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Golpe na Bolívia

Os erros de Evo Morales promovem violência da direita

O presidente boliviano Evo Morales, deposto por um golpe militar no dia 10 de novembro, declarou que não irá concorrer às novas eleições presidenciais para "pacificar o país".

Poucos dias depois de a Colômbia se juntar à lista de países convulsionados na América Latina, tendo levado mais de um milhão de pessoas às ruas contra o fascista Iván Duque, o presidente boliviano Evo Morales, deposto por meio de um golpe militar, tomou a decisão de não participar das novas eleições para presidente da Bolívia, contrariando toda a tendência à mobilização no continente. A declaração de Morales foi dada em entrevista junto ao jornal argentino Página/12, publicada no dia 24 de novembro.

Logo no início da entrevista, ao discutir a decisão do Senado boliviano de convocar novas eleições, Morales declarou:

Sim, houve uma reunião sob a garantia das Nações Unidas, a Igreja Católica e a União Europeia. No dia em que cheguei ao México, pedi em uma entrevista coletiva para mediadores internacionais e personalidades de todo o mundo para que ajudassem na pacificação da Bolívia. Felizmente, isso acabou de acontecer, contando inclusive com a participação do governo de fato de Jeanine Añez. O Movimento ao Socialismo (MAS) representa dois terços dos senadores e deputados. Faremos o possível pela unidade. E, pela pacificação, desisto de minha candidatura.

Fica bastante claro, pela própria declaração do presidente boliviano, que Morales estava, a todo tempo, buscando um acordo com a direita para dar fim à crise política no país andino. Ao falar em mediadores e personalidades, o que Evo Morales expressa é uma tentativa de negociar, junto aos representantes do imperialismo, uma saída que poupasse um enfrentamento direto com a burguesia.

As Nações Unidas, a Igreja Católica e a União Europeia não são instituições criadas para promover a “paz”, o “bem” ou qualquer outra questão que fosse supostamente de interesse da humanidade. Todas essas organizações, conforme a história já comprovou milhares de vezes, cumpriram um papel fundamental na defesa dos interesses da burguesia internacional. A Igreja Católica, por exemplo, apoiou a ditadura de Benito Mussolini, na Itália, e praticamente todos os regimes com características fascistas no mundo. As Nações Unidas e a União Europeia, por outro lado, apoiaram todas as guerras defendidas pelo imperialismo – além de que, ambas se juntaram para boicotar o governo popular da Venezuela.

A política da conciliação, das tentativas de acordo com a direita golpista, é justamente o que Evo Morales vem fazendo no último período. Morales, no início de 2019, ao se dar conta que o imperialismo preparava um golpe contra seu governo, fez dois acenos claros à burguesia internacional, indicando que estaria disposto a abrir mão de parte de seu programa para permanecer no poder. Naquela época, o presidente boliviano entregou o guerrilheiro Cesare Battisti à extrema-direita italiana e compareceu à posse do fascista brasileiro Jair Bolsonaro.

Após ser reeleito nas eleições de 20 de outubro, Evo Morales começou a sofrer uma pressão ainda mais intensa por parte da burguesia. No entanto, em vez de denunciar o golpe e preparar o trabalhadores para reagirem à investida da direita, Morales aceitou que a Organização dos Estados Americanos (OEA), diretamente controlada pelo imperialismo, investigasse as eleições. Depois que a OEA, cumprindo as ordens da direita, acusou Morales de fraudar as eleições, o presidente boliviano abriu mão do seu quarto mandato, convocado novas eleições, e, por fim, ameaçado pelos militares, renunciou seu mandato que estava em vigência.

Nenhuma das capitulações de Evo Morales serviu para frear a ofensiva golpista. Muito pelo contrário: na medida em que o líder cocaleiro foi mostrando que não enfrentaria a direita, a burguesia se sentiu em condições mais favoráveis para avançar e tomar conta da situação. Nesse sentido, anunciar que não irá concorrer às próximas eleições é mais uma decisão desastrosa.

Duas palavras ditas por Morales chamam muita atenção: unidade e pacificação. Em relação à unidade, seria necessário perguntar: unidade com quem? Com as Nações Unidas, a OEA a União Europeia e até mesmo com a golpista Jeanine Añez – isto é, com quem organizou um golpe que pôs sua própria vida em risco? Já em relação à pacificação, levanta-se a questão: a burguesia está disposta a entregar a paz aos bolivianos?

Não é possível fazer unidade com a direita golpista porque seus interesses são completamente divergentes dos interesses da população em geral. A crise em que o capitalismo se encontra obriga a burguesia a saquear todos os países da América Latina. Os trabalhadores, por outro lado, que querem ter condições dignas de vida, não demonstram estar dispostos a assistir que o imperialismo opere a mais completa pilhagem sobre seu patrimônio. Essa situação, portanto, coloca na ordem do dia a necessidade de a esquerda e os trabalhadores travarem uma luta contra a burguesia pela sua própria sobrevivência.

