A situação política no Brasil equivale ao andamento de uma ópera tragicômica em três atos. Após o impeachment de Dilma Rousseff, ato 1, e a prisão do ex-presidente Lula da Silva, ato 2, ambos realizados à margem da letra da lei, o terceiro ato do golpe de estado no Brasil consiste em apagar os seus próprios vestígios, através de um movimento de “redemocratização”, via eleições em 2018. Eleições, naturalmente, controladas em favor de um candidato que se eleito seja capaz de aprofundar as reformas neoliberais, que retiram direitos dos trabalhadores. Reformas que, no fim das contas, são a razão de ser do próprio golpe, que se desenvolve no tempo.
Nesse momento de alta tensão da vida nacional, a direita tentar disfarçar o ataque à esquerda pela judicialização da justiça cometendo o lawfare, isto é, o uso político da lei. Tenta demonstrar na mídia, de forma canhestra, que o ataque ao partido dos trabalhadores é legalmente justificado, e que toda a tentativa de defesa dos políticos ameaçados pela Lava a jato seria esmorecer na “caça aos corruptos.” Trata-se da ideia de que não há uma verdadeira polarização política no país, mas apenas uma compartimentação entre o grupo dos “honestos” e dos “desonestos”.
Infelizmente, nem só a direita age mantendo as aparências de normalidade, em vista de “virar a página do golpe”, ou até “apagá-la”. Há também setores da esquerda que abdicam de lutar contra o avanço perigoso da direita, desviando seu olhar para as eleições de forma fantasiosa, como se a eleição de um ou outro deputado, ou até de uma alternativa presidencial a Lula (o que francamente improvável), bastasse para reverter a situação defensiva em que as forças progressistas atualmente se encontram. Pura fantasia. Os candidatos anunciados do PSOL e do PC do B, por exemplo, apresentam uma baixíssima intenção de voto nas pesquisas. Além do mais, é difícil crer que seria fácil governar com um congresso controlado pelo capital, sem fazer quaisquer acordos espúrios. Nesse sentido, abrir mão de Lula por essas candidaturas seria uma espécie de suicídio político.
Nesse momento, denegar a polarização política, recusando a ruptura real com o estado de direito promovida pelos agentes imperialistas do golpe, é legitimar a ordem existente, que no fundo é uma desordem, é autoritarismo. Nesse sentido, voltar as costas para luta em defesa de Lula propondo candidatos para concorrer nas eleições, como se nada de mal ou de estranho estivesse acontecendo, é a pior das capitulações.