“(…) por ser uma verdadeira Nação, formada por mais de 42 milhões de torcedores das mais diversas crenças e opiniões, não se posiciona sobre assuntos políticos. A homenagem citada na nota foi realizada diretamente por um grupo de sócios e torcedores do Clube, sem nenhuma participação da instituição – algo que, inclusive, é estatutariamente vedado” (DCM, 01/04).
Com esta nota, o Clube de Regatas Flamengo, o time de maior torcida do país, se posicionou sobre uma homenagem prestada ao atleta bicampeão do clube, Stuart Angel Jones, por ocasião da passagem dos cinquenta e cinco anos do golpe militar de 1964, que instalou no país um longo período de terror, perseguições, exílios, torturas, assassinatos, cassações e censura.
Stuart Angel foi atleta do Flamengo na década de sessenta, onde sagrou-se bicampeão na modalidade de Remo, nos anos de 64/65, quando ainda era adolescente. Stuart era filho da famosa estilista Zuzu Angel, que levou adiante uma intensa campanha pela localização do corpo de Stuart, torturado e assassinado nas dependências do Centro de Informações da Aeronáutica (CISA), na Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Durante anos, a figurinista Zuzu lutou para esclarecer o caso, mas morreu sem saber o paradeiro do filho.
O atleta bicampeão do Flamengo e ativista político do grupo armado MR-8 era estudante de Economia quando entrou para a clandestinidade para lutar contra a ditadura militar. Ele foi preso e assassinado em 14 de junho de 1971, depois de ser barbaramente torturado e espancado durante interrogatório pelos agentes torturadores do CISA. Na versão oficial da ditadura, Stuart foi dado como “desaparecido político”, assim como centenas de outros ativistas de esquerda assassinados pelo regime militar nos terríveis anos de chumbo.
A recusa do Flamengo em não assumir, enquanto instituição, a justa homenagem prestada a um dos seus ex-atletas, merece o repúdio não só dos torcedores, mas de todos os que lutam para que nunca mais no país recrudesça os atos de barbárie, carnificina, assassinatos, torturas e perseguições, semelhantes aos que foram perpetrados pelos militares golpistas assassinos.
“Por ser uma verdadeira nação”, como diz a nota da diretoria rubro negra, o Flamengo – um time com grande torcida justamente entre as massas populares do país – deveria assumir claramente uma postura em defesa dos direitos democráticos da imensa maioria da população, neste momento duramente atacadas exatamente pelos defensores atuais (Bolsonaro e os militares) da ditadura e do golpe militar de 64.
A posição da diretoria do Clube causou indignação nas redes sociais, onde vários torcedores se mostraram indignados com a postura do Flamengo. Muitos deles destacaram que o “Rubro-Negro não fez manifestações no dia 31 de março. Clubes como Bahia, Corinthians e Vasco fizeram posts no domingo – data que marcou o aniversário de 55 anos da queda do governo João Goulart – em favor da democracia” (G1-Esportes, 01/04).
Em uma outra manifestação, um torcedor rubro-negro publicou: “Uma postura LAMENTÁVEL do clube mais popular do país, mas que se acovarda em momentos importantes. Não se trata de defender essa ou aquela ideologia, mas de lembrar de um atleta dos seus quadros que foi torturado e assassinado num capítulo obscuro da história. Melhore. (Idem, 01/04).