Muito comum tempos atrás no futebol, um determinado jogador do time tinha missões abertamente intimidatórias. O drible humilha, mas, vez ou outra, é preciso de uma chegada mais forte, para mostrar que se vier, vai ter open bar de agressão.
Alguns bons times se constituem assim, e são campeões assim. Serginho Chulapa, por exemplo, trilhou esse caminho. Podia até perder em campo, mas na porrada, não. Isso impunha respeito.
Para variar, essa foi mais uma arte desenvolvida por Pelé, o Rei, que também sabia resolver (com muita classe) os problemas dentro das quatro linhas, com e sem a bola. Coisa linda de se ver, o homem sabia bater: https://www.youtube.com/watch?v=UNbta4WzmNY
Com o tempo, jogadores assim foram transformados em inimigos públicos número 1. Hoje em dia o jogador precisa ser padre e até o drible é considerado uma ofensa digna de um cartão amarelo, como já o levou Neymar.
Os gringos querem um match de football, com ladies de luvas brancas batendo palmas, silêncio e gentlemans em campo, plateia cult, e isso é um saco.
Já tem algum tempo que comento com os companheiros de Zona do Agrião que está faltando esse tipo na seleção do Brasil. O tipo que, ao ver que tem muita folga do outro lado, não perde a primeira oportunidade de pregar o brinco do cidadão, um pisão, um tostão, um recado… para as coisas se normalizarem. Isso é necessário, faz parte do esporte. O chamado fair play só vale se você estiver ganhando.
De tantos que vi, Júnior Baiano era um deles. O meu Flamengo ia perdendo, mas eu sabia que cedo ou tarde o nosso zagueirão iria lavar a nossa alma. Vez ou outra alguém saía machucado, mas, paciência, é parte da própria vida. Ah… não posso esquecer de Bellini, nosso imortal xerife, e sua famosa foto de guerra, com a camisa do Vasco da Gama. Não era craque, mas ali ninguém passava, às vezes por puro medo.
Eu mesmo já protagonizei um momento desses.
Meu técnico, o Fumaça, 25 anos atrás, mandou que eu, zagueiro do querido TEC (Taguatinga Esporte Clube), esquentado a vida toda, partisse um rapaz ao meio. A vítima era um atacante abusado do Ceilândia (DF).
O jogo ia começar e Fumaça me puxou pelo braço, apontou para o rapaz e disse: “vai lá e dá no meio dele”, “ele ali, né”, eu disse. “Isso, manda ele para o hospital”, falou o experiente e saudoso Fumaça.
No primeiro lance, ele veio de lá, rápido toda vida, e cortou para dentro do meu flanco esquerdo. Eu fui, em alta velocidade, por cima da bola com as duas pernas esticadas, em 40º de ângulo. Braço direito protegendo o queixo, braço esquerdo, o nariz e os olhos. Ele foi para o chuveiro aos prantos. Levei amarelo.
Claro que o técnico adversário não deixou barato, e escalou um zagueiro gigante para jogar no ataque deles e me pegar. O encontro, do qual não lembro, resultou em mais dois pacientes no Hospital Regional de Taguatinga (HRT). Ao final, éramos três no HRT, tudo bem, faz parte, bola pra frente.
Em outra oportunidade, eu estava em um time muito bom, campeão de tudo na região. Pegamos um time de caras pernas de pau e reconhecidamente muito mal encarados. Um deles jogava com uma chave de fenda escondida no meião. Ele, sabendo que eu era da turma do “não deixa disso”, fez questão que eu visse a chave de fenda. Um time muito ruim, o deles, muito bom, o nosso. 0 x 0 o placar final, fez-se a justiça.
Em outros tempos alguém poderia simplesmente buscar um revólver no fusca que estava estacionado logo ali e resolver a partida. Eu cheguei a ver essa maravilhosa época.
Eu tenho a convicção que, sem um jogador assim, a gente terá mais dificuldade de trazer o Hexa. Recentemente até sonhei que o Edmundo “Animal” vinha em minha casa discutir essa tese.
Minha única sugestão ao calculista Tite é que ele convoque a seleção com isso em mente, é preciso ter um jogador “caixa de ferramentas”. Que vai trazer a Copa no sangue, na porrada, se for necessário.
Quando do 7 x 1 – não sei se era só eu – torcia para que algum jogador brasileiro quebrasse mesmo a perna de um alemão. Ao final, torci para que o avião deles simplesmente caísse. Sendo honesto com vocês, era a única coisa que eu pensava.
2022.
Novamente ano de Copa do Mundo e de eleições, ano de muita luta, especialmente para nós, do PCO. E, para todas essas coisas, iremos precisar de caras que abram a caixa de ferramentas, de gente que vai lá e dá no meio dos caras, gente que mande alguém para o hospital. Isso é parte da vida, do futebol e da política.