A juíza Inês Marchalek Zarpelon da 1ª Vara Criminal de Curitiba citou repetidamente a cor da pele de um homem negro ao proferir uma sentença.
A juíza condenava sete pessoas por organização criminosa e na sentença justificava que o jovem Natan Viera da Paz, de 42 anos, integrava um grupo que praticava assaltos no Paraná. Como meio de embasar seu entendimento, ela afirmou que o réu é “seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça”.
A sentença foi proferida em junho, mas o caso veio a público depois; porque a advogada de Natan publicou nas redes sociais, com autorização do seu cliente, um dos trechos da decisão.
O homem foi sentenciado à prisão por 14 anos. A sentença inclui os crimes de roubo, furto e o pertencimento a uma organização criminosa.
Apenas pelo crime de organização criminosa, o homem foi condenado a três anos e sete meses de prisão e, segundo o texto, a pena foi elevada por causa da “conduta social” do réu.
No mesmo documento, a juíza escreveu que Natan é réu primário e que “nada se sabe” da sua “conduta social”.
A juíza Inês Marchalek Zarpelon mencionou três vezes a COR DA PELE do acusado como justificativa para imposição de sua pena.
“Ela aumentou em 7 meses a sentença referente à organização criminosa, fixando a pena em 3 anos e 7 meses. Ela justifica esse aumento dos 3 anos iniciais da pena por ele ser negro. Ela também usou a raça como justificativa em outros dois momentos: quando ela falou do roubo e do furto. No total, a condenação ficou em 14 anos” explica a advogada de Natan, Thayse Pozzobon.
No local da sentença que são citados os dados pessoais de Natan, ele é identificado como ‘Neguinho’.
O poder judiciário é arcaico e sua única função na verdade é garantir a supremacia da classe burguesa decadente às custas da exploração da classe operária. Por isso o judiciário como um todo é, em sua gênese racista; pois ao representar os interesses da classe dominante, da burguesia, precisa assegurar a desigualdade de classes. O que sempre o levou a impulsionar o racismo.
O caso de Natan Viera da Paz tem destaque pela franqueza absolutamente tranquila com que a juíza manda registrar nos autos o caráter racista de sua própria sentença, mas não significa que milhares de outras sentenças judiciais, proferidas por centenas de outros juízes, não sejam tomadas com base no mesmo critério.
O caso do catador de recicláveis Rafael Braga, por exemplo, ganhou notoriedade por escancarar muito bem o modus operandi do sistema penal brasileiro. Nele ficou evidenciado que Rafael foi condenado por um crime que não cometeu.
Em 2013, próximo a uma manifestação na Av. Presidente Vargas, Rafael foi detido pela PM em seguida acusado de porte de explosivos. De fato, Rafael tinha uma sacola com duas garrafas plásticas lacradas: uma de desinfetante Pinho Sol e outra de água sanitária. antes de ser levado pela viatura, Rafael foi brutalmente espancado pela PM.
Na delegacia, as garrafas apareceram abertas, com um pano no gargalo e, em uma delas, o desinfetante foi substituído por álcool. Ficou obvio que a polícia tentou forjar um flagrante contra Rafael. Porém, esqueceu que um coquetel Molotov só pode ser acionado como explosivo, quando feito com garrafa de vidro. Pois apenas assim a garrafa pode ser quebrada e espalhar seu conteúdo de combustível em chamas. Mesmo com essa evidência, Rafael foi condenando a 5 anos de prisão em regime fechado.
Rafael Braga foi transferido para o presídio de Bangu 5. No Complexo Penitenciário de Gericinó. Teve que dividir uma cela com outras setenta pessoas com direito apenas a duas horas de sol por dia. Lá recebia chutes e socos de agentes penitenciários sem motivo ou quando não os chamava de “senhor”. Quando foi filmado recentemente estava sem os dentes incisivos e havia contraído tuberculose.
O trecho de outra condenação de 2016 a juíza Lissandra Reis Ceccon, da 5ª Vara Criminal de Campinas cita a cor da pele, olhos e cabelos claros do acusado para determinar que ele NÃO seria “facilmente confundido” pela testemunha do crime , pois “Vale notar que o réu NÃO possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros, não estando sujeito a ser facilmente confundido”, apontou a juíza.
O poder judiciário julga pela raça e pela classe à qual a pessoa pertence; nunca jamais pelos crimes que eventualmente tenha cometido.