Uma desocupação a balas e bombas foi realizada na manhã da última quinta-feira (29) por forças policiais na cidade de Guernica, província de Buenos Aires, na Argentina. A ocupação era a maior surgida durante a pandemia e chegou a ter cerca de 2.000 famílias.
As pessoas que viviam em barracos improvisados foram tiradas à força por 4.000 policiais armados até os dentes. Para fazer cumprir uma ordem judicial que exigia a proteção da propriedade privada às custas do povo pobre e sem-teto, os barracos de paus e plástico foram queimados enquanto centenas de pessoas corriam desesperadas. Moradores contam que os policiais chegaram de surpresa, às 4h da manhã, e queimaram tudo. Muitos perderam os poucos itens que possuíam dentro das moradias como colchões, documentos e roupas.
A ocupação, e a esperança daquelas pessoas pobres, durava desde julho e as propostas apresentadas pelos movimentos sociais que os apoiavam foram todas rejeitadas. O governo provincial ofereceu dinheiro em troca do despejo, tentando comprar a disposição de luta das pessoas que se tornaram moradores daquela localidade. Houve luta, com paus e pedras, vários moradores responderam às balas de borracha e bombas da polícia, porém, antes das 8h da manhã o ministro de Segurança da província de Buenos Aires, Sergio Verni, afirmou que “já está tudo ocupado”.
Relatos dão conta de que cerca de 600 famílias aceitaram o dinheiro do governo e saíram no período anterior à desocupação, porém, várias dessas famílias retornaram ao terreno relatando que os acordos não foram cumpridos. O governo deveria dar material de construção e dinheiro de aluguel.
Policiais tiraram foto em que aparecem satisfeitos após o ato de violência covarde contra as famílias:
O governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, do Frente de Todos, – coligação que apoia o presidente Alberto Fernandez e a vice Cristina Kirchner, – disse que o despejo “foi feito com todo o cuidado possível para evitar lesões e situações de violência”. Kicillof disse que o que fez foi apenas cumprir ordem judicial, que é falsa a notícia de que o governo ofereceu dinheiro aos ocupantes do terreno. Há registro de, pelo menos, 37 presos e nove policiais com ferimentos leves.
A atitude do governo da província de Buenos Aires, aliado do governo do presidente Alberto Fernandez, irá fatalmente enfraquecer a esquerda, haja vista a enorme desmoralização sofrida perante a população com esse tipo de ação repressiva. A direita irá utilizar o exemplo desses atos praticados pela esquerda para contrapor e se colocar como opção demagogicamente, claro, na próxima oportunidade.
Alberto Fernandez declarou na manhã desta sexta-feira (30) que o despejo da propriedade de Guernica e o caso do acampamento da família Etchevehere “foram resolvidos respeitando o jogo das instituições que a República impõe”. No Twitter, ainda afirmou que esse tipo de conflito é “resolvido pelos governos provinciais”.
“A necessidade de uma determinada imprensa insinuar fissuras ou contradições políticas em um momento em que a Argentina exige o máximo do esforço conjunto não ajuda em nada a ação governamental”, disse Fernández.
Sobre o despejo brutal em Guernica o Presidente disse que o ocorrido “foi fruto de uma ação policial ordenada pela Justiça . “Antes havia um enorme trabalho de reassentamento de famílias realizado pelo ministro Larroque”, acrescentou.
Em resumo, Fernandez apoiou o despejo das famílias em Guernica e “lavou as mãos” sobre a força empregada na ação pelas forças policiais. O que vemos aqui é uma guinada à direita do governo Fernandez, escolhendo métodos direitistas para “resolver institucionalmente” os problemas do povo, ao passo em que se distancia de sua base popular.
Ao adotar procedimentos direitistas contra a população, este governo de esquerda fica fragilizado e se tornará, rapidamente, alvo da direita. É esse o expediente utilizado pela direita em todos os golpes de estado na América Latina. Portanto, não será difícil assistirmos ao colapso do governo Fernandez caso mantenha a política repressiva e direitista.
Guernica: la policía bonaerense se lleva detenidas personas a las que acaba de dejar sin un lugar para vivir.
Video: cobertura colaborativa de @Laretaguardia, @Red__Accion, @MatanzaViva y más medios autogestivos. pic.twitter.com/5Cb7ZQ05OB— Revista Cítrica (@revistacitrica) October 29, 2020