O presidente da República da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, emitiu nesta segunda-feira (26) duras declarações contra a França, estabelecendo um paralelo entre a situação dos muçulmanos na França hoje com a situação dos judeus antes da segunda guerra mundial, acusando os governos europeus de nazismo e fascismo e estimulando um boicote aos produtos franceses.
Essas declarações vêm se somar às proferidas no último sábado (24) por Erdogan, quando ele disse que o presidente da República Francesa, Emmanuel Macron, seria um “doente mental”, promotor do “separatismo islâmico”, “obcecado por ele [Erdogan] dia e noite”, e que o presidente francês “deveria se submeter a exames mentais”.
Segundo as últimas declarações de Erdogan, Macron estaria levando adiante “uma campanha de linchamento parecida com a que foi feita contra os judeus antes da Segunda Guerra Mundial está sendo organizada contra os muçulmanos”. O líder turco também exortou os países islâmicos a uma retaliação econômica. “Assim como na França alguns dizem ‘não comprem as máscaras turcas’, peço que não comprem produtos de marcas francesas”. Segundo Erdogan, essa seria uma forma de interromper uma campanha de “ódio de Macron contra os muçulmanos”.
O crime de Conflans-Saint-Honorine
As tensões entre a França e os países islâmicos voltaram a se acumular em decorrência do caso de um professor assassinado por motivos religiosos na pequena cidade de Conflans-Saint-Honorine, a 50 quilômetros de Paris. O crime gerou desde então uma grande comoção nacional na França.
O professor Samuel Paty, de 47 anos, foi decapitado por um rapaz de origem chechena no dia 16 de outubro após ministrar uma aula sobre “liberdade de expressão” na qual exibiu caricaturas do profeta Maomé. O assassino, um jovem de 18 anos, declarou ter ficado indignado com a atitude do professor Paty.
As caricaturas, publicadas originalmente pelo semanário satírico Charlie Hebdo, provocaram indignação generalizada no mundo islâmico, e foram o estopim para um ataque a bomba à sede do jornal em 2011 e a um massacre em 2015 cujo resultado foram 12 mortos, a maioria jornalistas do periódico.
Plano contra o “islamismo radical” e reação muçulmana
Neste sábado (24), Macron apresentou um plano de luta contra o “islamismo radical”, no qual propõe penas para aqueles que “negam as leis da República em nome da religião. No dia seguinte (25), o presidente francês publicou no Twitter uma mensagem em árabe e francês dizendo que defenderá a “liberdade, igualdade, e fraternidade”, que “nada fará o país recuar”, e que “a história da França é de luta contra tiranias e fanatismos”.
As ações de Macron foram interpretadas pelos governos dos países islâmicos como um ataque organizado contra o Islã e os muçulmanos em geral, o que gerou uma ampla crise diplomática e uma campanha de retaliação econômica, com a retirada de produtos franceses das prateleiras dos mercados de cidades como Doha, Catar e Jordânia.
O governo do Paquistão convocou o embaixador francês a Islamabad nesta segunda-feira (26) e teceu duras críticas ao governo francês, alegando que Macron leva adiante uma “campanha islamofóbica sistemática, conduzida sob o pretexto da defesa da liberdade de expressão”.
Tensões entre Ancara e Paris
A crise diplomática entre os governos turco e francês se aprofundou após as declarações de Erdogan. Ainda no sábado (26), a Presidência da Repúblca Francesa emitiu nota criticando Ancara pela “ausência de mensagens de condolências e de apoio do presidente turco” por ocasião do assassinato do professor Paty.
No domingo (25), o Ministério das Relações Exteriores turco emitiu nota oficial na qual alega que o órgão “luta há anos contra todo tipo de terror e violência, e estava triste com a morte de Samuel Paty”. No dia seguite ao assassinato do professor (17), o embaixador da Turquia na França, Ismail Hakki Musa, publicou nas redes sociais que se sentia “horrorizado” com o crime cometido contra Paty.
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, interveio na crise nesta segunda-feira (26) defendendo o governo de Emmanuel Macron e condenando as “declarações difamatórias” de Erdogan.