No último dia 16, o portal Brasil 247 publicou uma coluna do sociólogo Milton Alves intitulada “A frente necessária para derrotar a agenda regressiva de Bolsonaro”. No texto, o autor considera que há dois métodos distintos sendo defendidos para levar adiante a luta contra o governo Bolsonaro: a chamada “frente ampla”, formada por partidos de esquerda e partidos que apoiaram o golpe de 2016, e aquilo que Milton Alves chama de “frente democrático-popular”, formada por partidos de esquerda e movimentos sociais.
Inicialmente, Milton Alves refuta a “frente ampla”, alegando que isso obrigaria a esquerda a limitar o seu programa – em outras palavras, adotar o programa da direita golpista:
O passaporte para ingressar no território dessa pretendida “frente ampla”, é a defesa da democracia no geral e dentro dos limites da Constituição de 1988. Ou seja, uma frente de teto rebaixado, o que levaria a esquerda defender uma agenda aquém das necessidades impostas pela conjuntura política atual.
O problema da “frente ampla”, no entanto, vai muito além de restringir o programa de reivindicações da esquerda. A “frente ampla” é uma frente com os partidos que apoiaram o golpe de 2016 – é, portanto, uma tentativa da burguesia de destruir por completo a oposição ao governo Bolsonaro. O ônus da “frente ampla” não seria, portanto, apenas limitar a atuação da frente à defesa de alguns direitos e abirir mãos de outras reivindicações. Seria, na verdade, uma infiltração dos setores mais reacionários para desmantelar o movimento de luta contra o golpe – o que levaria, inevitavelmente, a uma situação mais favorável para a direita prosseguir com seus ataques.
A refutação da “frente ampla” não implica, no entanto, que a “frente democrático-popular” seja o caminho que deve ser seguido pela esquerda. Essa frente, segundo propõe Milton Alves, seria uma frente quase que puramente parlamentar – uma frente de denúncias e de propaganda eleitoral contra o governo Bolsonaro:
Uma segunda posição entende que, numa conjuntura em que o governo Bolsonaro tenta impor uma agenda ultraliberal, de desmonte do estado nacional e dos direitos econômicos e sociais do povo trabalhador, é fundamental a constituição de uma frente de caráter democrático-popular, reunindo a esquerda partidária, os movimentos sociais e personalidades progressistas.
Tal frente, nucleada e conduzida pela esquerda – PT, PSOL PCdoB, setores do PSB e PDT, personalidades progressistas, frentes sociais Brasil Popular e Povo Sem Medo – tem a tarefa de derrotar globalmente o projeto antinacional e antidemocrático do governo Bolsonaro, apresentando uma programa de defesa da soberania nacional, dos direitos democráticos e sociais do povo trabalhador.
O caminho apontado por Milton Alves é, portanto, o caminho da formação de uma frente que teria como objetivo reunir organizações de esquerda para se opor, por meio das insituições burguesas – sobretudo o parlamento -, ao governo Bolsonaro. No entanto, esse caminho não é suficiente para barrar os ataques da direita.
Dilma Rousseff foi derrubada, o ex-presidente Lula foi preso e Bolsonaro se tornou presidente por meio das instituições – afinal, elas são controladas pela burguesia. A fraude por trás da prisão de Lula e a conspiração por trás da derrubada de Dilma já foram expostas inúmeras vezes, mas nenhuma das denúncias foi suficiente para impedir que a direita avançasse. É preciso, portanto, desenvolver um movimento que se choque com as instituições, isto é, um movimento que force os golpistas, na marra, a ceder às reivinidcações da esquerda. E esse caminho só pode ser o da mobilização revolucionária dos trabalhadores. Nesse sentido, o que se faz necessário não é uma frente com parlamentares e personalidades, mas sim uma frente de luta, que coloque a população para enfrentar a direita e ponha o regime político abaixo.
Em outro momento, Milton Alves pontua que, apesar de suas divergências com a “frente ampla”, “alianças pontuais e parciais com forças do centro em torno de objetivo políticos concretos e imediatos” seriam aceitáveis. Nenhuma aliança com a direita golpista, no entanto, pode ser aceita pela esquerda. Se algum setor da burguesia se apresenta como disposto a colaborar com a esquerda, o que está colocado é, na verdade, o interesse em controlar a mobilização popular para que a revolta contra a política neoliberal não ponha o regime abaixo. Não há nada a ganhar com aliança alguma com a direita – essas alianças devem ser prontamente rejeitadas.
Por fim, o sociólogo ainda expõe que o objetivo da frente seria o de “impulsionar a resistência ativa, de massas, nas ruas” e da “construção de uma hegemonia democrático-popular para superar a agenda neoliberal e regressiva do bolsonarismo, e de seus aliados internos e externos”.
O caminho da “resistência” já se mostrou ser o caminho do fracasso. Resistir ao governo é, no máximo, impedir que ele continue seus ataques, mas mantê-lo até, pelo menos 2022. As lutas parciais – isto é, a tática defensiva de lutar para que determinados direitos não fossem tirados – foram todas derrrotadas. A luta contra a reforma da Previdência, contra a PEC do Teto, contra a reforma trabalhista, entre tantas outras, não conseguiram impedir a direita de avançar.
O mesmo é válido para a questão da “hegemonia democrático-popular”. A esquerda tem, em suas costas, o apoio de dezenas de milhões de trabalhadores, como ficou comprovado nas intenções de voto na candidatura de Lula e nas manifestações contra a direita no carnaval e nos protestos contra os cortes na Educação. Portanto, a suposta “hegemonia” evocada pelo autor só pode ser entendida como uma hegemonia que se dá no âmbito eleitoral.
Os trabalhadores devem se opor, portanto, a qualquer frente que apresente como maior objetivo a ampliação do número de cargos a ser ocupados por parlamentares que pouco têm a ver com o movimento operário e popular. A frente que deve ser criada é uma frente de luta com todas as organizações dos explorados que querem mobilizar toda a população pela liberdade imediata do ex-presidente Lula e pela derrubada de Bolsonaro e todos os golpistas.