Na última quarta-feira (12), o Tribunal Constitucional do Equador, órgão máximo do judiciário daquele país (equivalente ao STF brasileiro), aprovou, por cinco votos a quatro, o direito a um casal do mesmo sexo se casar.
A imprensa capitalista, reproduzindo o engodo imperialista para travar a luta dos povos (pautando a esquerda pequeno-burguesa sobre a suposta maior importância das lutas das mulheres, dos negros e dos gays em relação à luta de classes), noticia o fato como uma “vitória” contra o conservadorismo.
Essa propaganda é feita justamente no intuito de esconder que o país sul-americano vive um regime de golpe de Estado, no qual muitos direitos da população estão sendo suprimidos. Em 2017, Lenín Moreno foi eleito como o sucessor de Rafael Correa, tendo em sua campanha eleitoral o apoio deste e de sua ampla base popular.
Entretanto, tratou-se de um golpe branco muito requintado. Moreno se mostrou, de maneira aberta, logo nos primeiros dias de governo, um agente do imperialismo no Equador. Ele simplesmente traiu o “correísmo”, ou seja, o nacionalismo progressista de esquerda que caracterizou os governos de Correa (2007-2017).
Moreno simplesmente iniciou a adoção de uma política golpista, de aliança com os setores mais direitistas do Equador e da América Latina. Começou perseguindo membros do antigo governo, como o próprio Correa (que teve de se exilar na Bélgica para não ser preso em seu país, acusado de maneira fraudulenta de crimes de corrupção) e seu ex-vice-presidente, Jorge Glas, que foi preso e se encontra em condições absurdamente degradantes e subumanas.
O exemplo recente de maior impacto foi a entrega da cabeça do ativista Julian Assange em uma bandeja de prata aos imperialismos norte-americano e britânico, retirando de maneira inconstitucional a cidadania equatoriana concedida por Correa ao fundador da Wikileaks para que a polícia de Londres pudesse retirá-lo da embaixada do Equador na Inglaterra.
Houve uma ruptura radical com a base de apoio que elegeu Moreno. Uma política neoliberal foi implantada, sob os auspícios do FMI, iniciando uma onda de privatizações e enxugamento dos gastos públicos com programas sociais que atendiam à população mais vulnerável e que levaram a importantes melhorias nas condições de vida da população.
A política de choque neoliberal levou à carestia de vida, ao aumento das tarifas, aos ataques às instâncias democráticas criadas durante o governo Correa (acabando, na prática, com o direito de uma maior participação popular na vida política e econômica do país). Isso levou a grandes insatisfações populares. Abriu-se uma guerra do governo com os movimentos sociais, gerando uma intensa repressão das forças policiais contra greves e manifestações.
Soma-se a isso a política externa de completa subserviência aos interesses norte-americanos. O Equador – que durante Correa ficou famoso por não se dobrar a qualquer exigência imperialista – voltou a conceder cada vez mais privilégios aos EUA, que agora está novamente se infiltrando em todas as instâncias do Estado equatoriano, incluindo na área da segurança interna e das forças armadas. Moreno não reconhece Nicolás Maduro como o presidente legítimo da Venezuela, enquanto que Correa era um dos mais próximos aliados do chavismo na região. Na verdade, o Equador se transformou em um dos principais centros de conspiração contra o governo bolivariano, recebendo dinheiro dos EUA para incentivar a imigração venezuelana e participando do Cartel de Lima para fazer pressão diplomática contra Caracas.
Sob o golpe de Estado – foi isso o que ocorreu nas eleições de 2017 no Equador -, o país vive um regime antidemocrático e cada vez mais autoritário e repressivo. A aprovação do direito ao casamento gay não passa de mera demagogia da burguesia. Na prática, não significa nada, uma vez que os próprios homossexuais estão tendo seus direitos perdidos sob Moreno – já que a grande maioria faz parte da classe trabalhadora e demais classes populares, que estão sofrendo a política neoliberal do traidor.
A situação é semelhante à aprovação da lei que pune a “LGBTfobia” no Brasil, por parte do reacionário STF em pleno golpe de Estado e o governo de extrema-direita de Bolsonaro. Não vai valer de nada para essa camada da população: ela já é absurdamente oprimida por esse mesmo Estado, a cada dia, como toda a população em geral, com a perda de direitos trabalhistas, aumento dos preços dos produtos mais básicos, corte em programas sociais, repressão das forças de segurança etc. Trata-se de uma demagogia para encobrir todos esses ataques e a verdadeira luta que importa: a luta de classes. Só a luta nesse âmbito possibilitará a emancipação dos setores oprimidos da sociedade: ao se libertar, a classe operária liberta também as mulheres, os negros, os homossexuais, conquistando assim, finalmente, os direitos democráticos que lhes são negados pela burguesia capitalista em sua fase de degenerescência.