Entre 1974 e 1975, uma missão francesa liderada pela arqueóloga Annette Laming-Emperaire descobriu e revelou ao mundo um fóssil de mais de 11.000 anos encontrado na região de Lagoa Santa, em Minas Gerais, pertencente a uma mulher – posteriormente batizada de Luzia, em homenagem à Lucy africana. A descoberta servirá de base para a teoria elaborada por Walter Alves Neves de que o continente americano teria sido ocupado por duas levas migratórias de homo sapiens vindos do nordeste da Ásia, sendo a primeira a dos antepassados de Luzia, que tinham traços africanos e australianos, e a segunda, de ameríndios com morfologia mongoloide, semelhante aos indígenas atuais.
O fóssil da mulher mais antiga da América de que se tem conhecimento era uma das relíquias sob a guarda do Museu Nacional, que foi tomado por um incêndio no dia 02 de setembro deste ano e teve grande parte do seu acervo destruído. A importância de Luzia para a ciência é inestimável, sendo uma das peças mais importantes da história natural da América.
Se Luzia esteve escondida por tantos milhares de anos, hoje ela está perdida entre cinzas e muita especulação. Até o momento, não se sabe se foi destruída pelo fogo ou se estaria entre escombros e sujeira decorrentes do incêndio no mais antigo museu do país.
Não deixa de ser melancólico que se promova o Festival Museu Nacional Vive, junto ao prédio anexo ao Museu, que abriga a coleção de invertebrados, e com barracas espalhadas em frente ao museu, que agregou o acervo do Horto Botânico, como peixes e aves. A despeito da da boa vontade e da iniciativa do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), como parte da programação da 12ª Primavera de Museus, ver uma réplica de Luiza, feita de plástico, resultante de uma impressão 3D, é o retrato do governo golpista: uma imitação.
Enquanto se procura Luzia, a verdadeira, o desgoverno golpista brinca de estar preocupado com a cultura e com a ciência, oferecendo apoio a manifestações tristes como as de expor réplicas de plástico de um fóssil milenar, em tendas, ao lado de um museu centenário caindo aos pedaços, vítima do descaso. Mas Luzia pode ter se perdido para sempre, como poderemos perder o pouco que resta de democracia, se não nos mobilizarmos para derrotar o golpe – que quer substituir a soberania popular por uma réplica feita sob medida pelos donos do poder.