Se a burguesia for vitoriosa nesse conflito, milhões de bolivianos irão morrer de fome, outros tantos pela repressão do Estado, e outros tantos viverão na miséria. Portanto, a pacificação proposta por Evo Morales, que seria a da capitulação, a da concessão à direita, é impossível. É preciso, dessa forma, organizar os trabalhadores para impedir que mais sangue do povo boliviano seja derramado.

O que chama bastante atenção é que o próprio Evo Morales mostra ciência dos motivos que levaram ao golpe militar contra ele:

Eles não aceitaram que os movimentos indígenas e sociais mudaram a Bolívia quando começamos a fazê-lo. Depois da nacionalização, começamos com a industrialização. Nosso grande projeto foi industrializar o lítio. Portanto, as transnacionais e alguns grupos no Chile não queriam que continuássemos.

Evo Morales também demonstrou, na entrevista, estar ciente de que a direita está matando e aterrorizando o povo boliviano impiedosamente:

Há pessoas que ainda não conseguem acreditar que o comandante da Polícia Nacional ou o comandante das Forças Armadas fazem parte de um golpe de estado. Um golpe que matou 32 pessoas em menos de um mês. Mortos à bala! E também há cerca de 700 tiros feridos. Mais de mil presos. Imagine quantos mortos, quantas viúvas, quantos viúvos, quantos órfãos. Filhos baleados … Um golpe de estado no estilo de ditaduras.

(…)

Você sabe por que renunciamos no domingo, 10 de novembro, com o companheiro García Linera? Porque eles pegaram líderes, militantes, governadores dos departamentos, prefeitos e disseram que iriam queimar suas casas se eu não renunciasse à minha posição. O irmão do presidente da Câmara dos Deputados foi informado: “Se o seu irmão não renunciar, nós o queimaremos na praça”. Eles queimaram a casa da minha irmã em Oruro.

O que Evo Morales revela, em manter uma política supostamente conciliadora – que, no fundo, é uma política de submissão – mesmo diante de tantas demonstrações de que a burguesia é uma corja imunda de golpistas disposta a qualquer coisa para assaltar o povo latino-americano, é que há uma tendência das direções da esquerda nacionalista latino-americana em evitar o enfrentamento com a direita. Essa política, por sua vez, se apoia em ilusões de que o regime político comportará, de alguma maneira, setores que sejam contrários a política neoliberal.

A eleição de Alberto Fernández e Cristina Kirchner, na Argentina, podem, em certa medida, alimentar as ilusões de que haveria um “limite” para falta de escrúpulos da direita. Isso, no entanto, é uma avaliação equivocada do desenvolvimento da luta de classes. A vitória eleitoral do peronismo não expressa uma decisão da burguesia em reverter a ofensiva contra a América Latina, mas é justamente um pequeno recuo, absolutamente temporário, para permitir que os ataques contra a esquerda e os setores democráticos se aprofundem em larga escala.

Pouco tempo depois de o peronismo vencer as eleições argentinas, a Bolívia sofreu um golpe militar escancarado, as eleições uruguaias passaram a ser tuteladas pelas Forças Armada e o governo de Iván Duque reprimiu violentamente uma greve geral. No Brasil, enquanto a soltura de Lula ainda estava sendo comemorada, o ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel (PT) foi condenado a 10 anos de prisão.

A insistência em manter acordos com os maiores inimigos da humanidade, nessa etapa da luta política, em que a luta de classes se coloca de maneira cristalina, é uma política inaceitável para a esquerda. Na entrevista, Morales, ao defender uma política de conciliação, chega a assumir um tom quase que religioso:

Esperamos que os mortos à bala aumentem a conscientização das autoridades governamentais de fato. Que tantos detentos amolecem as consciências. Que não haja mais mortos ou feridos!

Felizmente, não é essa a política que o povo boliviano está levando nas ruas. O enfrentamento contra a direita cresce e se radicaliza a cada dia. Já são inúmeros os episódios em que os trabalhadores, que não estão dispostos a aceitar um acordo junto ao regime golpista, enfrentaram a polícia com paus e pedras, chegando até mesmo a subir em um tanque de guerra. Esse é o caminho da vitória dos trabalhadores,  o caminho da paz entre os trabalhadores, o caminho da luta contra a fome, a miséria e o golpismo: é preciso organizar o movimento popular boliviano para que se arme, enfrente a extrema-direita nas ruas e coloque para correr os lacaios do imperialismo!

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