Na semana passada, Fernando Haddad foi entrevistado pela jornalista Míriam Leitão, reconhecida agente do chamado PIG (Partido da Imprensa Golpista). O programa foi exibido pela Globo News, canal pago do Grupo Globo. Entre outras coisas, Haddad afirmou que “o governo [Bolsonaro] ainda não disse a que veio”, e que isso é o que “preocupa”.
Segundo Haddad, o problema do governo é que “não sabemos ainda o que é o governo Bolsonaro”. Pois “o governo não se apresentou com um programa consistente” ainda. Nas palavras de Haddad, o governo Bolsonaro teria que apresentar um programa do que fazer em diversas áreas, como saúde, educação e meio ambiente.
Essa perspectiva sobre o governo Bolsonaro é perigosa para a esquerda e os trabalhadores. Enquanto o governo “ainda não mostrou a que veio”, Bolsonaro já desferiu uma série muita extensa de ataques às organizações operárias e aos partidos de esquerda. Agora mesmo a Polícia Federal busca relacionar o PT aos supostos “hackers” que teriam vazado conversas privadas dos elementos da Lava Jato para o sítio The Intercept Brasil, em uma tentativa de envolver o partido em acusações de crime contra a segurança nacional, estratégia típica da ditadura militar.
No campo os assassinatos de lideranças da luta pela terra aumentaram depois do golpe de 2016, e Bolsonaro tende a intensificar essa ofensiva contra os trabalhadores sem terra. Contra os sindicatos, Bolsonaro cortou a fonte de sustento dessas entidades dos trabalhadores. Com a cláusula de barreira, os pequenos partidos da esquerda ficaram de fora do fundo partidário que faz a festa dos partidos dos capitalistas. Todas essas medidas apontam no sentido de quebrar as organizações que a população conseguiu criar e assim anular a resistência à implementação de um programa neoliberal por Bolsonaro.
E esse programa está sendo implementado a pleno vapor, ao contrário do que Haddad dá a entender com essas declarações para Míriam Leitão. Recentemente a Petrobras vendeu sua maior subsidiária, a BR Distribuidora, passando o controle sobre a distribuição de combustíveis no país para empresas estrangeiras. O plano é privatizar muito mais, liquidando tudo que por acaso tenha sobrevivido aos anos FHC. Correios, bancos públicos e muitas outras partes do patrimônio público estão na mira para serem entregues a troco de nada.
Diante desse cenário, não faz sentido falar em esperar para ver “a que veio o governo”. Isso já está suficientemente demonstrado. É preciso enfrentar esse governo e se mobilizar pelo seu fim. A continuidade do governo ameaça devastar o país. É preciso reagir a essa demolição generalizada, e o papel das direções de grandes partidos de esquerda deveria ser justamente chamar o povo à mobilização em torno de uma política clara nesse sentido. A tendência à mobilização está presente e já ficou demonstrada nos atos de maio e junho.
Haddad foi candidato do PT à presidência em 2018 no lugar de Lula e desde então tornou-se um representante informal de seu partido. E nessa condição, tem ganhado bastante espaço na imprensa burguesa para propagar a política de uma determinada ala do PT no momento em que se aproxima o congresso do partido. Essas considerações sobre o governo mostram por quê. A política dessa ala dentro do PT vai em direção a esperar para ver “a que veio” o governo Bolsonaro. De preferência até 2022, como o mesmo Haddad deu a entender durante outra entrevista, com Marcelo Tas, na TV Cultura.
Não é possível esperar até 2022. Essa perspectiva eleitoral e parlamentar de oposição ao governo golpista pode tornar-se um desastre para toda a população brasileira. É preciso reagir aos golpistas para impedir que eles continuem o programa neoliberal de destruição do Brasil.