Um documento de abril de 1974 tornado público recentemente pela Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos dá conta que o general Ernesto Geisel, presidente do país entre 1974 e 1979 durante a ditadura militar, tinha conhecimento e mesmo autorizava o assassinato de opositores do regime. O documento foi endereçado ao ex-Secretário de Estado, Henry Kissinger, pelo Diretor da CIA, William Colby e divulgado por um pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Matias Spektor.
O relato trata de uma reunião entre Geisel, João Batista Figueiredo, então chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), e os generais Milton Tavares de Souza e Confúcio Danton de Paula Avelino, ambos na ocasião no Centro de Inteligência do Exército (CIE). Durante a conversa o general Milton defendeu o emprego de assassinatos como meio de combate a “subversivos perigosos” e ainda acrescentou que no ano anterior 103 pessoas foram assassinadas pelo CIE. É ainda mencionado que as execuções deveriam ser aprovadas pelo general João Figueiredo, presidente no período seguinte.
Mesmo para os que possuem um conhecimento superficial da história da ditadura militar que esteve no poder no Brasil entre 1964 e 1985 o documento da CIA não contém nenhuma surpresa. Os assassinatos políticos se tornaram rotina desde o primeiro momento em que aquele regime golpista foi instalado e não havia quem não temesse, mesmo os que não tinham envolvimento político, se ver nas mãos dos órgãos encarregados da repressão política. Dada a disseminação e notoriedade geral dos atos de barbárie que ocorriam naquela época mostra-se impossível que eles não fossem do conhecimento dos mais altos escalões militares e assim não contassem com sua aprovação, pelo menos tácita.
A revelação de um episódio concreto pelo memorando da CIA vem como uma oportunidade de reavivar a lembrança do horror que se disseminou pelo país naquele período. A falsa transição democrática, o esquecimento dos crimes ocorridos naquela época, um ensino (de história) lamentável, o desleixo da esquerda com o passado tem permitido que lentamente a história venha sendo reescrita. Em geral aqueles nascidos após o regime militar não sabem o que ocorreu naquele período e são presas fáceis de um revisionismo tosco que tenta apresentar o período do regime militar como livre de corrupção e procuram sem constrangimento diminuir o número de suas vítimas. No momento atual os defensores da ditadura militar, sejam os sinceros sejam os inocentes úteis, não mais se sentem constrangidos em defendê-la e mesmo fazem frequentes ameaças de novamente assaltar o poder.
Embora a publicização de documentos secretos seja praxe do governo estadunidense resta saber porque este caso específico ganhou tanto destaque na imprensa corporativa neste momento.