O STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) emitiu nesta segunda-feira (19) uma recomendação, endereçada a clubes e federações, determinando que “os árbitros, auxiliares e delegados das partidas relatem na súmula e/ou documentos oficiais dos jogos a ocorrência de manifestações preconceituosas e de injúria em decorrência de opção sexual por torcedores ou partícipes das competições”.
Com essa medida, o órgão indica que atitudes homofóbicas em estádios, como o costumeiro grito de “bicha” nos tiros de meta, são passíveis de punição e podem acarretar aos clubes a perda de três pontos nas competições.
Essa determinação da justiça desportiva brasileira vem na esteira da recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que equiparou a homofobia e a transfobia ao crime de racismo, e da política posta em prática nos últimos anos pela FIFA, que tem incentivado seus filiados a punirem manifestações de preconceito. A própria CBF (Confederação Brasileira de Futebol), diga-se de passagem, já foi multada cinco vezes por conta de gritos homofóbicos em jogos da seleção brasileira no Brasil.
A luta contra a homofobia nos estádios, levada a cabo por entidades que não têm absolutamente nada a contribuir com essa luta, é mais um pretexto — moralmente elevado — para reprimir a livre manifestação dos torcedores, para ferir a sua liberdade de expressão, e nada mais. Medidas dessa natureza, de caráter repressivo e punitivista, não chegam nem perto de tocar nas raízes que determinam a opressão dos setores LGBTs. Ao contrário, elas só contribuem para fortalecer os mecanismos de repressão, violência e controle que as classes dominantes usam contra os pobres, negros e explorados em geral.
Além disso, a possibilidade de punição aos clubes é de uma arbitrariedade sem tamanho. Como responsabilizar associações esportivas pelo que é dito por suas torcidas, que são muitas vezes integradas por milhões pessoas, de diferentes origens e tendências? Como saber se o “comportamento ilícito” é de autoria de torcedores de um time A ou B, já que não é raro a mistura e a infiltração no seio de torcidas adversárias. Exige-se dos clubes algo que eles não podem cumprir, atribuindo-lhes um papel que lhe é impossível exercer: controlar os pensamentos e as formas de expressão de seus torcedores.
Depois da perseguição às torcidas organizadas, depois do aumento (sempre crescente) da repressão policial, depois da proibição das bandeiras e instrumentos musicais, depois da imposição da denominada “torcida única”, depois da introdução do árbitro de vídeo (VAR) nos jogos, temos a abertura de mais um campo para a intervenção externa — a cargo das confederações, federações, comissões de arbitragem, tribunais desportivos etc. — no futebol e mais uma frente de ataque contra os direitos democráticos dos torcedores.
É preciso ter em mente que a censura, as punições de todo tipo, a criminalização de certas condutas, o encarceramento em massa e a repressão policial não constituem caminhos capazes de levar a luta contra a opressão dos LGBTs à vitória. Somente a auto-organização, a formação de comitês de autodefesa, a luta contra a direita e a extrema-direita e, portanto, contra o governo Bolsonaro, podem fazer a luta dos LGBTs e dos setores oprimidos em geral avançar.