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Nasceu em Alagoas em 1936

Hermeto Pascoal: 84 anos de um dos maiores músicos brasileiros

O alagoano Hermeto Pascoal é um dos mais prestigiados músicos brasileiros, dominando com perfeição dezenas de instrumentos e com uma vasta obra de milhares de composições

Hermeto Pascoal é uma unanimidade nacional. Poucos deixam de reconhecer sua importância dentro da música brasileira, mas ao mesmo tempo muito poucos conhecem sua música, tida por muitos como complexa demais, caótica ou mesmo incompreensível. O próprio Hermeto rejeita todos esses rótulos. Músico autodidata, sempre ouviu música em todos os sons da natureza e diz que sua música é 100% intuitiva e espontanea. Embora sua música tenha se tornado cada vez mais complexa Hermeto nunca esqueceu suas origens na música nordestina e especialmente do forró, que volta e meia revisita.

Ao longo de uma carreira de mais de 60 anos nunca se comprometeu com os aspectos comerciais das gravadoras. Baseado em seu enorme prestígio no meio musical lançou dezenas de discos, quase todos por gravadoras independentes. Trabalhou ao lado dos maiores nomes da música mundial, de Tom Jobim, Elis Regina, Egberto Gismonti e Miles Davis a Sivuca, Dominguinhos, Taiguara, Airto Moreira, Edu Lobo, Eduardo Gudim e Geraldo Vandré.

Seus primeiros dias

Hermeto Pascoal nasceu em 22 de junho de 1936 no sítio Olho d’Águra em Lagoa da Canoa no município de Arapiraca no estado de Alagoas, no meio do mato, sem luz elétrica e filho de lavradores Dona Divina de Oliveira e Pascoal José da Costa. Nasceu albino e “de olho virado”, segundo Dona Divina, um problema nos olhos associado ao albinismo. Mas o garoto nasceu danado de esperto também, com um dom natural para a música. E como descobriu anos mais tarde com ouvido absoluto, um fenômeno auditivo raro, que se caracteriza pela habilidade de uma pessoa identificar notas musicais sem nenhuma referência.

Com sete anos começou a tocar o fole de oito baixos, uma espécie de sanfona sem teclado, apenas com botões. Dos talos da mamona fazia os pifes (espécie de flauta), alem de aprender a tocar tambem o pandeiro. Aprendeu tudo sozinho, sem nenhum estudo musical formal. Com 11 anos formou uma dupla, Os Galegos do Pascoal, com seu irmão Zé Neto, tambem albino, com ambos revezando no fole e no pandeiro.

Sem aprendizado musical formal

A dupla se mudou para o Recife em 1950 onde foram contratados pela rádio Tamandaré. Lá eles conheceram o sanfoneiro Sivuca. Junto se tornaram o trio O Mundo Pegando Fogo, referencia à cor rosada e cabelos avermelhados dos tres albinos, um nome imposto pelo produtor de rádio Amarílio Niceias. Infelizmente o trio durou pouco e Hermeto foi trabalhar em uma rádio em Caruaru. Lá conheceu o maestro Giusepe Mastroianni que o aconselhou a procurar a escola de música do maestro Laranjeiras. Só que este disse que ele não poderia aprender música lá por causa do seu problema de visão, ao que respondeu: “maestro, eu não preciso das aulas para aprender música. Música eu já sei. Vim até aqui aprender como é que se escreve a música!”. Um amigo, Zé Gomes, comprou para Hermeto um livro, o Método para Acordeon do carioca Alencar Terra onde viu, pela primeira vez, um oceano desconhecido de símbolos musicais. Com isso desistiu de aprender teoria.

Aos 19 anos voltou a Recife onde passou a tocar sanfona no regional de choro da Rádio Jornal do Commercio. Lá assistiu a muitas apresentações musicais, em estilos muitos diferentes do que conhecia. Ao lado do amigo guitarrista Heraldo do Monte começou a tocar na Boate Delfim Verde. Lá tem suas primeiras apresentações tocando o piano, aprendendo a tocar jazz, “para americano ouvir, marinheiros da base militar americana”.

Por essa época tambem começou a compor e a tocar em estilos diversos: rock’n’roll, bossa nova, samba jazz. Atraído pela efervescencia musical da época mudou-se para o Rio de Janeiro em 1958 para tocar sanfona com Pernambucano do Pandeiro nas rádios. Presenciou o auge da bossa nova, a presença da música nordestina, do samba, alem do surgimento da jovem guarda e depois as canções de protesto e a Tropicália. Não se alinhou a nenhum desses movimentos, mas absorveu elementos de todos eles. Hermeto fez sua estréia em disco participando de tres LPs de Pernambuco do Pandeiro e seu Regional, tocando sanfona: “No Meu Brasil é Assim” (1954), “Batucando No Morro” (1954) e “No Arraial de Santo Antonio” (1958).

Em São Paulo nos anos 60

Em 1961 se mudou para São Paulo. Em 1964 gravou outro disco, desta vez com o Conjunto Som 4. O disco, tambem chamado de “Conjunto Som 4” trazia um repertório instrumental de interpretações da bossa nova. Era formado por Hermeto (piano e flauta), Papudinho (trompete), Azeitona (baixo) e Edilson (bateria).

