Em 14 de fevereiro haverá eleições no Parlamento da Catalunha. Será uma eleição marcada pela pandemia e o início de uma grande crise econômica e social. Porém a convocação de novas eleições foi motivada pelo afastamento do presidente Torra: por suposto “crime de recusa de assistência a pedido da autoridade competente” e de “desobediência” a artigos individuais do Código Penal após a recusa de Torra para remover os laços amarelos dos edifícios públicos. Ou seja, o atual presidente democraticamente eleito para a região da Catalunha na Espanha foi derrubado judicialmente do governo por se recusar a retirar os laços amarelos (que são um dos símbolos do independentismo na Catalunha) dos espaços públicos, lembrando muito a realidade de uma ditadura fascista, sendo que inclusive não faltaram os ataques de grupos fascistas contra a sede do governo.
“Um ataque à liberdade de expressão e à soberania catalã, que se soma à razia repressiva de uma justiça herdeira do franquismo que busca vingança pelo referendo de 1º de outubro. Uma vingança que aplicam impunemente com a passividade cúmplice do governo de coalizão PSOE-UP.”
Não apenas Quim Torra, os presos políticos da Catalunha ou os outros 2.850 ativistas perseguidos que deram tudo pelo direito a decidir e contra a repressão durante a realização pacífica e democrática do referendo de independência no dia 1º de outubro de 2017 entram nas contas da “passividade cúmplice do governo de coalizão”.
Este final de ano marca o primeiro ano do acordo de coalizão assinado pelo PSOE e Unidos Podemos em 30 de dezembro de 2019 para o governo do país. Entre outros, dois aspectos cruciais do documento não foram cumpridos desde então: a revogação da lei da mordaça e o cancelamento da reforma trabalhista do PP de 2012.
Dentre outros, o artigo 314.3 do Código Penal [iii], que também não foi revogado, pune com pena de prisão de um ano e nove meses até três anos ou com multa de dezoito meses a vinte e quatro meses para quem “atuando em grupo ou individualmente, mas de acordo com outros, coagirem outras pessoas a iniciar ou continuar uma greve ”.
O acordo de coalizão indica expressamente que a revogação da lei da mordaça e da referida disposição penal que pune os piquetes de greve seria realizada o mais rápido possível. Um ano se passou e o governo de coalizão não fez nada. Além disso, estas normas jurídicas inaceitáveis continuam a ser utilizadas para punir com excessivo rigor os cidadãos acusados de violar algumas das restrições impostas pelo Executivo devido à pandemia ou quando promovem o exercício do direito de greve no local de trabalho (1 milhão de multas nos primeiros 65 dias de estado de alarme) .
A judicialização da política tanto na Espanha como na Catalunha caminha lado a lado com a passividade de todas as suas forças políticas que ou apoiam, ou silenciam diante do atual governo que se constitui na prática como uma frente ampla contra os trabalhadores e em favor da política ditada pela Comunidade Europeia e completamente controlada pelo mercado financeiro.
Na Catalunha a Esquerda Republicana joga abertamente o jogo do regime, em nome de um “diálogo” sem futuro, enquanto o JxCat se destacam no discurso para acabar por fazer o mesmo. A CUP, apresentando-se com uma narrativa mais esquerdista, não consegue dissociar-se de Esquerra e Junts, e agora aspira a fazer parte do próximo governo.
O governo do ERC e do JxCAT não só não deu uma solução para a questão do independentismo. É, igualmente, incapaz de enfrentar a pandemia e a crise, visto que são incapazes de enfrentar os grandes empregadores e o Estado espanhol. Os Comuns são apenas os representantes locais do “governo mais progressista da história”.
O independentismo catalão está fortemente apoiado sobre a burguesia local ( apoio de 80% entre os 10% mais ricos) e não tanto sobre os trabalhadores ( apoio de 50% entre os 50% mais pobres), esperar uma política mais avançada e independente do ponto de vista da classe trabalhadora tendo em vista toda a mobilização anterior em defesa do independentismo e contra a ditadura franquista que se perpetua no governo espanhol é uma possibilidade, mas não uma realidade concreta sem uma ampla mobilização das massas que passe por cima das atuais lideranças independentistas e abarque os trabalhadores de todo o país.
Na França, neste mesmo mês de dezembro, foram justamente as amplas e intensas mobilizações populares em todo o Estado que conseguiram derrubar, por enquanto em parte, a particular lei da mordaça que o Governo Macron quer impor a todo custo em detrimento dos direitos e liberdades democráticas.