Segundo a piada, a Revolução Russa começou quando o povo descobriu que o czar e o tzar eram a mesma pessoa.
Aqui, no Brasil, teríamos um fenômeno parecido, porém invertido, se formos levar em conta as pesquisas de intenção de votos nas eleições desse ano. O povo (pelo menos uma parte dele, aparentemente) ainda teria que descobrir que Lula e Lula são a mesma pessoa. Vejamos o porquê.
O Ibope e o jornal O Estado de S. Paulo afirmam que Lula teria 37% do eleitorado, deixando Bolsonaro em segundo lugar com 18%, seguido de Marina Silva com 6%, Ciro e Alckmin, com 5% cada um, Álvaro Dias, com 3% e outros sete candidatos com menos de 1%. Nesse quadro, haveria ainda 22% de votos inválidos (nulos e brancos, 16%) e declarações de que o eleitor não sabia em quem votar (6%). Nessa situação, Lula é o “czar”. Poderia, até mesmo, vencer no primeiro turno com o dobro de votos do segundo colocado.
Entra a operação para enganar o povo. A capa d’O Estado de S. Paulo desta terça-feira (21), divulga a pesquisa do Ibope, dando conta de maneira bem cuidadosa de um segundo aspecto das mais de 2.000 entrevistas realizadas. Diz: “Bolsonaro se isola na liderança; Marina e Ciro disputam segundo lugar”. Dão a entender que Lula não existe ou, pelo menos, nunca tivesse sido candidato nesta eleição.
Antes que algum fã da imprensa burguesa nos acuse de intolerância contra o seu “Estadão”, ressaltamos que o “olho” da matéria diz que “no início da campanha, deputado tem 20% no cenário sem Lula, seguido por Marina (12%), Ciro (9%) e Alckmin (7%)”. A manipulação não seria eficiente se não dessem margem para dizer: “mas nós avisamos que este seria um cenário e não o cenário”. Assim, emendam a manchete escandalosa e fraudulenta com uma frase em letras miúdas.
Eis que o ex-presidente, que se elegeu duas vezes e apresentou Dilma Rousseff ao público, para que fosse eleita para mais dois mandatos consecutivos, tornou-se o “tzar”. Se o seu nome sair da “cédula”, seus votos desaparecem, se dispersariam da maneira mais improvável. Vamos aos números.
Os votos inválidos e a indecisão do eleitorado aumentariam em mais de dois terços, saltando de 22% para 38%. Considerando o eleitorado apto a votar nesse ano, mais de 147,3 milhões de pessoas, os que rejeitam o processo eleitoral saltariam de 32,4 para 55,9 milhões nas urnas; 23,5 milhões a mais.
Considerando que Lula tem 54,5 milhões de votos, quase metade do seu eleitorado rejeitaria o processo se o golpe da impugnação da sua candidatura for bem-sucedido. Onde iria parar a outra metade?
Marina Silva seria a maior beneficiada. Teria 8,8 milhões de votos a mais, pouco mais de 16% dos votos de Lula, seguida por Ciro, que ganharia 5,9 milhões de eleitores (quase 11% dos que votariam no ex-presidente). Outros 3 milhões de votantes diriam: “tanto faz, PT, PSDB”, e votariam em Geraldo Alckmin, que amealharia 5% dos votos do criador do Bolsa Família.
O mais espantoso, talvez, seria que não só parte dos votos petistas se tornariam tucanos, como uma parte quase idêntica (2,9 milhões de votos) iriam da candidatura mais à esquerda nas eleições para a que, pelo menos na aparência, é a mais direitista. Jair Bolsonaro veria seus votos crescerem tanto quanto os de Alckmin, indo de 26,5 para 29,4 milhões de eleitores, ganhando também quase 3 milhões dos que votariam em Lula.
Ou, por acaso, teríamos que acreditar que os votos seriam arranjados de maneira diferente nos dois cenários? Por exemplo: com Lula, a pessoa A votaria em Marina; sem ele, a mesma pessoa votaria em Ciro, ou Bolsonaro, mas não em Marina. Não faz o menor sentido.
Isso tudo, ainda por cima, com uma margem de erro de 2,2% e um “índice de confiabilidade” de 95% (que, segundo os que colaram mais esse “selo de qualidade” no seu próprio trabalho, significaria dizer quer há 95% de chances desse resultado se traduzir fielmente nas urnas em 7 de outubro).
Dos dados que foram apresentados, um que é crucial não foi analisado. O que a imprensa burguesa não diz é que, se Lula concorrer, o segundo lugar pertence aos votos brancos e nulos (indecisos) e que, sem ele na cédula eletrônica, o verdadeiro vencedor é a rejeição às eleições.
Resumindo, se Lula comparece às eleições, é o favorito, de longe. Se não, seu voto será dividido da seguinte maneira: cerca de metade votaria nulo ou não votaria, os votos restantes iriam para os abutres de centro-direita (Marina e Ciro) e para os candidatos de direita (Alckmin e Bolsonaro). Acredite, se quiser.
Mas os autores dessa verdadeira fraude precisariam mesmo responder à seguinte questão: o povo não sabe mesmo que Lula e Lula são a mesma pessoa?