Na última quarta (dia 2), o governo peruano anunciou que considera que não tem validade a renúncia apresentada pela vice-presidente Mercedes Aráoz, na véspera, em meio à crise institucional que toma conta daquele país.
Segundo declaração à imprensa local do primeiro-ministro peruano, Vicente Zeballos, a desconsideração se deveria ao fato de que Aráoz apresentou sua demissão para o Parlamento que a nomeou “presidente interina” e que, na véspera, havia sido dissolvido pelo presidente da República e chefe de Estado, Martín Vizcarra (ao centro, na foto). Para Zeballos, ela continua sendo vice-presidente do Peru. Há 27 anos, o Congresso não era dissolvido no País.
Durante algumas horas, o Peru chegou a ter dois presidentes da República. Uma situação que levou à OEA (Organização dos Estados Americanos), a se pronunciar no sentido de que a Suprema Corte do País deveria resolver o impasse, tornando evidente a divisão não apenas da burguesia peruana, mas de todo o continente e do imperialismo norte-americano diante da crise.
No documento de sua renuncia – encaminhado ao presidente do Parlamento, Pedro Olaechea -, Aráoz, se pronunciou pela antecipação das eleições no País e destacou o “rompimento da ordem constitucional no Peru”.
A crise no país visível a todo mundo com os acontecimentos dessa semana, expõe o enfrentamento entre burguesas lideradas pelo presidente Martín Vizcarra e a oposição dominado pelos fujimoristas, eclodiu em torno da disputa sobre a nomeação de juízes do Tribunal Constitucional.
Com apoio do Exército e da Policia, o governo, depois de fechar o Parlamento, convocou eleições legislativas para o próximo dia 26 de janeiro e tenta colocar em funcionamento uma Comissão Permanente do Parlamento, para dar a aparência de normalidade ao funcionamento ditatorial adotado.
As contradições no interior da burguesia e da direita, levaram a um confronto as instituições do Estado burguês, aprofundando a instabilidade do regime, que avança no caminho da sua desintegração.
A crise atual é a continuidade da ação “lava jatista” levada adiante no Peru que, em 2016, provocou a renúncia do presidente eleito Pedro Kuczynski, diante de acusações de corrupção, e à posse do seu vice, o atual presidente.
Em outras palavras, a crise no Peru, é um produto direto dos golpes de Estado impulsionados pelo imperialismo mundial, principalmente o norte-americano, em nosso Continente. Particularmente, é um subproduto do golpe no Brasil, uma vez que a operação golpista Lava Jato – comandada pelo Departamento de Estado dos EUA -, estendeu seus tentáculos por vários países da região. Governado pela direita e com uma economia frágil, o Peru foi um alvo fácil dessa operação.
No país vizinho, formou-se uma “Lava Jato peruana”, uma máquina de perseguição a determinados setores sem vínculos mais profundos com o imperialismo norte-americano – neste momento – sobre o velho pretexto do “combate à corrupção”, o que vem causando uma demolição em todo o regime político peruano, atingindo praticamente todos os partidos e políticos tradicionais do país.
Dentre outros foram alvos dos conhecidos processos jurídicos “lavajatistas” contra a corrupção, Ollanta Humula, do Partido Nacionalista Peruano, que o governou o país de 2011 a 2016, Alan García, do APRA, que cumpriu dois mandatos na presidência (1985-1990 e 2006-2011), e Pedro Pablo Kuczynski, do Peruanos por el Kambio (PPK), que ficou no cargo de 2016 a 2018 — todos e terminaram ou presos (Humula e Kuczynski), ou cometendo suicídio (García), ou renunciando à presidência ( Kuczynski). Keiko Fujimori, filha ex-presidente “neoliberal” Alberto Fujimori (o FHC do Peru) e líder do partido Força Popular, também foi atingida pela operação e terminou presa.
O pivô dessa crise foram as denuncias do pagamento de propina a esses e outros políticos pela, então, maior empreiteira brasileira, a Odebrecht que admitiu, em 2016, subornos de US$ 29 milhões, cerca de R$ 120 milhões, às autoridades peruanas entre 2005 e 2014.
O que se destaca no Peru é a ausência, por hora, de uma alternativa política própria dos trabalhadores diante da crise que precisa ser construída com independência das duas alas da burguesias, totalmente impotentes diante do imperialismo golpista.