Em 1964 fundou o Sambrasa Trio com Humberto Clayber no baixo e Airto Moreira na bateria. O grupo lançou um LP no ano seguinte chamado “Em Som Maior” onde Hermeto toca piano e flauta. Esse disco inclui sua composição “Coalhada”.

Com o florescimento dos grandes festivais de música nas TVs surgiu, em 1966, o Quarteto Novo, um grupo formado inicialmente para acompanhar o cantor Geraldo Vandré. Eles eram Hermeto (piano e flauta), Airto Moreira (bateria e percussão), Théo de Barros (baixo e violão) e Heraldo do Monte (guitarra). O grupo se caracterizou pela sua música de sabor bem brasileiro com temperos jazzísticos, trazendo elementos inovadores à música instrumental da época. O Quarteto Novo fez os arranjos e apresentação das músicas “Ponteio” de Edu Lobo e de “Disparada” de Geraldo Vandré e Théo de Barros.

Lançaram um único LP, “Quarteto Novo”, em 1967, que incluiu as músicas “O Ovo” e “Canto Geral”, ambas escritas por Hermeto com Geraldo Vandré.

Os anos na América

O grupo acabou pouco tempo depois com a partida de Airto Moreira para os Estados Unidos. Em 1969 participou de outro disco célebre da música brasileira, o único LP do Brazilian Octopus”. Nesse grupo tocou sua flauta ao lado de feras como Lanny Gordin (guitarra), Olmir “Alemão” Stocker (guitarra e violão), Cido Bianchi (piano) e Carlos Alberto (flauta e saxofone). Nesse mesmo ano viajou para os Estados Unidos após receber notícias otimistas de Airto Moreira e de sua esposa, a cantora Flora Purim. Através de Airto Hermeto conheceu Miles Davis. Em um encontro dos dois Hermeto levou um violão e começou a tocar suas composições. Como ele relata: “cheguei lá, ele se sentou, toquei um monte de músicas cantando e solando…quando acabei de tocar ele chegou e disse: que pena que eu não posso gravar todas as suas músicas!. Aí eu falei: mas como voce sabe que eu quero te dar todas pra gravar? Eu vim tambem para gravar aqui. Eu vou escolher as que eu quero te dar!”. A partir daí criou-se uma amizade e uma simpatia geral entre os dois.

Miles acabou gravando tres das composições de Hermeto, “Little Church”, “Nem Um Talvez” e “Selim”, que sairam no seu LP “Live-Evil” de 1971, um dos mais elogiados trabalhos de Miles, repleto de outras grandes estrelas do jazz como Herbie Hancock, Chick Corea, John McLaughlin, Hubert Laws, Ron Carter e Wayne Shorter. A partir daí o prestígio internacional de Hermeto alcançou o auge. Depois disso trabalhou com outros grandes nomes como Barney Kessel, Dizzy Gillespie, Stan Getz, Joe Pass e muitos outros. Na mesma época participou do primeiro LP solo de Airto, “Natural Feelings” e no ano seguinte do segundo disco, “Seeds On The Ground – The Natural Sounds Of Airto”.

Ainda em 1970 lançou seu primeiro disco solo, “Hermeto”, que foi gravado nos Estados Unidos com a presença de Flora Purim e Airto Moreira e mais um enorme time de músicos americanos incluindo o baixista Ron Carter, Hubert Laws, Joe Farrell e Garnet Brown.

Em solo brasileiro, de novo

De volta ao Brasil em 1973 lança o seu exuberante LP “A Música Livre de Hermeto Pascoal”, uma inovadora mistura de jazz, música nordestina e música concreta. Esse disco trouxe uma releitura extremamente radical de “Asa Branca”, alem de “Sereiarei” onde fez uso de sons de porcos, galinhas, patos e outros animais e “Gaio da Roseira”, música escrita por ele e sua mãe, Dona Divina. Nesse disco estão presentes alguns do colaboradores mais constantes do Bruxo como Nenê (bateria, piano), Mazinho (sax alto e tenor), Hamleto (flauta), Bola (flauta), Alberto (baixo) e Anunciação (bateria).

Os discos seguintes, “Slave Mass” (1977),  “Zabumbê-bum-á” (1979) e “Ao Vivo Montreaux Jazz” (1979) consolidam seu prestígio como um dos maiores nomes da música instrumental brasileira, ao lado de Egberto Gismonti. Nos anos seguintes continua a compor incessantemente. Conta-se que seriam mais de 4.000 composições até 2007. Sua produção fonográfica tambem é enorme, quase sempre discos lançados por pequenas gravadoras, com distribuição restrita.

Calendário do Som

Um dos feitos mais extraordinários do músico é, sem dúvida, o seu “Calendário do Som”. Entre os dias 23 de junho de 1996 e 22 de junho de 1997 registrou uma composição por dia, onde quer que estivesse. Essas 366 músicas (incluindo uma para um ano bissexto) foram reunidas em um livro de 414 páginas lançado em 1999. O objetivo era homenagear os aniversariantes. Em cada música Hermeto deixou um comentário afetuoso, seja para amigos ou para o seu clube de futebol, o Fluminense.

Atualmente Hermeto continua a pleno vapor. Estaria aí se apresentando em algum palco não fosse o Covid-19. Mas sua agenda estava cheia de apresentações no Brasil e no exterior com várias formações: performances solo, com o seu grupo, em dupla com a cantora Aline Morena e à frente de big bands e orquestras sinfonicas.

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