O desemprego e o empobrecimento rápido são fantasmas que assustam milhões de trabalhadores e trabalhadoras. Nos últimos anos, mais de 14 milhões têm experimentando essa situação. Outros 38 milhões estão na fronteira do desemprego, são informais e eventuais. Agora, com a crise do novo coronavírus, está cada vez mais claro que outras dezenas de milhões vão se juntar a esse exército.
Na Venezuela e em outros países, o governo está garantindo os salários até o final do ano. Aqui no Brasil, o governo está tomando medidas para acelerar o desemprego, desonerar os empresários de suas obrigações legais e até mesmo impedindo que a fiscalização multe empresários que estão descumprindo as leis trabalhistas.
Os pequenos negócios, especialmente aqueles que vivem do comércio diário, como restaurantes, bares, lanchonetes, mercearias e similares, estão sofrendo muito com a crise. Os trabalhadores da área de cultura e diversão foram os primeiros a perderem sua renda. Logo mais as pequenas fábricas de roupas e acessórios seguirá o mesmo caminho, sem encomendas e sem perspectivas de vendas no varejo. Esses grupos não têm economias e nem respaldo financeiro para ficarem muito tempo na inatividade.
Cenário muito diferente é o das grandes empresas. Vão sentir também as flutuações do mercado e a falta de encomendas. Mas essas empresas lucram muito e têm acesso fácil ao crédito e a outros instrumentos de mercado ou dos governos. Bancos, financeiras e especuladores em geral estão fora disso. Vão ganhar de um jeito ou de outro.
O jornal O Globo (23/3/2020) trouxe uma matéria por meio da qual empresários afirmam que precisam de que o governo providencie um novo Plano Marshall para que eles possam voltar a lucrar. Esse Plano foi o que os norte-americanos implementaram na Europa logo depois da II Guerra Mundial, com facilidades de crédito e compras das empresas europeias. Isso dinamizou a economia e restabeleceu as grandes empresas e conglomerados. Gerou empregos e aumentou a renda.
Segundo o jornal, um dos demandantes dessa política de ajuda aos empresários é o financista Guilherme Benchimol, fundador da XP Investimentos. A mesma que semanas atrás foi acusada de fraude nos Estados Unidos e no ano passado teve que pagar uma fortuna em multas por envolvimento em irregularidades no mercado financeiro norte-americano. Pois bem, sem produzir nada e ganhando muito dinheiro no mercado financeiro, se juntam aos grandes empresários que sempre tiveram facilidades governamentais para pedir mais. Jogam com o desemprego como se fosse uma moeda de troca. Ameaçam um desemprego de mais de 40 milhões de trabalhadores e pedem dinheiro.
O governo brasileiro faz o que seus patrões pedem. Na semana passada, depois que cortou 158 mil pessoas do programa Bolsa Família, o governo federal prometeu liberar para os Planos de Saúde 10 bilhões de reais vinculados à Agência Nacional de Saúde Complementar. Uma coincidência é que a filha do ministro da Saúde é advogada dos Planos e foi quem negociou essa ajuda.
No domingo (22), o governo editou a Medida Provisória 927 que permite que empresários parem de pagar, por 4 meses, os salários de seus empregados, também impede a aplicação de multas por infrações trabalhistas ente outras medidas contra os trabalhadores. O presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ), disse que estava negociando com o governo foi a possibilidade de redução de 50% dos salários, segundo o portal UOL. O plano deles é um só: quebrar as pernas da classe trabalhadora, retirar direitos e provocar a redução geral de salários. Isso agrada os empresários, que estão pedindo medidas de contenção de custos (chama salários de custos) para que possam elevar suas taxas de lucro.
A Medida Provisória 927 já está gerando pânico na sociedade e vai ser negociada nesta semana. Talvez venha alguma forma de amenizá-la, pois já na manhã da segunda-feira (23), poucas horas depois da publicação da MP, o presidente da República anunciou que voltará atrás e revogará o trecho da MP que fala em suspensão dos contratos de trabalho por 4 meses (G1, 23/3/2020). Mas certamente o objetivo permanecerá. Reduzir salários, enfraquecer os trabalhadores e aumentar lucros. Não à toa a MP 927 retoma a velha arma contra os trabalhadores que é a negociação direta entre empregados e empregadores passa a ter mais valor que os acordos coletivos e que a própria legislação, contrariando a Convenção 98 da OIT, como denunciou a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra, em seu portal em 23 de março, afirmando que a MP 927 é inconstitucional.
Aproveitando-se do caos da crise, os empresários continuarão a pressão por um plano de ajuda empresarial, aos quais se juntarão os bancos e as empresas de especulação financeira.
Pouco interessados no drama concreto dos trabalhadores desempregados, os grande empresários só querem saber dos lucros e de receber ajuda do governo. Em situações normais, defendem a redução do Estado e a eliminação de toda intromissão estatal em seus negócios. Logo que aparece uma crise, querem o Estado atuando e liberando recursos. “Empresas grandes e governo precisam ajudar a manter a economia ativa” afirmou Benjamin Steinbruch, presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), privatizada no governo FHC. Já o fundador da empreiteira MRV, que ganhou muito dinheiro com o programa Minha Casa, Minha Vida, quer acredita que o governo terá que subsidiar empréstimos e até mesmo criar um tipo de bolsa para auxiliar os comerciantes”. (O Globo, 23/3/2020).
Parte do dinheiro que o governo certamente adiantará para essas empresas irá para as contas pessoais de seus dirigentes, sem passar por qualquer processo produtivo. Talvez aqueça um pouco mais o mercado de lanchas de luxo e jatinhos executivos, como vimos acontecer nos últimos anos.
Não fosse a quarentena que está sendo imposta a boa parte da população e o medo de aglomerações, certamente as reações populares seriam outras, caso suas direções sindicais e partidárias estivessem interessadas em enfrentar a crise com respostas compatíveis com a dimensão global da mesma.
Esta é hora que exige coragem para lançar mão de ações que já foram vitoriosas nos movimentos operários do passado, no Brasil e em outros países, como ocupação de fábricas ou autogestão operária e também de se construir outras propostas inovadoras de ação. Todas essas medidas dos trabalhadores e dos desempregados devem ser articuladas com exigências de manutenção dos direitos trabalhistas e sociais, garantia dos empregos até o final do ano, ampliação do Bolsa Família, imediata concessão das aposentadorias e benefícios que estão tramitando há meses no INSS, pagamento de um salário mínimo para todos os desempregados e subempregados e garantia de orçamento para o SUS. Isso sem falar que é urgente e necessário também, suspender as cobranças de água e luz, gás e alugueis de todos os trabalhadores. Suspender o pagamento da dívida pública e voltar a investir nas áreas sociais.
Essa é a contraproposta democrática à demanda dos empresários por mais riqueza e facilidades de lucros.