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"Cantor rancor"

Gonzaguinha, a voz que a ditadura não conseguiu calar

Gonzaguinha faria 75 anos se não tivesse morrido em um acidente de carro em 1991. Sua obra refletiu sua luta contra a ditadura militar.

Gonzaguinha foi um compositor prolífico. Na maior parte das vezes compunha sozinho, já que era um talentoso músico e também um letrista repleto de recursos. Recursos esses que ele usou como ninguém, especialmente no começo de sua carreira, ao confundir os seus inimigos, os censores, de modo que eles nunca tivessem certeza da mensagem que ele estava passando. Tanto é assim que das 72 músicas que ele submeteu à aprovação do DOPS, 54 foram censuradas.

O filho do Rei do Baião

Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior, o Gonzaguinha, nasceu em 22 de setembro de 1945 no Rio de Janeiro. Era filho registrado do Rei do Baião, Luiz Gonzaga e de Odaléia Guedes dos Santos.

Luiz Gonzaga conheceu Léia, como era conhecida Odaléia, em 1945 em uma casa de shows no centro do Rio de Janeiro. Ela era cantora de samba e estava grávida quando conheceu Gonzagão. Foram morar juntos em uma casa alugada e ele assumiu a paternidade da criança, dando-lhe seu nome. No começo o casal tinha uma boa relação, mas deteriorou-se em pouco tempo, levando Léia a sair da casa com o filho após dois anos de convivência. Léia voltou a trabalhar como cantora e dançarina, criando sozinha a criança, com alguma ajuda financeira de Gonzagão.

Léia morreu aos 22 anos de tuberculose. Gonzagão se casou novamente em 1948 com Helena. Ele queria levar Gonzaguinha para morar com eles, mas Helena se recusou a ficar com a criança. Por isso Gonzagão entregou a criança para ser cuidada pelos padrinhos da criança, Leopoldina e Henrique Xavier Pinheiro, este último conhecido como Baiano do Violão, que ensinou Gonzaguinha a tocar o instrumento.

A infância de Gonzaguinha foi passada no Morro de São Carlos no bairro do Estácio. Apesar de ser pobre, é uma infância feliz para o garoto que considera os padrinhos os seus verdadeiros pais. Aos 14 anos Gonzaguinha compõe sua primeira música, “Lembranças da Primavera”, seguida, mais tarde, por outras como “Festa” e “From US Of Piaui”, todas elas mais tarde gravadas pelo seu pai. Por esta época contrai, pela primeira vez, tuberculose, uma doença que o afligiria outras vezes em sua vida e que matou sua mãe Léia.

Em 1951, aos 16 anos, foi forçado a ir morar com o pai no bairro de Cocotá, na ilha do Governador. Foram muitas brigas com o pai e com Helena. Por causa disso foi colocado em colégio internos, o que só aumentou a distância entre pai e filho. Só deixou o internato aos 18 anos, indo depois estudar economia na Universidade Candido Mendes. Paralelamente aos estudos universitários inicia sua carreira musical. Ele se formou em economia, mas nunca exerceu a profissão.

MAU – Movimento Artístico Universitário

Por volta de 1965 integra o MAU, Movimento Artístico Universitário, um grupo de artistas que se reunia na casa do psiquiatra Aluizio Porto Carreiro de Miranda. Aluizio, que foi instrumentista do Cassino da Urca na década de 40, costumava receber seus antigos companheiros, criando um ambiente que atraiu os novos artistas cariocas. Os principais nomes do MAU eram Ivan Lins, Aldir Blanc, Gonzaguinha, César Costa Filho, Sidney Mattos, Otávio Bonfá e muitos outros. O objetivo do MAU era unir os compositores universitário e deste modo facilitar a divulgação de suas obras. O grupo procurava mostrar uma unidade, a despeito das diferenças nos estilos musicais e nos discursos de seus vários integrantes.

O MAU teve um impulso com os festivais universitários promovidos pela TV Tupi. A primeira edição do festival, em 1968, premiou canções de Gonzaguinha, Ivan Lins e César Costa Filho. A segunda edição, em 1969, foi vencida por Gonzaguinha, com sua composição “O Trem”, uma toada de protesto que retratava o sofrimento dos trabalhadores, mas que recebeu uma vaia estrondosa quando anunciada como vencedora.

Com isto o MAU recebe uma grande exposição na imprensa, fazendo com que o grupo fosse contratado pela Rede Globo, que criou o programa “Som Livre Exportação” em 1971, na esperança de reviver movimentos musicais como a Tropicália. O programa teve uma vida curta, de apenas nove meses, com a emissora escolhendo promover apenas Ivan Lins, cuja música era mais comercial, mais acessível e de acordo com a política da empresa. Com isso há um racha no grupo e cada um toma sua própria direção. Apesar de tudo isso o MAU teve um papel para a expansão da música popular brasileira, apresentando alguns dos artistas mais importantes do futuro da MPB.

Luiz Gonzaga Jr.

