Em novembro passado, quatro senadores e 226 deputados propuseram a criação de uma frente pró-internação psiquiátrica intitulada Frente Parlamentar Mista em Defesa da Nova Política Nacional de Saúde Mental e da Assistência.
Essa frente criada justamente um dia após o ministro da saúde Luiz Mandetta (DEM), criticar o modo de atuação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e afirmar sua intenção em realizar mudanças nas políticas de tratamento de dependentes químicos, evidencia a importância do debate na esquerda sobre as políticas públicas para a saúde mental no País e os cuidados que envolvem essa discussão.
O idealizador da frente, deputado Roberto de Lucena (Podemos) afirma que as declarações do futuro ministro da saúde evidenciam um debate “livre de ideologia” proposto pelo futuro governo e destaca que a sua atenção para o tema foi despertada por ter sido procurado por associações de hospitais.
De acordo com a lei da Reforma Psiquiátrica, de 2001, as internações devem ocorrer apenas como último recurso. Cabe ao governo federal estabelecer que os cuidados tanto aos dependentes químicos quanto aos pacientes psiquiátricos sejam, preferencialmente, oferecidos em regime ambulatorial. Com esse intuito, foi criada uma rede de serviços de ambulatório onde trabalham equipes multiprofissionais, os chamados CAPS. Com o aumento destes centros de atenção, houve um fechamento dos hospitais psiquiátricos e uma diminuição dos leitos para internação.
Contudo, desde o ano passado, a Política Nacional de Saúde Mental é alvo de mudanças por parte do governo. Em dezembro, por exemplo, foram anunciadas alterações que previam a revisão nos valores pagos pelos leitos psiquiátricos existentes em hospitais gerais pelo SUS. Houve também o repasse financeiro de recursos do ministério da Saúde para “comunidades terapêuticas” mantidas por grupos religiosos para a internação de pacientes com problemas de dependência química.
Para Marisa Helena Alves, membro do Conselho Nacional de Saúde (CNC), o retorno dos hospitais psiquiátricos é preocupante, pois são “lugares que cometiam violações aos direitos dos pacientes”. Ela afirma que a rede de cuidados brasileira é capaz de atender pacientes em diferentes momentos, até durante as crises, porém é necessário expandi-la.
Com o objetivo de evitar maus-tratos ou que os pacientes percam os laços com os seus familiares, a Organização Mundial de Saúde (OMS) indica que o atendimento a dependentes químicos e a pacientes psiquiátrico seja realizado em regime ambulatorial. “Isso permite que a pessoa mantenha o convívio social e garante melhores resultados para o tratamento”, afirma Marisa Helena.
Como proposto pelo Movimento da Luta Antimanicomial, é necessário lutar pelo direito das pessoas que possuem algum sofrimento mental. Faz parte desta luta combater a ideia de que a pessoa com sofrimento mental deva ser isolada para obter tratamento, pois isso reforça determinados preconceitos em relação à doença mental. “Como todo cidadão estas pessoas têm o direito fundamental à liberdade, o direito a viver em sociedade, além do direto a receber cuidado e tratamento sem que para isto tenham que abrir mão de seu lugar de cidadãos”, afirma o Movimento.
É importante ressaltar que o manicômio não é um espaço para tratamento, mas uma prisão de “loucos”. Além disso, diante do contexto que vivemos, a extrema direita pode usar politicamente este retorno dos manicômios para perseguir militantes de esquerda. Exemplo é o que acontecia no Manicômio de Barbacena, em Minas Gerais. Criado em 1903, recebia pessoas consideradas “loucas”, porém, como destaca Daniela Arbex no livro “Holocausto Brasileiro”(2013), somente 30% delas possuía diagnóstico de doença mental. Ela narra que meninas que haviam perdido a virgindade antes do casamento, homossexuais e militantes políticos eram encaminhados para lá.