveitar as condições extremamente favoráveis para a mobilização e jogar o povo contra a direita golpista, as direções da esquerda boliviana optaram por fazer uma série de acordos com o regime político. Em último caso, com o povo morrendo nas ruas de bala e sedento por se livrar dos lacaios do imperialismo, os parlamentares do MAS, junto com Morales, insistem em falar em pacificação.
O caso do MAS, embora se coloque de maneira mais explícita por causa da situação em que se encontra a luta na Bolívia, não é diferente em toda a América Latina. Em vários países, a brutalidade da política neoliberal provocou levantes com características revolucionárias; contudo, em todos esses países, os trabalhadores sempre se depararam com um mas: “mas agora não é a hora”, “mas é preciso dialogar”, “mas é preciso respeitar as instituições”, “mas é preciso evitar o derramamento de sangue” etc.
É preciso, para já, romper com essa política de subordinação aos interesses do imperialismo. Se antes o principal discurso para a paralisia era o de que os trabalhadores não estariam prontos para uma revolta, agora já não é mais possível se apegar a isso. O continente está convulsionado, e é preciso aproveitar o momento para travar uma luta decisiva contra a burguesia de conjunto. Fora imperialismo da América Latina!