Indo de encontro à completa efetivação dos direitos das mulheres, a maioria da população britânica mostrou numa pesquisa recente, realizada pela YouGov, que é à favor de manter a legalização do aborto no país. Na Grã-Bretanha, a legislação permite a realização do aborto em até 24 semanas e até depois em alguns casos mais específicos. Lá, a discussão não parece girar em torno de julgamentos morais, mas, sim, em torno da saúde das mulheres e o direito ao corpo.
Mesmo com diversos países avançando cada vez mais sobre a descriminalização do aborto, o Brasil vem na total contramão de percepção da seriedade e urgência do assunto. Aqui, o tema é tratado pelos golpistas à base de muito julgamento moral e religioso, mesmo o país sendo laico.
A legislação brasileira permite o aborto em somente três casos, gravidez decorrente de estupro, risco de vida à mãe ou anencefalia do feto. Mas mesmo nesses casos que deveriam ser garantidos pela lei, é expressiva a dificuldade que as mulheres encontram.
Dos 76 hospitais que o governo indica para o aborto legal, somente 43% deles confirmam que prestam esse serviço. Muitos, inclusive, exigem coisas que nem estão na legislação, como boletim de ocorrência ou corpo de delito, obrigando a mulher a passar pelo constrangimento e humilhação de ter sua palavra sendo contestada e seu direito sendo negado.
No Brasil, o aborto é a quarta causa de morte materna, a cada ano cerca de 250 mil mulheres são hospitalizadas em decorrência de complicações com o aborto induzido e a cada dois dias uma mulher morre nesse processo. O Estado, que deveria garantir a soberania da mulher em relação ao seu corpo, garantir a liberdade e a saúde, acaba por empurrar as mulheres para a morte.
Os argumentos que a direita golpista usa são todos muito falaciosos. Afirmam, por exemplo, que o aborto legalizado vai influenciar os adolescentes a não usarem proteção, que serão irresponsáveis. Contudo, adolescentes são responsáveis por pouco menos de 10% dos abortos, segundo uma pesquisa da Universidade de Brasília com a Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
A pesquisa também mostra que, em geral, mais de 80% das mulheres que abortam no Brasil já possuem filhos, a maioria é católica e está numa relação estável e a faixa etária fica entre 20 e 29 anos. Todos esses dados deveriam ser mais do que suficientes para o Estado criar políticas de saúde pública direcionadas à saúde da mulher e ao aborto seguro.
Mulheres de todas as classes sociais abortam, a diferença é que mulheres ricas conseguem passar pelo processo com maior segurança, já que podem pagar clínicas caras. As únicas perseguidas criminalmente e que mais sofrem nesse processo são as mulheres pobres, tendo que recorrer a métodos completamente inseguros, como clínicas sem infraestrutura adequada, remédios falsos ou outras formas mais dolorosas.
É dever do Estado garantir que a mulher possa abortar em qualquer circunstância que achar necessária, assim como garantir a existência de clínicas e hospitais públicos que prestem esse serviço sem a enxurrada de burocracias. A discussão sobre aborto deve avançar baseada em dados científicos, dentro do âmbito da saúde pública, não em moralidades e preceitos religiosos, como querem os golpistas que tomaram de assalto o Estado.
