Advogado, jornalista, escritor, romancista e dramaturgo. São muitas as atribuições de Antônio Callado, um homem que parece ter escrito sobre o Brasil dos dias atuais, mesmo tendo morrido em 1997, dois dias após ter completado 80 anos. Uma história de lutas e resistências e que, evidentemente, merece mais reconhecimento. Talvez seja essa a proposta de Emilia Silveira ao lançar o documentário “Callado”, retratando a vida de um dos mais importantes escritores brasileiros do século XX.
Inconformado, inquieto e de inteligência ímpar, Callado esteve em Londres durante a Segunda Guerra Mundial trabalhando pela BBC. Atuou de forma incisiva em favor da criação do Parque Indígena do Xingu, escreveu sobre a luta de Francisco Julião e sua batalha pela criação das Ligas Camponesas em Pernambuco, acompanhou também o surgimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. Foi um ávido e incessante crítico da ditadura militar brasileira, tendo sido preso no episódio que ficou conhecido como os “Oito da Glória” tendo denunciado com frequência toda a barbárie que assolou o país durante os anos de chumbo coordenados pelos militares. Além disso, atuou como jornalista cobrindo a Guerra do Vietnã.
Antônio Callado foi um daqueles intelectuais que não cabiam no conforto de seus escritórios, apaixonado pelo Brasil e fervoroso defensor do povo brasileiro, sempre se posicionou de forma clara pelo valor e reconhecimento dos povos historicamente oprimidos. Combativo, foi preso pela segunda vez ao publicar artigo que defendia o fim imediato do Exército do Brasil, presumindo a total inutilidade da instituição após o fim da Segunda Guerra Mundial, por conta disso, teve seus direitos políticos e profissionais cassados.
O documentário “Callado” mostra, além de um homem apaixonado pelo Brasil, a trajetória de um homem combativo e que acreditava na ação, na atividade, no ato perante o fato, devoto da cultura brasileira e convicto lutador dos ideais de emancipação do povo operário. E que, infelizmente, partiu sem ter visto o Brasil de seus sonhos sair de seu imaginário. Callado, escreveu sobre as injustiças, sobre os dramas do povo, sobre a brutalidade do poder público e sobre a vulnerabilidade do povo perante os mandos e desmandos dos poderosos.
Callado escreveu sobre o Brasil de outrora, que se colocado frente a um espelho, talvez fosse a perfeita imagem de um Brasil que se observa hoje. Um país que reitera suas mais trágicas tradições de exploração e extermínio, uma das maiores decepções desse gênio genuinamente brasileiro.