Em 1973 lança o seu primeiro LP, “Luiz Gonzaga Jr.”, com todas as músicas compostas pelo autor. O disco incluiu a sua polemica composição “Comportamento Geral”, uma ácida crítica à ditadura no auge do AI-5.

“Você deve notar que não tem mais tutu
E dizer que não está preocupado
Você deve lutar pela cepa da feira
E dizer que está recompensado
Você deve estampar sempre um ar de alegria
E dizer: tudo tem melhorado
Você deve rezar pelo bem do patrão
E esquecer que está desempregado

Você merece, você merece
Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé
Se acabarem com teu Carnaval

Você deve aprender a baixar a cabeça
E dizer sempre: “Muito obrigado”
São palavras que ainda te deixam dizer
Por ser homem bem disciplinado
Deve pois só fazer pelo bem da Nação
Tudo aquilo que for ordenado
Pra ganhar um Fuscão no juízo final
E diploma de bem comportado” […]

A música foi apresentada no popular programa de televisão apresentado por Flávio Cavalcante no quadro chamado “Um Instante Maestro”. O júri do programa massacrou a música e ameaçou o autor. Um dos jurados chamou Gonzaguinha de terrorista e outro sugeriu sua deportação. Mas por vias tortas esta polemica trouxe a fama para o cantor. Em uma semana o compacto com a música vendeu 20 mil cópias e incomodou o DOPS, Departamento de Ordem Política e Social, órgão que tinha a função de censura. A música foi proibida de ser executada nas rádios e televisão, mas não a sua venda.

O LP tinha outras faixas desafiadoras da ordem vigente como “Moleque”, “Pois É, Seu Zé”, “Palavras” e “Página 13”. A faixa “A Felicidade Bate à sua Porta” representa um momento de alívio no clima de depressão geral do disco, uma música que foi depois regravada pelas Frenéticas.

No ano seguinte lança seu segundo LP, também chamado “Luiz Gonzaga Jr.”, contendo canções como “Meu Coração é um Pandeiro”, “Piada Infeliz” e “Galope”, além de regravar o clássico de seu pai, “Assum Preto”. Por esta época um jornalista chamou o cantor de “cantor rancor” por causa de suas músicas de temática combativa e pela sua fisionomia sempre fechada. Até o seu quarto usava como nome artístico Luiz Gonzaga Jr. Só a partir de seu quinto LP, “Moleque”, de 1977, é que assume o nome de Gonzaguinha.

Nestes primeiros anos seus embates com a censura são frequentes. Foram 54 canções censuradas e inúmeras convocações do DOPS para explicar os conteúdos de suas músicas. A partir do começo da abertura política a música de Gonzaguinha começa a mudar, intercalando suas canções mais politicamente engajadas com seu lado mais lírico e romântico. Lança, então, músicas como “Começaria Tudo Outra Vez”, “Grito de Alerta”, “Explode Coração”, O Que é O Que é” e “Lindo Lago do Amor”.

Reaproximação com Gonzagão

A partir de 1979 ele se reaproxima de Luiz Gonzaga. Apesar de discordar politicamente do filho, Gonzaga já havia gravado várias músicas do filho como “Matuto de Opinião” e “Boi Bumbá” (no LP “Quadrilhas e Marchinhas Juninas, 1965) e “Festa”, “Pobreza Por Pobreza”, “Erva Rasteira” e “Diz Que Vai Virar” (todas do LP “Canãa” de 1968).

Fazem uma série de shows pelo Brasil, além de comporem juntos. Este momento foi imortalizado no LP “A Vida do Viajante”, um disco duplo registrado nos estúdios da gravadora Odeon.

As canções de Gonzaguinha foram regravadas por inúmeros cantores da MPB como Elis Regina, Zizi Possi, Gal Costa, Fagner, Joanna, Maria Bethânia e Simone. No total Gonzaguinha lançou 16 LPs até 1990.

Em 29 de abril de 1991, aos 45 anos Gonzaguinha foi vítima de um acidente automobilístico. O carro que dirigia, um Monza, foi surpreendido por uma caminhonete que vinha na contramão. Ele viajava de Pato Branco, Paraná, para Foz de Iguaçu, de onde seguiria para Florianópolis de avião. Na época o cantor morava em Belo Horizonte em companhia de sua esposa Louise e a filha deles, Mariana.

E Gonzaguinha, artista engajado, depositava toda sua fé na juventude, aquela que fará a revolução, como se pode constatar nos versos de sua “E Vamos à Luta”:

“Eu acredito é na rapaziada
Que segue em frente e segura o rojão
Eu ponho fé é na fé da moçada
Que não foge da fera e enfrenta o leão

Eu vou à luta com essa juventude
Que não corre da raia a troco de nada
Eu vou no bloco dessa mocidade
Que não tá na saudade e constrói
A manhã desejada

Aquele que sabe que é negro o couro da gente
E segura a batida da vida o ano inteiro
Aquele que sabe o sufoco de um jogo tão duro
E apesar dos pesares, ainda se orgulha de ser brasileiro”

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