Da redação – Conforme denúncia publicada pelo jornal norte americano The Washington Post e as emissoras de TV ZDF (Alemanha) e SRF (Suíça), os serviços secretos dos Estados Unidos e da Alemanha (CIA e BND respectivamente) tiveram acesso a documentos e comunicação confidencial de mais de 120 países desde 1970 através da companhia suiça Crypto AG, fornecedora de equipamentos de encriptação de dados, desde dispositivos mecânicos a softwares.
Comprada pelos serviços de espionagem norte americano e alemão numa operação secreta em 1970, a Crypto AG já era líder mundial no ramo desde a Segunda Grande Guerra, quando contratos firmados com o governo dos EUA promoveu o fluxo de caixa necessário para que a empresa tivesse uma grande presença nesse mercado.
Sob os dois governos, a Crypto AG passou a ter praticamente o monopólio da encriptação de mensagens confidenciais enviadas por diplomatas, militares e chefes de Estado, o que foi amplamente utilizado pela CIA e o BND para ter acesso a essa comunicação sensível e assim, conseguiram informações detalhadas, por exemplo, sobre as ações das ditaduras militares latino americanas (o Brasil e demais países da América Latina submetidos ao imperialismo eram clientes da empresa), auxiliaram a Inglaterra com informações sobre os militares argentinos na Guerra das Malvinas, entre uma série de outros eventos, entre os quais, a crise dos reféns na Embaixada dos Estados Unidos em Teerã, capital iraniana.
União Soviética e China, contudo, jamais fizeram a tolice de confiar suas informações confidenciais a uma empresa estrangeira e não foram vítimas do golpe. Porém, entre os 120 países espionados se encontram inclusive nações imperialistas como Portugal, Espanha, Itália e Japão, além de membros da OTAN e da ONU.
Descrito como “Golpe do século” pelo The Washington Post, o caso tem mesmo características que tornam a descrição muito precisa. A compra da companhia já envolveu um complexo esquema de engenharia financeira e jurídica para ocultar os verdadeiros donos.
Velha conhecida dos brasileiros, a Siemens esteve presente no arranjo, junto com a Motorola do lado americano, para dotar a empresa da mais eficiente tecnologia capaz de promover a espionagem, que incluía ainda a venda de seus equipamentos e serviços para as nações que eram roubadas, o que não era pouca coisa.
Conforme a denúncia divulgada no sítio do The Washington Post, a Crytpo AG movimentou 15 milhões de francos suíços em vendas no ano de 1970. 5 anos depois, já estavam operando com mais de 51 milhões. Coisa de cinema, convenhamos.
Após 22 anos operando livremente, o governo do Irã prendeu um vendedor da empresa, após 6 anos de uma relação descrita como tensa pela reportagem, onde o funcionário foi extensivamente interrogado pelas autoridades iranianas, que desconfiaram dos equipamentos de criptografia utilizados após um ataque numa casa noturna na então Berlim Ocidental (que matou dois militares americanos) dar sequência a uma série de bombardeios contra a Líbia.
Ao final, a reportagem informa que o programa foi abandonado pelos alemães ainda no começo dos anos 1990 e finalmente pelos americanos em 2018. Claro que ninguém em sã consciência vai imaginar que os principais países imperialistas do mundo criaram reservas morais quanto a esse tipo de expediente.
Certamente formas muito mais elaboradas de espionagem deram lugar ao uso da Crypto AG, o que pode ser facilmente constatado se observarmos o contraste entre as consequências geradas pelas denúncias de Snowden sobre a extrema vigilância a que está submetida a população mundial de conjunto e a pouca reação ao caso da Crypto AG por parte dois governos envolvidos.
Um ex-coordenador do serviço de espionagem alemão se limitou a dizer que a falcatrua tornou “o mundo um pouco mais seguro”, a desculpa padrão para toda sorte de abusos cometidos. Nada de novo portanto, exceto as proporções.