“O PT, como principal partido de oposição, terá de repensar sua atuação se quiser sobreviver à travessia do deserto. Um bom começo seria passar a atuar tendo como objetivo primordial ajudar o País, e não, como de hábito, atender apenas aos interesses do partido. Para os padrões petistas, isso seria uma revolução copernicana – e ajudaria a desarmar os espíritos, o que talvez seja a tarefa mais importante da classe política a partir de hoje.”
(Estado de S. Paulo, na edição de 29/10/2018)
A imprensa burguesa pressiona a esquerda desde sempre e ao PT praticamente desde que seus fundadores o pensaram pela primeira vez. E antes do PT, nunca deixaram de pressionar as lideranças partidárias para que se conformassem aos projetos dos donos dos jornais. A história da Republica do Brasil passa pelos editoriais dos jornais.
O Partido dos Trabalhadores é alvo preferencial desde a abertura política, pois era o único partido com base social verdadeira quando de sua fundação. Mas o PDT, de Leonel Brizola sofreu também alguma pressão e resistência dos fabricantes da opinião publicada. Com curiosidade, um levantamento feito por Fernando Antônio Azevedo*, aponta que entre 1989 e 2014, nos jornais O Estado de S. Paulo, O Globo e a Folha de S. Paulo, cerca de 30% de todos os editorais desses jornais tinham como tema central o PT – a quase totalidade dos editorais tinha tom negativo.
Não custa lembrar que desde 1987, quando Lula se apresenta como candidato potencial para a primeira eleição presidencial pós-regime militar, a imprensa atuou fortemente para apresentar um partido dividido e confuso, radical e de difícil trato. Foi nesse período que os jornais incitaram uma parte do PT a fazer um ‘limpa’ e expulsar as tendências mais independentes e de silenciar os líderes mais rebeldes. Essa pressão nunca acabou e o Partido dos Trabalhadores parece que jamais entendeu o que estava em jogo.
Então, não é de espantar que um jornal como O Estado de S. Paulo, ciente da posição que o PT inevitavelmente vai assumir nessa nova configuração do Golpe, com a extrema-direita no Executivo, mas com um Legislativo ainda disforme e cheio de parlamentares sem experiência e personagens com egos infladíssimos, dirija-se ao partido para ‘lembrá-lo’ de sua ‘responsabilidade’ e, mais uma vez, de sua ‘obrigação’ de fazer uma auto-critica, quem sabe transformar-se de vez num partido de direita.
Do mesmo modo, personagens como Marcelo Rubens Paiva repetem a famigerada fórmula da autocritica ‘necessária’ e ‘fundamental’, decretando que “Aprenda, PT. O antipetismo o derrotou. Hora da autocrítica e pedido de desculpas.“. Pedido de desculpas? pelo quê? por existir? por ter um projeto (com o qual podemos não concordar, mas é um projeto fruto da tomada de decisão por um partido legitimado pelas urnas) próprio? porque não se conformava com o que desejavam os donos do Brasil? por combater a fome? pelas políticas sociais? ou pelo ‘mensalão’ inventado por Roberto Jefferson? desculpas do Lula para Moro? de que afinal trata tal pedido de desculpas?
Hoje também algumas matérias dão destaque a uma suposta indisposição de partidos de ‘esquerda’, como o PCdoB, PSB e PDT, de não aceitarem a liderança do PT em um virtual bloco de oposição ao desgoverno ilegitimo de Jair Bolsonaro. É mais pressão da imprensa chapa branca para levar o PT à direita, quem sabe para transformá-lo em um ‘colaborador’ de Bolsonaro, para que desista de qualquer plano de fazer uma oposição forte e irrenunciável ao fascismo que sombreia Bolsonaro e os que o sustentam.
A pressão, conforme vemos delineado em um editoral da Folha de S. Paulo, para que, quem sabe, o Partido dos Trabalhadores apoie uma política econômica ‘necessária’, ‘austera’, contra os trabalhadores e contra o patrimônio nacional. Se seguir as formulas que a imprensa apresenta para a sobrevivência do PT, veremos o partido de Lula apoiar a reforma da previdência de Temer ou uma versão piorada dela, a entrega do resto da Petrobrás, um Banco Central independente, privatização generalizada, a abertura ampla para o capital estrangeiro, entre outras pérolas neoliberais.
A estratégia é antiga: dividir para governar. Pressiona-se para evitar uma verdadeira Frente de Esquerda ou uma Frente Ampla, uma cisão entre partidos historicamente aliados, batendo sobre a ideia de que o PT só pensa em si próprio, que têm um ‘projeto de poder’, que ‘não abre mão da hegemonia’ etc. Depois, aposta-se numa divisão interna, insistindo nessa ladainha de “reconhecer os erros”, de se ter obrigação de ‘fazer a autocritica’. Foi nessa toada que o PSol nasceu e nela se sustenta um grupo petista com os pés no Sul do país.
O que se deseja, se não for possível destruir o partido, é retirar-lhe força, é levá-lo a fazer uma ‘oposição moderada’, ‘democrática’, ou seja, a ser uma espécie de caricatura de si mesmo. E há, dentro do partido, quem pense assim. Não vamos esquecer que personagens como o senador pernambucano Humberto Costa indicavam a necessidade de se ‘virar a página do Golpe’, abandonando a luta contra o golpe e afastando-se da ex-presidenta Dilma Rousseff. Outra ala pretende resistir e até mesmo há quem fale em um novo impeachment, reproduzindo as estratégias dos golpistas contra Dilma.
Que caminho vai tomar o Partido dos Trabalhadores? teremos que acompanhar com atenção e fazer uma pressão invertida, com os comitês de luta contra o golpe, com os movimentos sociais, com os que se engajaram na resistência ao golpe e veem claramente que o caminho para derrotá-lo é outro, é o de reafirmar a ilegitimidade de Bolsonaro e dessas eleições, é apostar na realização do Congresso do Povo, preparando uma resistência que ultrapassa a atividade partidária e parlamentar, é assegurar uma base social, a mesma que levaria Lula de volta ao Palácio do Planalto se não tivessem fraudado as eleições do golpe.
Caso essa pressão da burguesia tenha resultado, haveria um deslocamento de todo o regime ainda mais para a direita, pois ela visa justamente evitar uma resistência real ao desgoverno de extrema-direita. Isso seria um desastre completo para os trabalhadores, tendo em vista o que já se anunciou no horizonte. Os ataques serão mais violentos e cruéis do que os que já foram desferidos pelo desgoverno golpista de Michel Temer.
Cabe ao ativismo classista atuar para desarmar a bomba e fazer pressão contrária aos interesses da burguesia e do imperialismo.