A pequena-burguesia, ainda quando possua tendências de esquerda, quando não se encontra à serviço da classe de fato revolucionária, a classe operária, é apenas poço de contradições e confusões políticas sem fim.
E esta regra não poupa nem ao menos os intelectuais mais renomados do planeta, cujo acúmulo cultural não os torna imunes nem mesmo à mais rasteira conversa mole da burguesia.
Prova disto são as críticas que Noam Chomsky fez ao PT em recente entrevista no Democracy Now.
Segundo o renomado autor, o PT deveria mesmo fazer aquela “autocrítica” que foi tantas vezes aconselhada pela direita brasileira. Chomsky considera, inclusive, que a ausência desta autocrítica, especificamente no que se refere àquilo que ele chamou de “corrupção endêmica da classe política brasileira”, à qual o Partido dos Trabalhadores teria cedido, foi a causa da vitória de Bolsonaro, no Brasil.
Não foi o golpe de 2016, a prisão arbitrária de Lula, o impedimento fraudulento de sua candidatura e até mesmo a evidente alteração direta de votos ocorrida nesta que foi uma das mais escandalosas fraudes eleitorais da história, o verdadeiro motivo do que se vive hoje no Brasil.
Não. Foi a ausência desta “autocrítica” que teria, por fim, “dado a oportunidade para a extrema direita construir este processo que levou Bolsonaro ao poder”.
O que Chomsky parece esquecer é que, a burguesia não poderia declarar os reais motivos que tem para levar avante um plano para destruir o PT. É óbvio que a burguesia não poderia simplesmente anunciar que faria de tudo para acabar com o PT, assim poder continuar a explorar o povo brasileiro “em paz”.
É evidente que teria de existir alguma conversa mole, por mais mal alinhavada que fosse, para mascarar a real pilantragem no plano de por abaixo aquela que é certamente uma das maiores organizações de esquerda da América Latina.
E é isto que a pequena-burguesia realmente não consegue ver. Mesmo os seus maiores intelectuais. E não vê pelo simples motivo de que, pequena-burguesia ainda é burguesia, e por isso, é sempre extremamente vulnerável às táticas da alta burguesia, ainda mais quando estas táticas pegam no ponto sensível desta burguesia menor, que é a moralidade.
O pequeno-burguês não possui nada além de seu prestígio. É o seu único “capital”, sua real fonte de subsistência, inclusive, na maioria das vezes. Como prestígio é fruto direto da moralidade, o pequeno-burguês vegeta em um mundo pantanoso e confuso de valores morais abstratos, que são facilmente manipuláveis.
Sabendo muito bem disto, os golpistas que atacaram o Brasil e miraram suas armas desde o início contra o PT, prepararam e executaram um plano calcado na moralidade pequeno-burguesa, visando a conquistar aliados desta classe, armando-os de argumentos vazios, mas eficazes, contra os movimentos sociais e operários brasileiros.
Se em 1964 o grande fantasma da confusão pequeno-burguesa era um comunismo oculto, hoje claramente ridículo, no golpe de 2016 a cilada veio com o nome de corrupção.
Como se sabe hoje, o golpe de 1964 foi arquitetado muito tempo antes pelo imperialismo. Em 2016, da mesma forma, houve uma longa preparação anterior – inclusive com ações de espionagem que não pouparam sequer o telefone da Presidenta Dilma – tudo para construir uma falsa luta contra a corrupção, que soaria, aos ouvidos da pequena-burguesia brasileira e mundial, como um motivo mais que convincente para encobrir a muito mal disfarçada perseguição política contra a esquerda brasileira, certamente a mais infame e dos últimos 30 anos no Brasil, sem que se visse nada de errado nesta rapinagem descarada contra o nosso povo.
Ainda que qualquer marxista real saiba que onde impera a força da grana, a grana será usada sistematicamente como arma de poder, ou seja, que o capitalismo em si é um sistema de corruptos e corruptores, e o nível de corrupção é diretamente proporcional ao desenvolvimento deste sistema, ainda assim, a força do moralismo nos corações pequeno-burgueses é tão intenso que a cortina de fumaça tão mal cerzida pela burguesia imperialista e nacional já foi o suficiente para fazer muita gente de esquerda nem ao menos ver o golpe de 2016, ou, como no caso de Chomsky, atribuir alguma culpa às vítimas primárias e diretas deste golpe.
Em verdade, o discurso moralista de Chomsky não difere muito daquele que coloca nas roupas da mulher o motivo “justo” para o seu estupro e que, aconselhando “autocrítica”, diria que a mulher teria de passar a andar de burca, ou que não reclamem depois.
De fato, o Brasil está sendo estuprado pela burguesia imperialista e por todos os golpistas. Nossa economia foi destruída, direitos viraram fumaça, a Constituição está morta e estamos na iminência de reviver os mais amargos dias de nossa história, em um regime militar aberto.
Neste estado de coisas vir a público falar que o PT deveria fazer uma autocrítica, além de representar o criminoso e reacionário discurso de culpar a vítima, é simplesmente demonstrar a mais profunda ignorância sobre tudo o que estamos passando no Brasil.
É perder uma maravilhosa oportunidade de ficar quieto quando não sabe o que dizer. É demonstrar, a mais não poder, as reais diferenças que existem entre uma classe revolucionária por natureza – a classe operária – e outra que nada é em si mesma, a pequena-burguesia.
Ao contrário de Chomsky, todo militante do PCO sabe que na rua o povo demonstra muito mais clareza política. O operário a todo momento diz: “esta história de corrupção não me interessa, o que eu quero é Lula!”
Ao pequeno-burguês não tem outro caminho: ou ele abraça a ignorante confusão moralista em que vegeta, ou ele segue o exemplo daqueles de fato são os grandes intelectuais da esquerda, como Marx, Lênin, Trotski e muitos outros e passa a aliar o estudo sistemático e científico da sociedade à luta concreta e organizada da classe operária.
Para pensar com clareza, e não ser tão vulnerável às mentiras burguesia, só o academicismo não basta. É necessário estar nas ruas, junto com o povo, militando concretamente pela transformação da sociedade, aliando-se à luta da classe operária por um estado operário e comunista.