Uma polêmica tem se estabelecido no transporte público com relação às medidas a serem adotadas para que, não só o usuário do serviço, mas também o motorista e o trocador, possam viajar durante o percurso necessário à utilização do transporte, sem que se sujeitem à uma aglomeração condenada pela prática sanitária de combate à disseminação do coronavírus.
Como sempre há uma questão determinante da economia por trás de tudo, aqui também não foge à regra e fica a pergunta: a empresa se sustenta sem superlotação? Ou por outra: A superlotação decorre da falta de capital para investir numa frota maior ou é um abuso que se justifica pela busca do maior lucro?!
Na verdade, a própria pergunta já é resposta. É difícil imaginar que a situação de todas as empresas de transporte que trafegam sempre superlotadas por todo o país, tenha o mesmo problema, ou seja: falta de capital. De maneira que fica fácil concluir que se trata de uma prática para aumentar o lucro às custas da má acomodação do usuário, e sem que o poder público se oponha, o que é muito contraditório, já que o gestor da “coisa pública” deveria se preocupar com o que seja melhor para a população.
Essa discussão é vivenciada no dia-a-dia de muita gente, como é o caso, por exemplo, de Salvador/BA. Lá A prefeitura teve que intervir na administração da empresa concessionária de ônibus, a CSN, responsável pelas linhas de ônibus da Estação Mussurunga e Orla da capital baiana, depois que ela entrou com ação judicial alegando dificuldades financeiras. O município decidiu intervir e assumir os 4 mil trabalhadores da empresa para preservar seus empregos e não paralisar o serviço.
Em decreto publicado neste último sábado (20), a administração municipal revelou que a empresa e seus acionistas não propuseram nenhuma medida para resolver o problema e entraram na justiça para tentar entregar a concessão.
Os rodoviários planejavam fazer paralisação neste domingo porque a empresa não estava honrando corretamente o pagamento salarial e o tíquete-alimentação, mas o ato foi suspenso após o anúncio de que a prefeitura assumiria a responsabilidade. A princípio, o prazo da intervenção é de 180 dias, podendo encerrar antes.
A empresa chegou a negociar com o sindicato o pagamento integral do ticket em 16 de junho, porém não conseguiu cumprir com o prometido, explicou Mota, diretor do Sindicato. “Nós demos o ultimato que seria possível esperar até o dia 20 de junho para resolver o problema, mas não foi resolvido. A gente percebia que eles se esforçaram para pagar, mas não via o resultado e não tínhamos como esperar mais”, disse.
O diretor disse ainda que, desde 2018, a empresa atrasava o pagamento de impostos e deixou de pagar a Participação nos Lucros ou Resultados.
Outro exemplo também dessa situação vem de São Paulo, capital, onde o prefeito da cidade, Bruno Covas (PSDB), após ameaçar demitir o secretário municipal de transportes, Edson Caram, caso ele não conseguisse que os ônibus trafegassem apenas com passageiros sentados, voltou atrás na ideia sob o argumento de que, o fato de passageiros irem em pé ou sentado nos coletivos não é mais um fator importante para a propagação da Covid-19.
Segundo a Prefeitura, a Vigilância Sanitária fez um documento informando que a diferença não está em o passageiro estar em pé ou sentado, mas no distanciamento social entre eles. Em nota, a Prefeitura disse que “a posição em que o passageiro é transportado não é o fator mais importante na transmissibilidade do coronavírus, mas, sim, o distanciamento, aliado a hábitos de higiene como lavar as mãos com água e sabão, usar álcool em gel e o uso permanente de máscaras”.
Na verdade, a resposta que parece ser um grande achado não resolve o problema, e não passa de uma falsa retórica, porque, o coletivo sequer poderia trafegar com duas pessoas por banco, o que, numa conta simples sugere que. em vez de um ônibus, a empresa teria que se utilizar de 2 para transportar o mesmo número de pessoas.Todavia, considerando que sempre transportou com superlotação, ou seja, o coletivo dobrava sua capacidade de usuário levando gente em pé e superlotado, não se tratava mais de colocar 2 ônibus e dobrar a quantidade de linhas, e sim de colocar 4 ônibus, quadruplicando a quantidade de ônibus necessária para transportar o mesmo número de pessoas.
Embora fosse evidente isso para todos os usuários, a pandemia colocou isso formalmente, e demonstrou de forma cabal, como o transporte público abusa da necessidade do trabalhador de se locomover por ele de casa para o trabalho e vice-versa, e lucra às custas disso, pelo menos 2 ou 3 vezes mais.
Na situação atual, o transporte público ficou muito em evidência já que é um dos principais focos de propagação do vírus, um fato que fica evidenciados pelas superlotações.
A conclusão para esse problema está na necessária estatização do serviço público de transporte, cuja receita para a sua manutenção, assim como a saúde e a educação, não pode vir da privatização de serviços essenciais como são, transformando-os em mercadorias expostas ao mercado pressupondo como condição de existência o lucro e mais nada. Como sempre, a lógica do capital, e que coloca o bem estar do trabalhador em segundo plano, é incompatível com a prestação de serviços públicos.